Por três séculos, o Brasil
conheceu uma única forma de mão de obra: negros africanos escravizados.
O termo abolicionismo, no Brasil, é usado principalmente para indicar a luta contra a escravidão ocorrida na década de 1880, que teve como resultado a abolição da escravatura por meio da Lei Áurea em 1888. E antes de 1880, não houve luta contra a escravidão?
Houve, é claro. Desde o século XVI, índios e negros escravizados lutaram por sua liberdade. É importante lembrar, que era uma luta contra a escravização a que eles haviam sido submetidos e não contra a escravidão como instituição. No mundo luso-brasileiro, os primeiros — e poucos - questionamentos à escravidão só apareceram na segunda metade do século XVIII.
O termo abolicionismo, no Brasil, é usado principalmente para indicar a luta contra a escravidão ocorrida na década de 1880, que teve como resultado a abolição da escravatura por meio da Lei Áurea em 1888. E antes de 1880, não houve luta contra a escravidão?
Houve, é claro. Desde o século XVI, índios e negros escravizados lutaram por sua liberdade. É importante lembrar, que era uma luta contra a escravização a que eles haviam sido submetidos e não contra a escravidão como instituição. No mundo luso-brasileiro, os primeiros — e poucos - questionamentos à escravidão só apareceram na segunda metade do século XVIII.
Chegamos então ao século XIX, que tem
enorme importância para a história do escravismo no Brasil. Do início do século
até a Lei Áurea, aconteceu de tudo com nosso sistema escravista. A população
escrava aumentou continuamente até 1850, depois diminuiu continuamente até
1888. Em 1831, uma lei proibiu o tráfico negreiro; este, no entanto, prosseguiu
como se a lei não existisse. Em 1845, com o Bill Aberdeen, a marinha inglesa
passou a dar combate sem trégua aos navios negreiros; como resultado, o tráfico
duplicou. Em 1848, os traficantes desembarcaram aqui 60 mil africanos
escravizados, número recorde em toda a nossa História; quatro anos depois, o
tráfico estava morto e enterrado!
Que confusão! Cada hora a coisa anda para
um lado diferente...! Mas você ainda não viu nada. Na década de 1820, várias
pessoas importantes - inclusive José Bonifácio, o principal líder do movimento
de Independência - se manifestaram publicamente contra a escravidão; nas três
décadas seguintes, não se falou mais no assunto. Em 1871, para surpresa de
muita gente, o governo apresentou o projeto da Lei do Ventre Livre. Surpresa
ainda maior: apesar da resistência dos escravocratas, a Câmara de Deputados e o
Senado, então controlados pelo Partido Conservador - que defendia a escravidão
-, aprovaram o projeto. A maioria dos parlamentares das províncias do Norte e
do Nordeste, que muita gente considerava "atrasadas", votou a favor
do projeto; os representantes das três províncias mais ricas e tidas como
"modernas", Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, votaram contra.
Dez anos mais tarde, quando a campanha
abolicionista já avançava a mil por hora, os abolicionistas consideravam a Lei
do Ventre Livre ultrapassada e exigiam a abolição imediata, enquanto os
escravocratas passavam a defender a Lei do Ventre Livre (justamente porque ela
não determinava a abolição imediata).
Todos
esses desencontros e idas e vindas deixam claro duas coisas. Primeira: o
processo que levou ao término da escravidão não foi uma política planejada e
depois cuidadosamente executada para acabar com a escravidão de forma gradual. Segunda:
o sistema escravista brasileiro era muito mais complexo do que parecia à
primeira vista.
Essa complexidade foi em grande parte
responsável pela "confusão" e pelas idas e vindas que acabamos de
ver, na medida em que ela - a complexidade - ocasionava dois efeitos opostos.
Por um lado, dava à escravidão flexibilidade e, aos escravos, espaço de
negociação inexistentes nas demais sociedades escravistas da América. Por outro
lado, isso contribuía para a manutenção do sistema escravista, pois flexibilidade
e negociação facilitam a adaptação a novas situações econômicas e políticas e
reduzem o risco de revoltas em grande escala.
Vamos examinar dois exemplos práticos
dessa situação, dentro do período que nos interessa: o século XIX.
No Brasil, ser senhor de escravos não era
privilégio de grandes fazendeiros. A escravidão era disseminada; por toda a
sociedade. Era comum famílias pobres e mesmo libertos (ex-escravos) possuírem
cativos. De modo geral, esses senhores de baixa renda possuíam poucos escravos
- muitas vezes, apenas um ou dois - que executavam biscates e pequenos
serviços, entregando a seus senhores parte do que ganhavam. Por um lado, isso
dava a esses escravos maior liberdade de locomoção e até a possibilidade de
juntar algum dinheiro. Por outro lado, dificultava o combate à escravidão, já
que ela interessava não apenas à elite, mas a todas as classes de homens
livres.
Outro exemplo: no parágrafo anterior, nos
referimos aos libertos. E como um escravo obtinha a liberdade sem ser através
da fuga? Por meio da alforria, que podia ser concedida pelo senhor ou comprada
pelo escravo. A alforria flexibilizava o sistema escravista, pois dava ao
escravo a possibilidade legal de passar a ser livre. Ao mesmo tempo, reforçava
o sistema, pois dava ao senhor mais um instrumento de controle sobre os
cativos: a possibilidade de conceder ou não a alforria.
Essas características deram à escravidão
brasileira grande capacidade de resistir a pressões e de se adaptar a novas situações
políticas e socioeconômicas. A resistência e a adaptação é que explicam todo
aquele "vai e vem" que descrevemos no início deste texto. Diante de
uma pressão, o sistema escravista respondia com uma mudança; a mudança
provocava uma nova pressão, respondida com outra mudança e assim sucessivamente.
A resistência, comandada principalmente
pelas elites das províncias cafeeiras - Rio de Janeiro, São Paulo e Minas
Gerais - funcionou satisfatoriamente até o início da década de 1870, quando
então começou a se enfraquecer, devido a fatores tanto de ordem externa como
interna.
O isolamento internacional da escravidão
após a derrota dos sulistas na guerra civil norte-americana era agravado pela
posição da opinião pública dos principais países europeus, que consideravam a
escravatura como algo indigno de povos civilizados. Para a elite brasileira,
que tentava parecer o mais europeizada possível, isso criava uma situação extremamente
constrangedora. Ficava cada vez mais difícil justificar a existência da
escravidão.
No Brasil, o tráfico interno de escravos
não conseguia mais atender à crescente necessidade de mão de obra das regiões
cafeeiras. Além disso, a transferência do Nordeste para o Sudeste de cerca de
400 mil escravos, arrancados de suas comunidades e famílias, provocou um
considerável aumento da resistência dos cativos, com revoltas, fugas em massa e
formação de quilombos.
O aumento do preço dos escravos fez com
que eles se concentrassem nas grandes fazendas, levando ao progressivo
desaparecimento dos pequenos proprietários de escravos, o que contribuiu para a
crescente deslegitimação da posse de escravos.
Todos esses fatores esgotaram a capacidade
do sistema escravista de responder às pressões que sofria. O maior sintoma
desse esgotamento foi o extraordinário fortalecimento da campanha abolicionista
na década de 1880, que levou à extinção da escravatura em 1888.
Fonte: Sistemas de Ensino Abril Educação/Coleção
Alfa 5 : História do Brasil - Setor 1601 \ pág. 194 e 195
Saiba
Mais – Links
Assista à reportagem:
“Ecos da Escravidão”, que traça o longo e difícil caminho do cativeiro à
abolição, a luta pela liberdade, as formas de alforria, os principais
abolicionistas. Ainda analisa a polêmica: é possível ou não reparar os males
deixados à população negra por anos e anos de trabalho escravo?
Os repórteres Carlos Molinari e Débora Brito foram aos principais polos de trabalho escravo no Brasil
(Vale do Paraíba, Bahia, Pernambuco, Minas Gerais).
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