O que foi a Revolução Portuguesa
Disparada por uma canção, liderada por jovens militares, ela conquistou
sociedade, radicalizou-se e depois sucumbiu, em quatro décadas de diluição.
A segunda parte da operação também foi
disparada por uma canção executada na Rádio Renascença, exatamente aos 20
minutos da madrugada de 25 de abril. Esta segunda senha foi a canção “Grândola,
Vila Morena” [ouça com Nara Leão]. Ao contrário da primeira, estava proibida sob
acusação de fazer propaganda comunista. Sua transmissão significava que as
tropas comandadas pelo capitão Salgueiro Maia estavam ocupando o Terreiro do
Paço e logo a seguir cercando o quartel do Carmo, onde se abrigavam Marcelo
Caetano e alguns ministros.
Outras unidades, por todo o país,
começaram a agir também a partir da execução da música, que viraria um símbolo
romântico do golpe, juntamente com os cravos vermelhos com que as jovens
presenteavam os soldados cujos fuzis traziam a democracia. Dias depois eram
espalhados cartazes pelas cidades com as imagens de um soldado do Exército e um
marinheiro e os dizeres: “Ditosa Pátria que tais filhos tem. Obrigado, Forças
Armadas”.
Marcelo Caetano não teve como reagir, pois
seus comandantes mais leais foram aderindo ao golpe por pressão da média
oficialidade. O primeiro-ministro negociou quase o dia todo a entrega do poder,
exigindo a presença de um oficial de alta patente. Acabou por passar o comando
ao general Antônio Spíndola, seguindo depois para o exílio no Brasil.
Praticamente não houve resistência ao
golpe militar. Ao contrário, ele desencadeou grande adesão popular, com as
pessoas e os soldados rebelados confraternizando nas ruas. Caetano rendeu-se às
17h45. Uma hora depois, era emitido o decreto 171/74, que extinguia a temida
Direção-Geral de Segurança (antes PIDE, órgão de repressão, tortura e morte de
democratas ao longo de décadas), e as organizações pára-militares Legião
Portuguesa, Mocidade Portuguesa e Mocidade Portuguesa Feminina. As únicas
vítimas fatais do golpe, em Lisboa, foram quatro manifestantes civis que participavam
do cerco à sede da antiga PIDE. Seus membros, apavorados, dispararam contra a
multidão até serem dominados pelo Exército.
O programa do Movimento
das Forças Armadas podia ser resumido nos três “D”: Democratização,
Descolonização, Desenvolvimento.
Ao
golpe seguiu-se o chamado PREC – Processo (ou Período) Revolucionário em Curso,
caracterizado por fortes embates entre as diferentes correntes de esquerda que
assumiram o poder, e envolveram-se na formulação da Constituição aprovada em
1976. Houve muitas ocupações de terras e de edifícios privados, nacionalizações
de bancos, seguradoras, indústrias químicas e de papel, e outras atividades que
poderiam interessar ao Estado. Também promoveu-se uma “limpeza” ideológica na
mídia, com demissão de jornalistas conservadores ou ligados ao antigo regime.
Em reação às medidas mais radicais, grupos clandestinos de direita, alguns com
participação e apoio de setores da Igreja, praticavam atos terroristas,
explosões e assassinatos, principalmente na região central do país e na área do
Porto, ao norte.
A Lei Maior resultante da Assembleia
Constituinte trazia princípios caracteristicamente esquerdistas, consagrava a
“transição para o socialismo” mediante a nacionalização dos principais meios de
produção, e mantinha a participação dos militares do MFA no poder político,
através do Conselho da Revolução.
Mais tarde, os dispositivos mais rígidos
da Constituição foram sendo abrandados por sucessivas revisões, em 1982
(abrindo um pouco a Economia e extinguindo o Conselho da Revolução); 1989
(eliminando o princípio de irreversibilidade das nacionalizações); e 1992 e 97
(adaptando a Constituição aos Tratados da União Europeia assinados em
Maastricht e em Amsterdã, no caminho da plena integração continental).
Portugal foi governado alternadamente pelo
Partido Socialista, de Mário Soares (homem de confiança dos Estados Unidos no
processo de transição do PREC para a Democracia plena, incumbido de conter os
comunistas), ou pelo PPD/PSD, Partido Popular Democrata/Partido Social
Democrata, que nasceu na centro-esquerda e depois fez a chamada “viragem à
direita” e hoje governa com o primeiro-ministro Pedro Passos Coelho.
Neste aniversário da Revolução,
organizações de veteranos de Abril anunciaram que não participarão de nenhuma
comemoração oficial porque este governo “traiu os ideais de 1975”.
Antonio Barbosa Filho é jornalista
e escritor, autor de A Bolívia de Evo Morales e A Imprensa x Lula – golpe ou
sangramento? (All Print Editora).
Saiba
Mais – Filme
Capitães de
Abril
Direção: Maria de Medeiros
Ano: 2000
Duração: 123 minutos
Saiba Mais –
Documentários
As armas e o povo
Este
filme retrata o período entre os dias 25 de Abril de 1974 e o Primeiro de Maio.
Mostra o movimento militar e a agitação popular nas ruas.
As
Armas e o Povo é um documentário coletivo realizado
por diversos cineastas, incluindo Glauber Rocha que
desembarcara há pouco em Portugal, para assistir aos primeiros dias da
Revolução. São
ilustrados os primeiros seis dias da Revolução dos Cravos.
Realização e produção: Colectivo de Trabalhadores da Actividade Cinematográfica.
Realização e produção: Colectivo de Trabalhadores da Actividade Cinematográfica.
Bom Povo
Português
Filme de Rui Simões, que
descreve a situação social e política de Portugal entre o 25 de Abril de 1974 e
o 25 de Novembro de 1975, tal como ela foi sentida pela equipe que, ao longo
deste processo, foi ao mesmo tempo espectador, ator, participante, mas que,
sobretudo, se encontrava totalmente comprometida com o processo revolucionário
em curso.
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