O homem forte do Catete
Governando em período de grande instabilidade política, Arthur Bernardes
conduziu o país sob estado de sítio.
Fabiano Vilaça dos Santos
Arthur da Silva Bernardes nasceu
em Viçosa, na Zona da Mata mineira, em 8 de agosto de 1875. Quarto dos oito
filhos do português Antônio da Silva Bernardes, advogado provisionado (sem diploma),
e de Maria Aniceta Pinto Bernardes, teve uma infância modesta. Em 1887, foi
matriculado no tradicional Colégio Caraça, de onde saiu dois anos depois por
falta de recursos. Com 14 anos, foi trabalhar na firma Pena & Graça, que
negociava café e, mais tarde, na Casa Adriano Telles & Cia., como
guarda-livros (contador).
Voltou a estudar no Externato do
Ginásio Mineiro, em Ouro Preto, colaborando no jornal Academia. Em 1896,
matriculou-se como ouvinte na Faculdade Livre de Direito de Minas Gerais, fundada
em 1892. No quarto ano do curso, Bernardes se transferiu para a Faculdade de
Direito de São Paulo. Para se manter, trabalhou como revisor no jornal Correio
Paulistano, estafeta (mensageiro a cavalo) dos Correios e professor de
português e latim.
Formado em 1900, voltou para
Viçosa e abriu um escritório. Foi quando uma situação insólita se instalou em
sua casa. Nessa época, seu pai já era promotor da comarca e toda vez que
Bernardes atuava como advogado de defesa os dois ficavam em lados opostos. Para
acabar com o impasse, Antônio Bernardes se exonerou e passou a trabalhar com
o filho.
Em 15 de julho de 1903, casou-se
com Clélia Vaz de Melo, com quem teve oito filhos. O enlace foi a porta de
entrada de Bernardes na política. Seu sogro, o senador Carlos Vaz de Melo
(1842-1904), era homem influente em Viçosa. E, ao contrário do que se poderia
pensar, logo após sua morte a carreira do genro deu um salto. Eleito
presidente da Câmara Municipal, em 1905, recusou o cargo preferindo trabalhar
como advogado, mas o assumiu no ano seguinte. Deputado estadual em 1907 e federal
em 1909, pelo Partido Republicano Mineiro (PRM), seu prestígio político se
consolidou ao se aproximar das principais oligarquias do país que apoiavam a
candidatura do marechal Hermes da Fonseca à Presidência.
Depois de ocupar a Secretaria de
Finanças de Minas e de exercer mais um mandato de deputado estadual, Arthur
Bernardes deu um importante passo na carreira: chegou à presidência de seu estado
(1918-1922). Em um banquete, fez um discurso defendendo que "a nenhum
estado deve ser lícito sonhar com a hegemonia política na Federação", e
o café, "termômetro de nossa situação econômica". Uma de suas
principais realizações foi a criação, em 1922, da Escola Superior de Agricultura
e Veterinária, embrião da Universidade Federal de Viçosa. Nessa época, deu
provas do forte nacionalismo que marcaria sua futura gestão no Catete, ao
recusar um contrato com a empresa Itabira Iron para exportar ferro do vale do
rio Doce.
Os anos de 1921 e 1922 foram de
acirrada disputa pela sucessão de Epitácio Pessoa (1919-1922). Inicialmente, o
paraibano foi contra a ideia de Minas eleger mais um presidente, pois desejava
que seu sucessor viesse de algum estado do Norte. Para obter o apoio desta
região à candidatura de Arthur Bernardes, segundo a historiadora Cláudia
Viscardi, as oligarquias mineiras se comprometeram com a continuidade das
obras iniciadas pelo "Pitaço" e esperaram o apoio dos gaúchos e do
Rio de Janeiro. Mas a corrida presidencial exigiria fôlego. Enquanto Epitácio
e os paulistas aderiram ao nome de Bernardes, Rio Grande do Sul, Bahia,
Pernambuco e Rio de Janeiro apostaram em Nilo Peçanha, que encabeçou a chapa da
"Reação Republicana". Para incrementar a disputa, entrou em campo um
terceiro concorrente: Hermes da Fonseca. Eleito presidente do Clube Militar, o
marechal foi apontado como mentor de um estratagema para minar a indicação do
mineiro: o episódio das "cartas falsas", publicadas no jornal Correio
da Manhã -
pró-Nilo
-, em 1921.
Uma das cinco missivas
"assinadas" por Arthur Bernardes e enviada a Raul Soares
(1877-1922), então presidente de Minas, dizia: "estou informado do
ridículo e acintoso banquete dado pelo Hermes, esse sargentão sem compostura,
aos seus apaniguados (...) Espero que use com toda energia, de acordo com as minhas
últimas instruções, pois essa canalha precisa de uma reprimenda para entrar na disciplina..." O objetivo das "cartas falsas"
era indispor os militares com Bernardes. O clima entre a oficialidade, em
plena agitação tenentista, favorecia o plano. Além disso, o próprio Hermes da
Fonseca buscava apoio entre alguns setores da política mineira para sua
candidatura, o que reforçou as suspeitas da autoria das cartas.
A imprensa não perdeu a
oportunidade de satirizar a disputa presidencial. Os partidários de Nilo
Peçanha pularam o Carnaval de 1922 cantarolando a marchinha "Ai, Seu Mé!", de
Freire Júnior (1881-1956) e Luiz Nunes Sampaio (1886-1952), o Careca. A letra fazia referência a dois
apelidos de Bernardes, "Seu Mé" e "Rolinha": Ai Seu Mé/
Lá no Palácio das Águias, olé!/ Não hás de por o pé.../ O Zé Povo quer a
goiabada campista./ Rolinha desista/ Abaixa esta crista.../Embora se faça uma
bernarda a cacete,/ Não vais ao Catete! Não vais ao Catete!
Mas,
apesar de toda a oposição, a adesão de São Paulo garantiu a vitória do
"Seu Mé" por 466.877 votos. Para vice, foi escolhido o maranhense
Urbano Santos (1859-1922), que morreu dois meses depois de eleito, sendo substituído,
em novo pleito, pelo pernambucano Estácio de Albuquerque Coimbra (1872-1937).
Bernardes tomou posse em estado de sítio devido ao Levante dos Dezoito do
Forte, no final do governo de Epitácio, e percebeu que para conter as oposições
e manter a ordem teria que ser enérgico. Seus métodos, considerados violentos e
arbitrários pelos adversários, deram origem ao "bernardismo". Exemplo disso foi o envio de políticos,
líderes operários, militares rebeldes e todos que conspiravam contra a ordem
pública para a colónia agrícola de Clevelândia, criada em 1922 no Pará.
Os
momentos de turbulência não tardaram. Movimentos explodiram pelo país
expressando ora a cisão entre as oligarquias dos estados ora a perda de apoio
do governo federal. No primeiro caso está a disputa entre grupos políticos
gaúchos - a Revolução Libertadora de 1923 -, em que o estancieiro Assis Brasil
(1857-1938) se opôs ao governo estabelecido de Borges de Medeiros (1863-1961).
O governo federal interveio e a contenda terminou em dezembro com a
assinatura do Tratado de Pedras Altas.
Quando
os ânimos pareciam serenar, os paulistas deram voz à sua insatisfação.
Presidente e cafeicultores - aliados na campanha - andavam às turras por causa
dos rumos da política em relação ao café (o governo segurava as exportações
para especular com o preço e deixava os produtores sem capital para
reinvestir na lavoura). Por outro lado, a manifestação do "bernardismo"
fez com que militares de São Paulo articulassem um movimento armado que
começou no dia 5 de julho de 1924. Sob o comando do general Isidoro Dias Lopes
(1865-1949), a capital do estado foi tomada, levando o governo federal a
decretar estado de sítio e ordenar o bombardeio, inclusive aéreo, da cidade.
Os paulistas exigiam as reformas propostas pelo movimento tenentista: voto
secreto, ampliação do ensino primário obrigatório e limitação do poder do
Executivo, em clara oposição ao "bernardismo". O episódio de 1924 foi
a chave para outro importante movimento tenentista: a Coluna Prestes, que
teve como principais líderes Luiz Carlos Prestes (1898-1990) e Miguel Costa
(1885-1959). De 1925 a 1927, a Coluna - formada por militares
rebeldes - percorreu o país em aberta oposição ao
governo.
Se no
plano interno a ordem foi garantida por meio de medidas repressivas, a
política externa de Arthur Bernardes não foi menos incisiva. Em 1926, após a
bem-sucedida missão de Afrânio de Melo Franco (1870-1943) na V Conferência
Pan-Americana, no Chile, quando foi discutido um programa de desarmamento dos
países da América do Sul, o presidente encarregou o conterrâneo de chefiar a
delegação brasileira na Liga das Nações, da qual o país se retirou por não
concordar com a entrada da Alemanha.
Ao
deixar o Catete em 1926, sob protestos e acusações de autoritarismo,
"Rolinha" assumiria um lugar no Senado no ano seguinte. Mas preferiu
bater asas rumo à Europa para respirar ares menos carregados e só tomou posse
em 1929. Na volta, encontrou o país em ebulição. O descontentamento político
reinava e um clima de revolução pairava sobre o governo de Washington Luís
(1926-1930). Setores da política mineira estavam dispostos a aderir ao
movimento que vinha do Sul, comandado por Getúlio Vargas (1882-1954). Bernardes
o apoiou acreditando que o líder gaúcho garantiria a ordem pública e
conduziria o país à legalidade convocando uma constituinte logo após chegar ao
poder.
Suas
expectativas foram frustradas, mas o ex-presidente continuou defendendo a
legalidade aliando-se às forças mineiras na Revolução de 1932. Por causa disso,
tornou-se uma pedra no sapato do novo governo que tentou afastá-lo do cenário
político nomeando-o para uma embaixada. A oferta foi recusada e Bernardes
passou a sofrer perseguições e ameaças de devassa nas contas de sua gestão.
Acabou forçado a partir para o exílio, em Lisboa. No momento do embarque, seus
inimigos políticos ainda atentaram contra sua vida, mas o tiro atingiu, sem
gravidade, Arthur Bernardes Filho. O episódio nunca foi devidamente esclarecido.
O
afastamento durou até a abertura dos trabalhos para a elaboração da Carta de
1934, quando foi eleito deputado constituinte. Com o golpe que inaugurou o
Estado Novo, em 1937, foi cassado e ficou fora da vida pública até o fim da
ditadura de Vargas, em 1945. No ano seguinte, elegeu-se deputado constituinte.
Ainda foi suplente no Parlamento em 1950, e, quatro anos depois, deputado
federal.
Na
manhã do dia 23 de março de 1955, uma quarta-feira, Arthur Bernardes sofreu um
infarto. Tinha 79 anos e estava em pleno exercício do mandato de deputado.
Faleceu pouco antes das 15 horas e foi enterrado no Rio de Janeiro com honras
de chefe de Estado. Em sua conturbada passagem pela Presidência, desmentiu a
profecia de Epitácio Pessoa (citada pela historiadora Isabel Lustosa) lançada
em maio de 1922: "ele não aguentará 24 horas no Catete".
Fabiano Vilaça dos Santos é doutorando em
História Social na USP e pesquisador em Nossa História.
Fonte: Revista Nossa História - Ano III nº 36 – Outubro 2006
O paulista de Macaé
Legítimo representante da oligarquia paulista, o fluminense Washington Luís
enfrentou a Revolução de 1930 e criou o lema
"Governar é abrir estradas"
Sexta-feira, 24 de outubro de 1930. Washington Luís vivia
suas últimas horas como presidente da República. Pelos belos salões do Palácio
Guanabara, caminhava impaciente de um lado para outro, retrucando aos poucos
amigos que lhe restara: "Eu não renuncio!... Só aos pedaços sairei
daqui!...". Convencido de que teria o mesmo apoio popular, quando de sua
eleição em 1926, nem imaginava que, do lado de fora, uma multidão indócil
dava vivas à "revolução", aguardando ordens para bombardear a sede
do governo. Seu mandato estava sendo prematuramente interrompido, assinalando
o fim da era "café com leite".
Washington Luís Pereira de Souza
nasceu em Macaé, cidade do litoral norte do Rio de Janeiro, em 26 de outubro de
1869. São escassos os registros sobre sua infância. Primogênito dos quatro
filhos do tenente-coronel Joaquim Luís Pereira de Souza e de Florinda Ludgera
de Sá Pinto Magalhães, pertencia a uma família de proprietários de engenhos de
açúcar que gozava de grande prestígio político no Império.
Prestígio que não impediu que a
família passasse por dificuldades financeiras. Antes da abolição da escravidão
em maio de 1888, seu pai libertou todos os seus escravos. Apesar de prometerem
a permanência até o fim da colheita, os alforriados abandonaram a propriedade,
deixando a família em ruína. A esta altura "Chinton", como era
chamado pelos familiares, já havia passado pelos colégios Pedro II e Augusto,
no Rio de Janeiro. Em 1889, ingressou na Faculdade de Direito de São Paulo,
mas se transferiu para a Faculdade de Direito de Recife, com o intuito de
terminar o curso em três anos. A falta de recursos da família preocupava
Washington e seus irmãos, como mostra a carta de seu irmão Lafaiete, de 8 de
outubro de 1888: "Papai disse que o Chico não estuda mais, nem este ano,
nem outro, porque não há meios".
"Chinton" não foi um
estudante exemplar. Boêmio, preferia os passeios pela capital pernambucana a
dedicar-se às leituras que o curso exigia. Era perito em jogar bilboquê,
brincadeira que perturbava a concentração de Otávio Costa, seu colega de
quarto. Às vésperas das provas, decorava a matéria de madrugada e, assim,
conseguia boas notas. Em outubro de 1891, voltou a São Paulo para prestar os
exames finais, bacharelando-se no mesmo ano. Com a ajuda de familiares, foi
nomeado promotor de Barra Mansa, no Rio de Janeiro, mas, insatisfeito com o
salário, em 1893 se transferiu para Batatais, São Paulo, onde abriu um
escritório de advocacia.
Frequentava bailes carnavalescos,
teatro e tinha um gosto especial por óperas, especialmente pelas composições
do italiano Giuseppe Verdi (1813 -1901). Mas não só a música italiana acalentava
o seu coração: desde jovem, mostrava fraqueza com as italianas. Segundo João
Lima, autor de Como vivem os homens que governaram o Brasil, nos tempos
de faculdade, "Chinton" teve "os sentidos perturbados por uma
atriz italiana, de nome Gisela, rapariga de rara sedução". Em maio de
1928, já no governo, um caso com uma marquesa italiana quase acabou em
tragédia: após um jantar, a jovem, por ciúme, teria atirado em Washington,
ferindo-o no ventre. A imprensa tentou abafar o caso, informando que o
presidente havia sido internado às pressas para a retirada do apêndice. Mas os
rumores aumentaram, quando, dias depois, a moça se suicidou.
Fazia o tipo sportsman: participava de ralis
automobilísticos em Santos e no Vale do Paraíba e, em 1919, fez seu batismo aéreo,
levantando voo num avião Sopwith, em Guarulhos. Nas horas de folga era
historiador. Publicou dois estudos a partir de suas pesquisas no Arquivo
Público de São Paulo: Contribuições para a história da capitania de São
Paulo. Governo Rodrigo César Meneses (1904) e Testamento de João
Ramalho (1905). Jovem, já era tido como elegante e inteligente, só faltava mesmo o
respeito no círculo político paulista. Isso ele conseguiu casando-se, em 4 de março de 1900, com a filha dos barões
de Piracicaba, Sofia Paes de Barros (1877-1934). A moça também apreciava música
clássica e canto. Tiveram quatro filhos:
Florinda Maria (1901), Rafael Luís (1902), Caio Luís (1905) e Vítor Luís
(1907).
Membro do Partido Republicano
Paulista, sua carreira política teve início em 1904, ao ser eleito deputado
estadual. Dois anos depois, com a ajuda da sogra, foi nomeado para a Secretaria
de Justiça com a missão de reformar as polícias civil e militar. Entre outras
medidas, estabeleceu a obrigatoriedade do diploma de advogado para os delegados
de polícia. Nesse período, ao colocar detentos para trabalhar na reconstrução
da via São Paulo-Santos, cunhou o lema: "Governar é abrir estradas".
Após deixar a Secretaria de Justiça,
em maio de 1912, foi eleito deputado estadual e, por dois mandatos
consecutivos, prefeito de São Paulo. Em 1919, se candidatou ao governo do
estado. Eleito, cumpriu as promessas de campanha: manteve a velha política de
valori zação
do café e construiu cerca de 1.326 quilómetros de estradas. Na área cultural,
fundou o Museu Histórico Republicano de Itu (1923) e incentivou projetos históricos
sobre o passado paulista.
Sua indicação para a Presidência
da República resultou, mais uma vez, de um consenso entre Minas Gerais e São
Paulo. No entanto, desde a eleição de Epitácio Pessoa, em 1919, representantes
de outros estados exigiam uma maior democratização do processo, queixando-se da
alternância "café com leite" na Presidência. À revelia dessas
discussões e sem concorrentes, foi eleito com 688.528 votos. Ao tomar posse em
15 de novembro de 1926, foi recebido calorosamente por uma multidão no Rio de
Janeiro. No mesmo dia, montou o novo ministério, escolhendo nomes que não
ameaçassem o poder presidencial. Ironia do destino, entre os indicados
figurava Getúlio Vargas para a pasta da Fazenda.
Mas a abertura tinha lá as suas
limitações. Os pedidos de anistia, como aos envolvidos no movimento de 1922,
no Forte Copacabana, foram negados. A polícia secreta acompanhava de perto a
movimentação da Coluna Prestes, que neste momento se encontrava exilada na
Bolívia. Focos de oposição foram silenciados com a "Lei Celerada",
que restabeleceu a censura à imprensa e recolocou o PCB na ilegalidade. Em São
Paulo, com o apoio dos tenentes, foi criado o Partido Democrático (PD), que
defendia o voto secreto e a moralização do processo eleitoral.
Instabilidade interna e externa.
Em 1929, a crise econômica deflagrada com a quebra da Bolsa de Nova York
provocou um forte abalo na economia brasileira. Desesperados, os cafeicultores
exigiram que o governo federal comprasse a produção excedente. Washington Luís
negou, pois temia a desvalorização da moeda. Tudo que conseguiu foi angariar
novos inimigos. Por intermédio do Instituto Paulista de Defesa do Café, os
oligarcas
ameaçaram: "O lema é a lavoura, hoje com o governo. Se não formos atendidos,
amanhã será [...] a lavoura contra o governo". O crack da Bolsa impediu também
a implementação do cruzeiro. A crise serviu de inspiração para o compositor
Eduardo, autor de "É sim sinhô": "Ele é paulista? É sim senhor. / Falsificado? É sim
senhor.
[...] / Ele
é estradeiro? É sim senhor. [...] / Mas o cruzeiro? É sim senhor. / Ovo gorado? É sim
senhor..."
Por fim aconteceu uma crise
política provocada pelas discordâncias na escolha do sucessor de Washington
Luís. Contrariando os mineiros, que pretendiam indicar o vice-presidente
Fernando de Mello Vianna, "Chinton" optou por apoiar o candidato paulista,
Júlio Prestes de Albuquerque. Irritado, o presidente de Minas, Antônio Carlos Ribeiro,
procurou alianças com Getúlio Vargas. Apesar dos apelos de Washington Luís para
convencer os líderes gaúcho e mineiro a desistirem da empreitada, em setembro
de 1929, a Aliança Liberal lançou a candidatura de Getúlio, tendo como vice o
presidente da Paraíba, João Pessoa.
Acusado pela oposição de fraudar
as eleições, Washington Luís sofreria ainda outro golpe. No Uruguai, um
desastre aéreo, em maio de 1929, revelou que dois brasileiros tinham ido à Argentina
pedir o apoio de Luiz Carlos Prestes para depor o presidente. Um deles,
Antônio de Siqueira Campos, morreu no desastre. O clima de conspiração
aumentou, quando João Pessoa, presidente da Paraíba e candidato derrotado, foi
assassinado em Recife, no dia 26 de julho. O episódio fortaleceu a Aliança
Liberal, que, além das denúncias de fraude eleitoral, passou a culpar o
presidente pelo crime.
O país ficou em polvorosa.
Forças militares se levantaram no Rio Grande do Sul, em Minas Gerais e na
Paraíba. Na capital, o povo incendiou jornais favoráveis ao governo. Tropas
gaúchas lideradas por Vargas e pelo general Góes Monteiro marchavam para um
confronto com os paulistas. Em poucos dias foram derrubados os governos do
Espírito Santo, Santa Catarina e Paraná. Nas regiões Norte e Nordeste, só
escaparam o Pará e a Bahia. Inflexível, Washington Luís não acreditava que
Getúlio Vargas, seu amigo íntimo, o único que podia entrar fumando em seu
gabinete, o estivesse traindo.
Na manhã do dia 24 de outubro,
uma esquadrilha sobrevoou a capital lançando panfletos informando a queda do
presidente. No final da tarde, após a visita do cardeal d. Sebastião Leme, ele
aceitou se entregar como prisioneiro e não como renunciado. Conduzido ao Forte
Copacabana, ficou preso até 21 de novembro, dia que embarcou com sua família
rumo à Europa. O exílio durou até 1947, quando voltou ao Brasil. Fixou residência
em São Paulo, mas não se envolveu mais com a política, dedicando-se ao seu
trabalho de historiador. Faleceu em 4 de agosto de 1957, vítima de
complicações de uma gripe. Apesar do pedido de um funeral simples, sem honras
oficiais, uma multidão seguiu o cortejo com fortes demonstrações de carinho.
Nívia Pombo é mestre em História Social pela Universidade Federal Fluminense
e pesquisadora de Nossa História.
Fonte: Revista Nossa História - Ano IV nº 37 – Novembro 2006
Nenhum comentário:
Postar um comentário