Um tico-tico no Catete
Voluntarioso, o monarquista Afonso Pena rompeu com o liberalismo de
Rodrigues Alves, colocou os cafeicultores no poder e morreu antes de concluir o
mandato.
Primeiro representante de Minas Gerais a ocupar a Presidência
da República, Afonso Pena era pequeno, determinado e viciado em trabalho.
Quando chegou ao Palácio do Catete, em 1906, foi apelidado de
"Tico-tico", em referência à baixa estatura e à atitude
voluntariosa.
Filho de um imigrante português
com uma filha de portugueses, Afonso Augusto Moreira Pena nasceu em 1847 na
vila de Santa Bárbara do Mato Dentro, próximo a Ouro Preto. Estudioso,
formou-se em Humanidades no Colégio do Caraça em 1863 com nota máxima em todas
as disciplinas e menção de louvor pela direção da escola.
Ingressou em 1866 na Faculdade de Direito
de São Paulo, onde foi colega, entre outros, de Rodrigues Alves e Rui Barbosa.
Aliou os estudos jurídicos às mais diversas atividades, como a participação em
umasociedade secreta chamada Burschenschaft, de orientação liberal e
abolicionista. Teve participação ativa em periódicos universitários. Em 1870
disputou eleição para o cargo de redator-chefe do jornal Imprensa Acadêmica, obtendo o mesmo número de votos do seu concorrente,
Rodrigues Alves. Os dois futuros presidentes da República acabaram exercendo o
cargo conjuntamente.
Concluiu o bacharelado em 1870 e seis
meses depois era o único de sua turma a obter o título de doutor. Voltou para
Santa Bárbara e exerceu a advocacia até 1874, um ano antes de se casar com
Maria Guilhermina de Oliveira, com quem teve 12 filhos e por quem nutriu até o
fim da vida uma paixão arrebatadora. Seus arquivos mostram cartas cheias de
amor juvenil trocadas em 1906, quando já tinham 31 anos de casados. Nelas,
referiam-se um ao outro como "Negrão" e "Mariquinhas".
Afonso Pena foi deputado provincial pelo
Partido Liberal entre 1874 e 1878 e assumiu vaga de deputado geral em 1879.
Isso tudo apesar
do comentário geral de que era um mau orador, de dicção difícil, e
gesticulação epilética. O político mineiro defendeu o liberalismo econômico,
atacou a escravidão e liderou a ala radical do Partido Liberal, mas jamais se
bandeou para o lado dos republicanos. Entre 1882 e 1885, antes de completar
quarenta anos, ocupou por cinco vezes o cargo de conselheiro do Império
(equivalente a ministro na República), incluindo as pastas da Guerra e da
Justiça.
Após os "lutuosos
acontecimentos do dia 15", como se referiu à Proclamação da República, Pena
tentou se retirar da vida política. Monarquista e liberal, estava incompatibilizado
com a nova elite, republicana e conservadora. Mas foi convocado em 1890 para
elaborar a Constituição mineira, o que aceitou após muita relutância. Liderou
a Constituinte e foi relator do texto final, de 1891. Constava no documento a
decisão de retirar a capital mineira de Ouro Preto, considerada feia e
anti-higiênica. Durante o seu trabalho nesta comissão, gostava de ouvir ideias
e propostas dos colegas de pouca idade, entre eles David Campista, jovem
deputado de origem fluminense.
Com a ascensão de Floriano Peixoto
à Presidência, em 1891, e a nomeação de Rodrigues Alves para o Ministério da
Fazenda, Afonso Pena passou a corresponder-se com este sobre assuntos
financeiros.
O presidente de Minas Gerais,
Cesário Alvim, opositor de Floriano, renunciou em 1892. Pena, com atuação
reconhecida por todas as facções políticas, foi eleito para o cargo em maio
daquele ano. Hábil administrador, duas realizações marcaram seu governo em
Minas: a criação da nova capital, Belo Horizonte (inaugurada em 1897) e a fundação da Faculdade
Livre de Direito, em 1892.
Trabalhador compulsivo, assumiu
a direção da faculdade e foi regente de uma de suas cadeiras. Causava especial
impressão nos moradores de Ouro Preto ver o presidente do Estado sair do
palácio do governo e entrar na sala de aula como simples professor. Em 1895, um ano após deixar o governo
de Minas, foi convidado para ser ministro do Supremo Tribunal Federal. Mas preferiu
continuar no magistério.
Um jornalista que passou pela
capital estadual na época relatou a simplicidade na qual vivia o ex-presidente
do Estado. O professor Afonso Pena morava em uma casa modesta, sem área
externa ou luz elétrica.
Assumiu em 1895, por articulação
do ministro Rodrigues Alves, a direção do Banco da República do Brasil,
instituição mista controlada pelo governo federal, que tinha grande papel na
definição da política financeira do país. Neste cargo, Afonso Pena ajudou na
recuperação do crédito brasileiro frente aos investidores, sobretudo devido
à austeridade fiscal e respeito aos compromissos assumidos.
Mas começou a apresentar sinais
de exaustão física entre 1896 e 1897: "tenho trabalhado como um mouro
(...), sinto-me cansado e tenho receio de haver comprometido minha saúde
(...). Tenho muitos filhos e preciso viver para educá-los". Os médicos
diagnosticavam: sofria por excesso de trabalho. Em outubro de 1897, foi
obrigado a repousar. Seguiu para Águas Virtuosas, atual Lambari (MG), onde permaneceu
algumas semanas. Entre passeios e conversas, achou tempo para um dos
passatempos preferidos em sua juventude paulistana: jogar peteca.
Em 1902, com a morte de Silviano
Brandão, presidente de Minas e vice-presidente da República eleito na chapa de
Rodrigues Alves, Afonso Pena foi indicado para o cargo federal. Eleito em março
de 1903, tomou posse três meses depois. Teve grande entendimento com o
presidente até 1905, quando começaram as articulações para a sucessão
presidencial.
Rodrigues Alves havia feito um
governo memorável. Sua obra, em termos econômicos e, principalmente, de
infraestrutura, rendera-lhe o título de "grande presidente". Mas a
agricultura caminhava para um colapso: o principal produto da pauta de
exportações, o café, apresentaria no ano seguinte um excedente de cerca de 16 milhões de sacas. Os
principais produtores do país não aceitariam mais a postura não
intervencionista do presidente ou de seu sucessor.
Abandonando a postura liberal
que ajudara a recuperar a economia brasileira na virada do século XIX para o XX, o vice-presidente
se voltou para o intervencionismo. Em acordo com o caudilho e senador gaúcho
Pinheiro Machado, de grande influência no Parlamento, decidiu que o próximo
presidente seria mineiro, e não um paulista seguidor da cartilha liberal, como
queria Rodrigues Alves.
Enquanto Pena, Pinheiro Machado
e outros líderes políticos se uniam no chamado "Bloco" contra a
indicação do paulista Bernardino de Campos, candidato de Rodrigues Alves, os
presidentes dos principais estados cafeicultores se reuniam em Taubaté, no
interior paulista, e articulavam a salvação dos produtores: o governo federal
deveria servir como fiador de um empréstimo de 15 milhões de libras esterlinas para
compra e estocagem do excedente de café, e o valor da moeda nacional seria
controlado por uma agência governamental, fixando o câmbio. Com estas
resoluções, os presidentes de São Paulo (Jorge Tibiriçá), Minas Gerais (Francisco
Antônio de Sales) e Rio de Janeiro (Nilo Peçanha) assinam em fevereiro de 1906 o documento final do
Convénio de Taubaté.
Rodrigues Alves opunha-se às
medidas sugeridas pelos cafeicultores, mas Afonso Pena, já candidato à
Presidência da República, defendia-as abertamente. Para completar a ligação com
os agricultores, Nilo Peçanha foi escolhido para a vice-presidência em sua
chapa.
Candidato único, Pena foi eleito
em
1906 com 288.285 votos, a segunda menor
votação de toda a história republicana brasileira (supera apenas Epitácio
Pessoa, eleito em 1919 com pouco mais de 286 mil votos). Após a eleição, fez questão de deixar claro
quem mandaria no governo: "quem faz a política sou eu", disse, em
setembro de 1906, a Pinheiro Machado, que passaria à oposição.
Ainda em maio daquele ano, o
presidente eleito iniciou uma excursão pelo país, percorrendo-o de norte a
sul. No Rio Grande do Sul, última escala da viagem, ouviu da sacada do Palácio
do Governo o discurso de um representante estudantil que havia sido impedido
pelas autoridades locais de encontrá-lo. Seu nome era Getúlio Vargas, e
elogiava Pinheiro Machado, "sentinela do Sul", que teria colocado fim
ao
continuismo nas sucessões presidenciais.
Sua primeira medida como presidente foi a
transformação do Convênio de Taubaté em lei. Apesar de abalar o crédito
internacional dos estados cafeicultores, as primeiras consequências da alteração
econômico-financeira não foram tão funestas. A presença de um velho conselheiro
imperial na Presidência da República aquietava os ânimos dos capitalistas.
Pena teve espaço para importantes
realizações, como a reorganização do Exército através da lei do serviço
militar obrigatório, a renovação da esquadra, a finalização do porto do Rio de
Janeiro e o incremento da imigração (foi responsável pela entrada de quase um
milhão de europeus).
Criou ainda a Comissão de Linhas
Telegráficas, colocando à frente o capitão Cândido Rondon, instalando mais de 2
mil quilómetros de linha telegráfica e colocando o Brasil em contato com uma
população indígena enorme e desconhecida. Incentivou a expansão ferroviária,
inaugurando ramais de norte a sul do país, construindo a Estrada de Ferro do
Noroeste do Brasil, que ligou o Mato Grosso ao Sudeste, e iniciando a obra da
ferrovia Madeira-Mamoré, no interior da Amazônia.
Em 1908, para comemorar o
centenário da abertura dos portos, Pena mandou organizar uma exposição na
capital federal. Reformada no governo anterior, a cidade do Rio serviu de vitrine para a produção nacional,
obtendo grande êxito, tanto para expositores quanto para o público.
Mas o aparente mar-de-rosas acabou em 1909. O lançamento de David Campista
à Presidência, obra de Pena, não foi aceito no meio político. Uns não aceitavam
que a sucessão fosse definida pelo presidente, outros já faziam acirrada
oposição ao "Jardim da Infância". Surgiu, como opção, o nome do
gaúcho Hermes da Fonseca, militar e, para agravar a situação, ministro da Guerra.
Alheio à participação política mais efetiva, foi finalmente convencido pelo
grupo de Pinheiro Machado e rompeu com o governo em episódio que pode ter
agravado a saúde do presidente - já abalado emocionalmente com a morte de seu
filho Álvaro no início de 1909.
Combalido pelos acontecimentos da cena política e da vida pessoal, Pena
não diminuiu o ritmo de trabalho. Aos 61 anos - idade avançada para a época -,
acometido por violenta pneumonia, continuou a fazer viagens pelo Brasil e a
despachar com ministros e auxiliares. Aceitou ficar de cama quando já sentia
arritmia cardíaca. Mas era tarde. Na semana seguinte, no dia 14 de junho de
1909, Afonso Pena tornou-se o primeiro presidente a morrer no Catete, no
exercício da Presidência. E o único a expirar por excesso de trabalho.
Rodrigo Elias é
professor das Faculdades Integradas Simonsen e pesquisador da Revista de
História da Biblioteca Nacional.
Fonte: Revista Nossa História - Ano III nº 30
– Abril - 2006
Da padaria à
Presidência
Com a morte
de Afonso Pena, o vice Nilo Peçanha foi o primeiro brasileiro de origem humilde
a se tornar presidente da República.
No dia 14 de junho de 1909, o
"pequeno do Sebastião da padaria", o menino de pele morena que
entregava pães e entrou para a política, chegou ao topo de sua trajetória: a
Presidência da República, ainda que para governar 17 meses. Com a morte do
presidente Afonso Pena (1847-1909) antes do fim do mandato, o vice, Nilo Peçanha,
assumiu o poder de acordo com a Constituição de 1891. Concentrou esforços no
desenvolvimento da agricultura e da indústria e enfrentou acirrada disputa
entre os candidatos à sucessão presidencial.
Nilo Procópio Peçanha nasceu em
Campos dos Goytacazes, norte do Rio de Janeiro, em 2 de outubro de 1867. Filho
de Sebastião de Sousa Peçanha, lavrador que trocou as terras por uma padaria,
passou a infância em um sítio onde recebeu as primeiras letras da mãe, Joaquina
Anália de Sá Freire Peçanha. Além do aprendizado, entregava-se às brincadeiras
- gostava de apanhar goiabas -, e por isso ganhou o apelido de "Nilo
goiabada".
Fez parte da primeira turma do
Liceu de Humanidades de Campos, onde começou a defender o ideal republicano.
Nesta época, quando ouvia no comércio do pai as conversas sobre política,
escreveu o único número do jornal A República. No Liceu, redigiu com os
irmãos e alguns colegas a folha O Liberal, enquanto os simpatizantes do
Partido Conservador criaram O Diáfano. Completou o ensino secundário
no Rio de Janeiro, onde se preparou para entrar na Faculdade de Direito
(iniciou o curso em São Paulo e terminou em Recife). Nesta ocasião, divulgou
entre os colegas um artigo que sintetizava sua visão dos acontecimentos
políticos que se ensaiavam: "A República e a Abolição são irmãs gémeas.
Precisamos, desde já, organizar socialmente o nosso povo". Mas não só da
militância e dos estudos vivia o "menino da padaria". Na capital
pernambucana, costumava apreciar as belezas femininas nas horas vagas, como
registrou o ex-ministro Brígido Tinoco (1910-1982).
Formado em 1887, voltou para
Campos e abriu banca de advogado. Dedicou-se pouco à profissão, preferindo a
política. Elegeu-se deputado constituinte (1890-1891) e deputado federal pelo
Partido Republicano Fluminense, entre 1891 e 1903. Nessa época, casou-se com a
campista Ana de Castro Belisário Soares de Sousa, mais conhecida por Anita,
filha de fazendeiros. Republicana, foi companheira fiel e conselheira política
do marido. Tiveram quatro filhos: a primeira, natimorta, seguida por Nilo,
Zulma e Mário. Em 1903 chegou ao Senado, mas trocou a vaga pela presidência do
Rio de Janeiro sucedendo ao "republicano histórico" Quintino
Bocaiúva (1836-1912), seu padrinho de casamento.
No governo do estado
(1903-1906), Peçanha desenvolveu uma plataforma intervencionista - em voga no
país devido à crise do café - de incentivo à agricultura e à indústria. Para
tanto, diminuiu a carga tributária sobre os produtores, ampliou ferrovias,
criou escolas profissionalizantes e arrochou as despesas com o funcionalismo
público.
O fim da gestão no Rio coincidiu
com o início da campanha para a Presidência da República. Na primeira ruptura
entre Minas e São Paulo na "política do café-com-leite", Afonso Pena
foi escolhido para suceder a Rodrigues Alves (1848-1919) e Nilo Peçanha para
vice-presidente por sua ligação com os agricultores fluminenses. Foi eleito com
272.529 votos.
No cargo, protagonizou uma
história curiosíssima: no início do governo, presidente e vice eram próximos,
mas aos poucos se afastaram. Para não cair no esquecimento típico dos vices,
Nilo adotou uma estratégia relatada pela historiadora Isabel Lustosa: toda vez
que desaparecia da cena política postava em sua varanda um cabide repleto de
quepes de militares, supostamente reunidos com ele, a fim de demonstrar
prestígio.
Mas deixou sua marca. Estruturou
o Ministério da Agricultura, criado na gestão anterior, e favoreceu a
atividade (67% dos brasileiros, que contavam cerca de 23 milhões, viviam no campo).
Criou o ensino agronômico e estações experimentais de cultivo da
cana-de-açúcar. Para incentivar o setor destinou certa vez um prémio de
sessenta mil-réis (suficiente para abastecer de lenha uma casa em São Paulo
por dois meses) aos sericicultores (produtores de seda) "que
apresentassem casulos de produção nacional" e comprovassem manter pelo
menos
3 mil amoreiras
"regularmente tratadas". Criou a Diretoria de Meteorologia,
subordinada ao Ministério da Agricultura, em 1909 e, no ano seguinte, o Serviço de
Proteção ao índio. No campo da indústria, a siderurgia teve atenção especial.
Afinal, o Brasil precisava se inserir na conjuntura mundial de avanços
tecnológicos, iniciada na segunda metade do século XIX - a chamada Segunda
Revolução Industrial-, intimamente ligada à utilização do ferro. E como o governo
pretendia ampliar as ferrovias, planejou tirar partido das jazidas nacionais
uma vez que o país exportava ferro e importava trilhos. Para promover a siderurgia,
foi montada uma comissão de estudos e procurou-se atrair capitais externos.
Mas este modelo industrial só seria plenamente concretizado em 1941, com a fundação
da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN).
A imprensa, atenta a todas as
ações do governo, levantou dúvidas de que o presidente estaria envolvido em
acordos suspeitos com a Leopoldina Railway, empresa britânica que em 1898
encampou a Companhia Estrada de Ferro Leopoldina. Os acordos visavam à expansão
da malha ferroviária e renderam a Nilo Peçanha mais um apelido, dessa vez nada
singelo: "moleque presepeiro", referência preconceituosa à
ascendência negra do presidente.
Se por um lado Nilo se esforçava
para promover o desenvolvimento do país, por outro não desejava se ocupar da
disputa sucessória - ao assumir adotou o lema "Paz e Amor", alvo de
várias sátiras. Mas os rumos da política mudaram seus planos. Em campos
opostos estavam o general gaúcho Hermes da Fonseca (1855-1923) e o senador
baiano Rui Barbosa (1849-1923). O primeiro, apoiado pelas oligarquias do Rio
Grande do Sul, de Minas Gerais, e pelo senador Pinheiro Machado (1851-1915),
seu conterrâneo, eminência-parda na política da Primeira República. O segundo,
mentor da Campanha Civilista, contra mais um militar no poder, apoiado por São
Paulo e Bahia.
O caldo quente da disputa respingou
em alguns estados motivando a intervenção federal. O caso mais rumoroso foi o
da deposição do presidente do Amazonas, Antônio Clemente Ribeiro Bittencourt (1908-1913), substituído pelo vice,
Sá Peixoto. Simpático a Rui Barbosa, ele foi cassado por uma manobra de
Pinheiro Machado junto aos parlamentares amazonenses que acusavam Bittencourt
de improbidade por ser sócio de uma tipografia que prestava serviços ao
estado.
Desejando restituir à legalidade
o governo do Amazonas, se assim permitisse a Constituição, Peçanha convocou o
ministro da Guerra, general José Bernardino Bormann (1844-1919), e declarou:
"procederei fira a quem ferir". Era um recado a Pinheiro Machado.
Mesmo diante do parecer contrário de Rui Barbosa, Antônio Bittencourt foi
reconduzido ao cargo com apoio federal.
Com essa atitude o presidente
rompeu com Pinheiro Machado e colocou uma pá de cal no passado de participação
nas concorridas reuniões políticas, regadas a chimarrão, na casa do senador.
Muito comentados na imprensa, os encontros renderam aos frequentadores o
rótulo de bajuladores pelo hábito de segurar o bico da chaleira para ver se a
água da tradicional bebida gaúcha ainda estava quente, conhecido pejorativamente
a partir daí como "pega-na-chaleira".
Nilo teve que enfrentar a imprensa
e a opinião pública, como se pode perceber nos trechos da marchinha
"Goiabada" (1922), de Eduardo Souto (1882-1942): "Meu
benzinho/ Caladinho escuta/A goiaba/Nunca foi boa fruta" e "O
arroz de Pendotiba/ Nunca chegou aqui ao mercado/ Nem mesmo lá em riba/ O tal
arroz nunca foi achado", que ironizava a origem do candidato, lembrando
o doce típico de Campos, e seus planos frustrados de plantar arroz nos pântanos
de Pendotiba, em Niterói.
Para suceder a Epitácio Pessoa
(1919-1922), compôs a chapa da Reação Republicana - uma alternativa das
oligarquias do Rio Grande do Sul, Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro à
indicação de Arthur Bernardes (1875-1955), apoiada por Minas e São Paulo - tendo
como candidato a vice seu antigo professor de Direito e então presidente da
Bahia, José Joaquim Seabra (1855-1942). Apesar do empenho da Reação Republicana,
Bernardes venceu.
No saldo da derrota veio o abalo
da saúde. Nilo Peçanha sofreu uma cirurgia de vesícula, mas faleceu em 31 de
março de 1924. Ironicamente, se fosse eleito, morreria antes de completar dois
anos de mandato, o que exigiria, pela Constituição, a escolha de um novo
presidente.
Fabiano Vilaça dos Santos é doutorando em História Social na USP e
pesquisador em Nossa História.
Fonte: Revista Nossa História - Ano III nº 31
– Maio - 2006
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