“E agora que vocês viram no que a coisa deu, jamais esqueçam como foi que tudo começou” (Bertolt Brecht)

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Massacre em Unaí: oito anos de impunidade

Como foram mortos os fiscais que autuavam fazendeiros por manter trabalhadores escravizados? Por que a região tornou-se recordista em uso de agrotóxicos e incidência de câncer?
Por Gilvander Luiz Moreira*, Adital

Era dia 28 de janeiro de 2004, 8h20’ da manhã. Em uma emboscada, cinco jagunços dispararam rajadas de tiros em quatro fiscais da Delegacia Regional do Ministério do Trabalho, perto da Fazendo Bocaina, município de Unaí, Noroeste de Minas Gerais. Passaram-se 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 anos. Justiça? Cadê? Dia 28 de janeiro completou oito anos desse bárbaro massacre. Quatro indiciados como mandantes estão soltos. São: Antero Mânica (prefeito de Unaí, pelo PSDB), Norberto Mânica (“rei do feijão” (?)), Hugo Pimenta e José Alberto Costa, que contratou os executores. Estão presos quatro dos acusados: Francisco Pinheiro, Erinaldo de Vasconcelos Silva, Rogério Alan da Rocha Rios e William Gomes de Miranda. Humberto Ribeiro dos Santos, acusado de haver sido o encarregado de apagar as provas do crime, foi libertado.

Antes do tempo, na maior chacina contra agentes do Estado brasileiro, foram ceifadas as vidas de Erastótenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares Lage e Nelson José da Silva (Auditores Fiscais do Trabalho) e Ailton Pereira de Oliveira (motorista oficial). Por quê? Como servidores éticos, estavam cumprindo seu dever: fiscalizando fazendas no município de Unaí. Multaram vários fazendeiros. A família Mânica, por exemplo, foi multada em mais de 3 milhões de reais. Após uma infinidade de recursos, pagaram apenas 300 mil reais. As multas foram por terem encontrado trabalhadores em situações análogas a escravidão, sobrevivendo em condições precárias e se envenenando com a aplicação exagerada de agrotóxicos na monocultura do feijão. Por isso, os fiscais foram ameaçados de morte. O fiscal Nelson chegou a fazer um relatório alertando sobre as ameaças de morte que vinha sofrendo. E, tragicamente, não ficaram só nas ameaças, aconteceu um massacre.

Quem matou e quem mandou matar? Em um arrojado processo de investigação das Polícias Federal e Civil, um grande elenco de provas robustas consta do processo, tais como: a) confissão dos jagunços que estão presos; b) pagamento de 45 mil reais em depósito bancário; c) automóvel da mulher de Antero Mânica usado pelos jagunços; d) nomes e identidades dos jagunços no livro do hotel, em Unaí, onde estavam hospedados os fiscais, comprovando que lá dormiram também os jagunços; e) depoimento do Ailton, motorista dos fiscais, que, após recobrar a consciência, após o massacre ainda encontrou forças para dirigir a camionete até a estrada asfaltada, mas morreu sendo levado para socorro em Brasília; f) uma série de telefonemas entre os jagunços e mandantes, antes e depois da chacina; g) um automóvel encontrado jogado dentro do Lago Paranoá, em Brasília; h) relógio do Erastótenes encontrado dentro de uma fossa, na cidade de Formosa, GO, conforme confissão dos assassinos; etc.

Os fiscais estavam ali para defender os direitos de trabalhadores do campo explorados por grandes grupos empresariais e submetidos a condições indignas de trabalho. São mártires da ganância dos poderosos e da luta contra o trabalho escravo. Dia 28 de janeiro se tornou Dia de combate ao trabalho escravo.

No 3º aniversário do massacre, em 2007, no local onde o sangue dos fiscais foi derramado, Dom Tomás Balduíno, ex-presidente e atual Conselheiro da Comissão Pastoral da Terra, denunciava: “Este covarde massacre dos 4 fiscais não pode ficar impune. Cadê a justiça? Massacre como este não é exceção. Tem sido a regra. Cinco jagunços estão presos e quatro supostos mandantes continuam soltos. O inquérito já foi feito. Há 9 indiciados. A impunidade nestes casos alimenta a espiral de violência. Exigimos o julgamento já, sem mais demora. Chega de enrolação! Que se julgue e puna não apenas os jagunços, mas também os mandantes. Os fiscais foram vítimas da luta contra o trabalho escravo. A Comissão Pastoral da Terra diz que há mais de 25 mil pessoas ainda submetidas a situação análoga à escravidão no Brasil. Os fiscais foram vítimas do agronegócio, das monoculturas da soja, do feijão, da cana-de-açúcar, do eucalipto. Exigimos justiça já, em nome do Deus da vida.”

Marinês, viúva do fiscal Erastótenes, com a voz embargada, em meio a lágrimas, clama por justiça: “Ao saber que meu amado marido Erastótenes tinha sido assassinado junto com João Batista, Nelson e Ailton, uma espada de dor transpassou meu coração e continua transpassando, porque a justiça ainda não foi feita. A dor e a angústia continuam muito grande diante da impunidade. Pelo amor de Deus, julguem logo os assassinos, jagunços e mandantes. Os fiscais foram assassinados durante seu trabalho, por trabalharem bem, por serem honestos, por não se corromperem e por cumprirem o seu dever. Exigimos justiça! Que mais este massacre não fique na impunidade.”

No final de 2011 o julgamento foi desmembrado. Dizem que primeiro serão julgados os jagunços e depois – não se sabe quando – os indiciados como mandantes. Separar os jagunços dos mandantes pode ser uma manobra que dificultará mais ainda a condenação dos mandantes.

Enquanto reina a injustiça, a impunidade, o município de Unaí se transformou em campeão na produção de feijão, no uso de agrotóxico e no número de pessoas com câncer. Relatório do deputado Padre João (PT) demonstra que o número de pessoas com câncer, em Unaí, é cinco vezes maior do que a média mundial. A cada ano, 1260 pessoas contraem câncer na cidade. Aliás, um hospital do câncer já está sendo construído no município, pois ficará menos oneroso do que levar toda semana vários ônibus lotados de pessoas para se tratarem de câncer no estado de São Paulo. As águas e a alimentação estão contaminadas pelo uso indiscriminado de agrotóxico. A fama que espalhou pela região é que o feijão de Unaí está envenenado, pois do plantio até a colheita aplicam até 15 vezes fungicida, inseticida e herbicida, muitos desses venenos já são proibidos na Europa e EUA. Confiram o Filme-documentário “O veneno está na mesa”, de Sílvio Tendler.

A impunidade alimenta também o agravamento do trabalho escravo no país. No final de setembro de 2010, uma operação coordenada pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Minas Gerais (SRTE/MG) libertou 131 pessoas escravizadas em lavouras de feijão na Fazenda São Miguel e na Fazenda Gado Bravo, localizadas respectivamente em Unaí (MG) e Buriti (MG). Nenhum dos libertados tinha a Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) assinada. A jornada da capina e colheita do feijão começava as 4h30 e se estendia até às 14h30, sem que fosse respeitado o intervalo para repouso e alimentação. Segundo depoimentos, a labuta se estendia aos domingos, em descumprimento ao descanso semanal. O pagamento feito pelo “gato”, que subtraía boa parte dos recursos que vinha dos proprietários, era por produção, sem qualquer recibo. Havia um sistema de endividamento dos empregados por meio de uma cantina em que alimentos, produtos de higiene e outros gêneros eram “vendidos” a preços mais altos que os praticados pelo mercado. O transporte de trabalhadores era completamente irregular e o manuseio de agrotóxicos (armazenamento, sinalização e estrutura exigidas), inadequado. A lista suja de trabalho escravo em 2011 se tornou a maior da história: 294 fazendeiros utilizaram-se deste sistema. Em 2011, houve um aumento de 23% nos casos de trabalho escravo no campo, aponta CPT. Foram 3.882 casos identificados, mas regatados somente 2.271 trabalhadores escravizados.(…)

Um grito por justiça está ecoando há 8 anos: O povo de Minas, do Brasil e do Mundo exige o julgamento já dos assassinos dos fiscais. Exigimos justiça! Que os jagunços e mandantes sejam julgados e condenados.
Belo Horizonte, 20 de janeiro de 2012.

Frei Gilvander Moreira; mestre em Exegese Bíblica; professor no Instituto Santo Tomás de Aquino – ISTA/BH e no Seminário da Arquidiocese de Mariana, MG; assessor da CPT, CEBI, SAB e Via Campesina gilvander@igrejadocarmo.com.br

Assista, nos cinco links, abaixo, reportagem complementar, em vídeo, feita por Gilvander Moreira.
1) Entrevista com Helba, viúva de Nelson, um dos quatro fiscais matados em Unaí em 28/01/2004 – 07/01/2012. http://www.youtube.com/watch?v=FEDXGHepSFo
2) Oito anos do massacre de 4 fiscais do MTE, em Unaí – Entrevista com Calazans – 1a parte – 12/01/2012. 
http://www.youtube.com/watch?v=wTbKFTEQM_o
3) Entrevista com Carlos Calazans sobre o Massacre de 4 fiscais do MTE, em Unaí – 2aparte – 12/01/2012. 
http://www.youtube.com/watch?v=lNxSXMJ5xrM
4) Feijão de Unaí está envenenado? – Fala de Edivânia, de Escola Municipal de Arinos – 10/01/2012. 
http://www.youtube.com/watch?v=uOrtJVd-A0Q
5) Agrotóxicos – perigo – Testemunho de Washington Fernandes Moreira – de Arinos, MG – 10/01/2012. 
http://www.youtube.com/watch?v=YFT0l27n6X4

O VENENO ESTÁ NA MESA
Filme de um dos maiores documentaristas do Brasil, Silvio Tendler, mostra o cenário assustador que se encontra o país em relação ao uso indiscriminado de agrotóxicos. O documentário mostra o perigo a que a população está exposta por conta do emprego de agrotóxicos na agricultura, e como este modelo beneficia as grandes transnacionais do veneno em detrimento da saúde da população. A população engole os produtos envenenados e as empresas ficam com os lucros.

E, além da população, que consome os alimentos oriundos da produção agrícola, trabalhadores que manipulam os venenos também estão à mercê da contaminação e prejuízos com a saúde.

Você sabia que o Brasil é o país que mais pulveriza agrotóxicos nos alimentos? Que é o recordista em consumo desses químicos?
Que um brasileiro consome em média 5,2 litros de agrotóxicos anuais?
Que os agrotóxicos provocam uma série de problemas de saúde, desde lapso de memória em crianças até má formação dos fetos?
Que apesar do Governo tentar proibir uso de muitos químicos, a justiça concede liminares a favor das grandes corporações químicas?
Que para conseguir crédito junto aos bancos o pequeno trabalhador é obrigado a usar transgênicos e pesticidas? Que as doenças provocadas por esses químicos nos trabalhadores do campo consomem 1,8% do PIB em tratamentos médicos?
Direção: Silvio Tendler
Duração: 50 Min.
Ano: 2011
Áudio: Português

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

A Privataria Tucana

O jornalismo não morreu
'Privataria Tucana' prova que a reportagem de investigação está viva e José Serra, aparentemente, morto.
Celso de Castro Barbosa

     Engana-se quem imagina morta a reportagem de investigação no Brasil. Embora os jornalões, revistas semanais e emissoras de TV emitam precários sinais vitais do gênero, ele está vivíssimo, como prova A Privataria Tucana, livro do premiado repórter Amaury Ribeiro Jr.
     Lançado em dezembro e recebido pela grande imprensa com estridente silêncio, seguido de críticas que tentaram desqualificar a reportagem e o autor, o sucesso do livro, já na terceira edição e no topo das listas dos mais vendidos, não se deve a suposto sentimento antitucano.  Até porque os fatos objetivos relatados não poupam o PT. Não há santos na Privataria.
     Com base em documentos oficiais, da CPI do Banestado e outros que o autor conseguiu em cartórios, Amaury torna pública a relação de dirigentes do PSDB e a abertura de contas no exterior de empresas de fachada, responsáveis pelo retorno ao Brasil do dinheiro sujo da corrupção. Dinheiro que voltou, naturalmente, limpo.
     Muita gente deve explicações à Justiça que, nesse episódio como em outros envolvendo expressivos representantes da elite brasileira, move-se a passos de tartaruga. Ou simplesmente não se move. Pelo cargo que ocupou na época das tenebrosas transações, as privatizações da era FHC, José Serra, então ministro do Planejamento e depois duas vezes candidato à presidência, prefeito e governador de São Paulo, é quem tem a imagem mais chamuscada, para não dizer estorricada, ao fim da Privataria Tucana.
     De origem humilde, o tucano paulista exibe patrimônio incompatível com os rendimentos de um político. Tudo em nome de sua filha, Verônica, que ao lado de Ricardo Sérgio, tesoureiro das campanhas de Serra e Fernando Henrique, emergem como principais parceiros do ex-governador no propinoduto que marcou a venda das empresas de telecomunicação.
     Além de jogar uma pá de cal na aura de honestidade de certos tucanos, o livro de Amaury tem ainda o mérito de questionar, involuntariamente, a atuação da grande imprensa no país. Agindo como partido único, onde só é permitida uma única opinião, jornais, revistas e mídia eletrônica defenderam, com unhas e dentes, a privatização. O principal argumento era a vantagem que traria aos consumidores: eficiência e tarifas baixas por causa da concorrência. Passados mais de dez anos, o Brasil cobra tarifas de telefone das mais altas do planeta e as concessionárias são campeãs de reclamação nos Procons.
     Não bastasse, ao ignorar o lançamento do livro, a imprensa hegemônica mostra sua face semelhante à dos piratas: um olho tapado, que nada vê, e outro atento à movimentação dos adversários.

FONTE: http://www.revistadehistoria.com.br/
Titulo: A Privataria Tucana
Editora: Geração
Lançamento: 2011
Páginas: 344
Formato: PDF
Tamanho: 21 MB

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

#StopSOPA: hipóteses sobre a luta pela internet livre


Protestos virtuais desta semana têm muito em comum com “indignados” ou “Occupy”. Por que alcançaram uma vitória parcial tão rápida?

Na noite de quarta-feira (18/1), quando alguns dos sites de maior audiência no planeta ainda exibiam os símbolos da campanha contra as leis de censura em debate nos EUA, surgiram os primeiros sinais claros de vitória. Diversos parlamentares, de ambos os partidos, que apoiavam os projetos denominados SOPA [1] (na Câmara de Representantes) e PIPA [2] (no Senado), anunciaram (no Twitter ou Facebook...) que estavam revendo suas posições. No Senado, a mudança de clima teve sabor de um gol nos últimos suspiros do segundo tempo. Há poucas semanas, o Comitê Judiciário (semelhante à Comissão de Constituição e Justiça no Brasil), havia aprovado a PIPA – por unanimidade e sem nenhuma controvérsia. A votação final começaria na semana que vem. Está suspensa. Mesmo os principais defensores do projeto agora se dizem favoráveis a “decidir sem pressa”.

Não foi, evidentemente, um resultado definitivo. Há mais de uma década, a internet está na mira de grandes corporações que não aceitam o compartilhamento livre de bens culturais – porque ganham dinheiro vendendo o que poderia ser de todos. Mesmo a SOPA e a PIPA não morreram: estão “esperando nas sombras”, como alerta a Wikipedia, em nota 1 divulgada quinta-feira para celebrar e agradecer a mobilização dos internautas contra as leis.

Um sinal de que a disputa será longa e bruta deu-se já na quinta-feira. Uma mega-operação conjunta do Departamento de Justiça dos EUA e do FBI 
fechou 2, sob acusação de pirataria, o site MegaUpload 3. Era um espaço muito popular para troca de conteúdo digital entre internautas (72ª maior audiência da internet, segundo o comparador Alexa 4). Seu bloqueio deu-se com base em legislação já existente. Teve dimensão internacional: quatro pessoas estão presas na Nova Zelândia, por “crimes” (operar os servidores do site) que podem resultar em 55 anos de prisão. Foi consequência de uma ação movida contra o Megaload pelos cartéis da indústria cultural; Tiveram seu prêmio de consolação... [3].

Pelo menos dois grandes motivos convidam a examinar em profundidade a grande jornada de quarta-feira e seu resultado. Há muito em jogo: SOPA e PIPA poderão desencadear, se aprovadas, uma onda de proibições e limites capaz de desfigurar o que o sociólogo Manuel Castells  5 como a “cultura de liberdade” na internet.

Além disso, há laços muito fortes entre a resistência às duas leis e as causas que sensibilizam osindignados, os participantes do Occupy, os manifestantes da Praça Tahrir ou os que resistem à militarização da Luz, em São Paulo.

> Em todos estes casos, quem luta são multidões (principalmente jovens) e não uma classe ou grupo social específico. Prevalece a autonomia: as campanhas são organizadas diretamente pelos envolvidos, sem que seja necessária a intermediação de grupos políticos ligados às dinâmicas da representação.

> Deseja-se impedir que o poder econômico capture o comum: riquezas (às vezes imateriais), direitos e bens como a internet livre, os serviços públicos, a possibilidade de encontrar uma ocupação ou almejar uma aposentadoria dignas. Mesmo na Tunísia e Egito, onde a luta assumiu forte conteúdo anti-ditatorial, ela foi deflagrada pelo desemprego e alta do preço dos alimentos, após medidas de “ajuste fiscal”.

> Denuncia-se o 
declínio da democracia 6 (ou, no mundo árabe, sua ausência 7). Enfrentam-se decisões que atingem gravemente a sociedade, mas são tomadas sem nenhuma consulta a ela, de forma opaca, por “exigência” 8 da oligarquia financeira.

> Propõem-se, ainda de forma embrionária e tateante, novas formas de organizar a vida social. Os laboratórios podem ser as praças (onde se reorganizam os serviços de alimentação, autoeducação, saúde, limpeza e segurança) ou a internet, grande praça global. Os valores que orientam esta busca têm forte caráter pós-capitalista: compartilhamento, cooperação, solidariedade, desierarquização, democracia direta, busca de consensos. Não se trata de disputar o comando das sociedades industriais, como fazia o socialismo dos séculos passados; mas de realizar a transição para sociedades articuladas segundo outras lógicas. Não são projetos oníricos, mas concretos e às vezes pragmáticos. A multidão  organiza a internet, em grande medida, segundo princípios de compartilhamento. Ao criar “serviços públicos alternativos” nas praças ocupadas do Egito, Espanha, Grécia ou Israel, os jovens sinalizavam que querem construir o novo agora, com suas mãos.

Em meio a tantas semelhanças, o protesto virtual desta semana distingue-se de todos os demais em algo essencial. Ele foi capaz de alcançar uma vitória. Concreta e muito relevante – ainda que parcial e provisória. Estudar as razões desta diferença, buscar o que separa uma mobilização bem-sucedida de outras que ainda amadurecem, é um exercício necessário e sedutor. Desde já, vale adiantar quatro hipóteses, complementares entre si.

A primeira, e mais óbvia, diz respeito às pretensões absurdas da SOPA/PIPA, em suas versões iniciais. Entre muitos outros pontos, as leis incluem uma forma de controle da internet (bloqueio ou desvio de DNS) idêntica à praticada na China, Irã ou Síria. Ferem o direito internacional: são extraterritoriais – ou seja, atingem cidadãos e empresas não submetidos às leis norte-americanas.

Estabelecem penas inteiramente desproporcionais, como prisão para os “culpados” de troca de arquivos. Permitem que os cartéis da indústria cultural façam justiça com as próprias mãos (dispensa-se ordem judicial para medidas como tirar um site do ar). Quem tramou semelhantes bizarrices confiou cedo demais no esvaziamento completo da democracia tradicional.
Mas as demais hipóteses são as mais fascinantes, porque dizem respeito ao debate sobre estratégias, necessário também nos movimentos que reivindicam autonomia. Tudo indica que o #StopSOPA alcançou sua vitória parcial porque: a) definiu muito claramente um foco, um objetivo concreto a ser alcançado. Foi além das fórmulas ambiciosas, porém genéricas demais, e, portanto inócuas, do tipo no nos representanb) apoiou-se no tecido pós-capitalista da internet – muito mais desenvolvido que nas demais relações sociais. A rede está povoada por iniciativas contra hegemônicas de enorme alcance. A Wikipedia 9 e o Wordpress 10, por exemplo, servem centenas de milhões de pessoas todos os dias e articulam comunidades de milhões; c) explorou contradições no campo do capital. Nos protestos de quarta-feira, chamou enorme atenção a adesão do Google, cuja página de entrada exibiu uma tarja negra sobre seu próprio logotipo e a mensagem: “Diga ao Congresso: por favor, não censure a Web” – que remetia a um excelente texto (in) formativo. Que Parlamento ousará adotar uma posição antipopular tendo um adversário como estes?

Como se armou este conjunto de condições muito particulares? Será possível construir, em lutas futuras, cenários igualmente favoráveis? É o que tentaremos examinar, em textos futuros desta série.

[1] Stop Online Piracy Act 11, ou Lei contra a Pirataria Online 12.
[2] Protect Intellectual Property Act 13, ou Lei para a Proteção de Propriedade Intelectual 14.
[3] Como a ação contra o Megaload foi movida pelos cartéis da indústria cultural, o coletivo
Anonymous 15 lançou, em 20/1, uma onda de ataques que derrubou, por algumas horas, os sites do cartel fonográfico (a RIAA), da Universal Music e do próprio Departamento de Justiça.


domingo, 22 de janeiro de 2012

Salve a Internet - a pressão está funcionando!



Hoje pode ser o dia em que salvamos a Internet livre.
O Congresso dos EUA estava prestes a aprovar leis que permitiriam que seus funcionários censurassem o acesso a qualquer site em todo o mundo. Mas depois que entregamos nossa petição com 1.250.000 assinaturas para a Casa Branca, que saiu contra os projetos, e com a pressão da opinião pública em alta, até mesmo alguns apoiadores dessas leis estão mudando de lado. Nesse momento, o protesto de apagão liderado pela Wikipédia trouxe a campanha para o centro das atenções das notícias.
Estamos virando o jogo. Mas as forças da censura estão tentando ressuscitar os projetos de lei agora. Vamos enterrá-los para sempre. Clique agora para assinar esta petição de emergência para salvar a Internet e se você já tiver assinado, navegue até o final da página para contatar políticos e empresas que apoiam a censura e falem para eles desistirem dessa legislação. Em seguida, envie para todos.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

A cracolândia que você não vê

Charge
Maringoni
"Quem se aproxima tem uma surpresa. A mão áspera é quente, os olhos ainda lacrimejam, há pulsação e sorrisos sinceros”.
Talita Ribeiro, do Coletivo Cracolândia

     Todo paulistano médio conhece a região da Luz/José Paulino/Santa Ifigênia como sendo boa para compras, de eletrônicos ou roupas. Todo paulistano culturalmente ativo sabe que ali há o Museu da Língua Portuguesa, a Pinacoteca e a Sala São Paulo. Todo e qualquer paulistano não ousaria pisar lá (literalmente, a pé) depois das 22h. Porque à noite, o comércio e a cultura são outros. E quem circula pela área não é considerado cidadão da metrópole mais rica do país.
     Quem ocupa as esquinas, quadras e avenidas, se mistura com o lixo e divide espaço com os ratos, que cruzam as ruas a procura de comida. À noite não há quem desvie dos moribundos ou crianças alucinadas. E, vez em quando, se tem a impressão que não há uma alma viva sequer, mesmo que oitenta usuários de crack estejam ocupando uma mesma sarjeta. Até quem tenta se inserir nesse meio — por política, trabalho ou missão — dificilmente consegue penetrar nessa outra realidade, onde o olhar não para, nem brilha, mas ainda busca, desesperadamente, por 8 segundos.
     “De 5 a 8 segundos é o tempo que dura o ‘barato’ do crack. Nesse curto espaço de tempo, dizem, a sensação é equivalente a 8 orgasmos”, conta um dos missionários do Cena, que conversa com os dependentes durante a noite, para convidá-los a conhecer o projeto e, quem sabe, embarcar numa outra viagem — a de reabilitação. Ele circula normalmente entre a aglomeração de usuários.
     Diferente do que os telejornais ensinam a cracolândia não é um lugar sem leis. Religiosos são respeitados e, muitas vezes, ignorados pela massa. Quando a polícia derrapa com as viaturas nas ruas e saca seus (desnecessários) sprays de gás de pimenta, todos vão para outra esquina. Quando um segurança de uma loja qualquer manda eles saírem, o mesmo acontece. Não há sexo e violência explícita na rua. Não o tempo todo. Não o suficiente para concorrer com qualquer balada de classe média alta em uma sexta à noite. Os usuários vez em quando discutem entre si, mas os gritos são, em sua maioria, parte da negociação de droga.
     “Quem dá dois por uma pedra? Quem tem uma nota de cinco? E um cachimbo novo?” Com frases desse tipo a “bolsa do crack” funciona a noite inteira, com usuários pra lá e pra cá comprando e vendendo tudo o que podem, de cigarros a 25 centavos até salsichas vencidas achadas no lixo. Nesse mercado quase todos são compradores em potencial, menos os que chegam em bicicletas, trazendo mais pedras em sacolas plásticas, para fazer girar a roda da dependência. Quem não está negociando, só pode estar consumindo, procurando restos na calçada ou tentando tirá-los do cachimbo. Nesse ciclo nada que não tenha ligação com o crack importa. Ninguém liga para os carrões que cruzam a região noite adentro para comprar a droga. E não é raro ver pessoas bem vestidas e com tênis da moda fumando ao lado de moradores de rua. Não existe mais rico ou mais pobre quando se está rente ao chão.
     Nesse contexto, crianças de dez anos agem como se tivessem o dobro. São chamadas de “dimenor”, mas só isso as diferencia dos demais. Com uma casca dura de sujeira preta ou incrivelmente limpas, elas sabem o próprio nome, há quanto tempo estão nessa vida, onde doem as feridas e, principalmente, que precisam de uma pedrinha. Os traços infantis quase se perdem em meio a tanta opressão, mas quando pedem ajuda para conseguir a próxima brisa, são como tantas outras crianças pedindo um doce. E são frágeis, muito mais frágeis do que aparentam quando as olhamos de canto de olho, andando a passos rápidos. Mas essa não é uma característica só delas.
     Os usuários de crack vistos de perto e em seu habitat, em nada lembram os retratados em telejornais. No lugar do medo e do ódio, despertam uma tristeza imensa, acompanhada por um sentimento de impotência. Nada que não seja a pedra parece tocá-los — inclua aí a sua presença. Mas quem, mesmo assim, tenta se aproximar tem uma surpresa. A mão áspera é quente, os olhos ainda lacrimejam, a voz embarga ao contar sobre o passado, ainda há pulsação e sorrisos sinceros. Apesar de toda a ânsia pela droga, há outros tipos de carências não supridas, tão importantes quanto. E para tratá-las é preciso bem mais que 8 segundos. Mas isso o paulistano ainda não sabe.

(Mais informações sobre o Coletivo Cracolândia e o contexto em que surge em nosso blog)

SAIBA MAIS:
DOCUMENTÁRIO
Quebrando O Tabu

Quebrando o Tabu tem como principal objetivo a abertura de um debate sério e bem informado sobre o complexo problema das drogas no Brasil e no mundo. O filme pretende aproximar diversos públicos, entre eles os jovens, os pais, os professores, os médicos e a sociedade como um todo, para que se inicie uma conversa franca que leve a diminuição do preconceito, ajude na prevenção ao uso de drogas e que dissemine informações com base científica sobre o tema. O âncora do filme é o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso que aceita o convite do diretor Fernando Grostein Andrade para uma jornada em busca de experiências que tiveram êxitos em vários lugares do mundo, sempre em diálogo com jovens locais e profissionais que se dedicam a tratar a questão das drogas de forma mais humana e eficaz do que as propostas na “guerra às drogas”, declarada pelos EUA há 40 anos.
Os danos causados, pela “guerra às drogas”, nas pessoas e na sociedade só cresceram. Abusos, informações equivocadas, epidemias, violência e fortalecimento de redes criminosas são os resultados da guerra perdida numa escala global. Num mosaico costurado por Fernando Henrique Cardoso, "Quebrando o Tabu" escuta vozes das realidades mais diversas do mundo em busca de soluções, princípios e conclusões. Bill Clinton, Jimmy Carter e ex-chefes de Estado, como da Colômbia, do México e da Suíça, revelam porque mudaram de opinião sobre um assunto que precisa ser discutido e esclarecido. Do aprendizado de pessoas comuns, que tiveram suas vidas marcadas pela Guerra às Drogas, até experiências de Dráuzio Varella, Paulo Coelho e Gael Garcia Bernal, "Quebrando o Tabu" é um convite a discutir o problema com todas as famílias.
Direção: Fernando G. Andrade
Duração: 71 minutos
Ano: 2011
Áudio: Português
Tamanho: 736 MB


FILME
O Informante

Baseado em fatos reais, que levaram a indústria do tabaco a pagar mais de US$ 246 trilhões em indenizações nos Estados Unidos, a história gira em torno de um cientista que, após sua demissão da empresa por se recusar a continuar compactuando com ela após a constatação, por meio de experimentação científica, de como o método de produção do cigarro perpetuava o vício da nicotina, passa a ser perseguido por seus antigos empregadores. Estes são receosos de que ele viesse a revelar o segredo para a população, o que abalaria significativamente os negócios.
Apoiados em um termo de confidencialidade assumido por Jeffrey Wigand (Russel Crowe), os advogados da empresa tentam pressionar o cientista por meio de ameaças de corte de benefícios prometidos na rescisão de contrato. Mesmo incomodado com a postura de desconfiança da empresa, o cientista se mostra totalmente decidido a manter o trato assumido, a despeito de seu senso de responsabilidade com a verdade, da consciência da injustiça que estava sofrendo e das dificuldades pelas quais atravessaria a partir daquele momento.
Mas o encontro do personagem com o produtor Lowell Bergman (Al Pacino) de um programa jornalístico "60 Minutos", da rede americana CBS, e a intensa pressão da empresa para que assine outros documentos que garantam o seu silêncio, levam o cientista a refletir sobre a sua responsabilidade com relação ao segredo que guardava. Mas também sobre todas as consequências que iriam recair sobre sua situação trabalhista, financeira e familiar caso quebrasse sua palavra.
Revelando os bastidores de grandes corporações e também de uma grande rede de TV, sua ética e corrupção, o filme de Michael Mann garante momentos de suspense e empolgação, além de ótimos diálogos entre Russel Crowe (o cientista), Al Pacino (o produtor) e Christopher Plummer (o repórter), acerca de ética, responsabilidade social e poder.
Direção: Michael Mann
Duração: 158 minutos
Ano: 1999
Áudio: Português
Tamanho: 799 MB

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Seu e-mail e celular estão sendo vigiados?

Tadeu Breda (Outras Palavras. net)
Empresas alemãs, francesas, britânicas, russas e sul-africanas vendem tecnologia que permite grampear um país inteiro, hackear o seu computador ou controlar o seu celular – sem jamais terem que chegar perto de você.
Por Pratap Chatterjee, Publica
     A indústria de vigilância do século 21 é de alta tecnologia, sofisticada e terrivelmente persuasiva. É isso que revelam mais de 200 e-mails de mala direta e outros materiais de marketing publicados hoje pelo WikiLeaks e a Privacy International.
     O equipamento à venda se encaixa em quatro categorias: localização geográfica de telefones móveis e veículos; invasão de computadores e telefones para monitoramento de cada tecla apertada; captura e armazenamento do que é dito em toda uma rede de telecomunicações; e análise de quantidades vastas de dados para rastrear usuários individuais.
Eles podem saber onde você está
     Uma tecnologia popular de rastreamento em telefonia móvel é o receptor IMSI, que permite ao usuário interceptar telefones.
     Estes dispositivos são muito portáteis – podendo ser menores que a palma da mão – e podem ser camuflados como torres portáteis de celular. Eles emitem um sinal que pode infectar milhares de telefones móveis em uma área.
     O usuário do receptor IMSI pode então interceptar mensagens SMS, chamadas telefônicas e dados de celulares tais como o código de identidade do aparelho, o que permite por sua vez rastrear todos os movimentos do usuário em tempo real.
     Dentre as empresas que oferecem este equipamento estão a Ability de Israel,  Rohde & Schawarz da Alemanha e a Harris Corp dos Estados Unidos.
Não são só governos autoritários que espionam
     O FBI americano, que utiliza estes dispositivos para rastrear suspeitos, diz que isto pode ser feito sem mandado judicial. Muitas forças policiais por todo o mundo também compraram ou consideram a compra de receptores IMSI – como a polícia londrina.
     Outras empresas oferecem dispositivos de vigilância “passivos” – ou seja, que podem ser aplicados sem que o “alvo” perceba que está sendo espionado – que podem ser instalados em estações telefônicas. Também vendem equipamentos que podem sozinhos sugar todos os sinais de telefonia móvel de uma área sem ninguém saber.
Eles podem saber para onde você vai
     Há também equipamentos que podem ser colocados em veículos para rastrear o seu destino. Enquanto empresas de logística e transporte usam há muito tempo estes dispositivos para garantir a chegada das entregas a tempo, a empresa Cobham, de Dorset, no Reino Unido, vende o “Orion Guardian”. Trata-se de um dispositivo camuflado que pode ser secretamente posto no assoalho do carro.
     A Hidden Technology, outra empresa britânica, vende equipamentos similares. Por anos, houve um acordo de cavalheiros sobre como estas tecnologias seriam usadas. Os EUA e o Reino Unido sabem que chineses e russos estão usando receptores IMSI. “Mas nós também”, diz Chris Soghoian, pesquisador do Centro de Pesquisa Aplicada em Ciber segurança, em Washington. “Os governos acham que o benefício de poderem usar essas tecnologias é mais importante que o risco que elas significam para seus cidadãos”.
     “Mas hoje, qualquer um – seja um fanático ou uma empresa privada – pode aparecer em Londres e ouvir o que todos dizem”, observa Soghoian. “É hora de mudar para sistemas com segurança reforçada para manter todos seguros”.
Eles podem controlar seu telefone e computador
     Muitas companhias oferecem softwares “Troianos” e malware telefônicos que permitem controlar computadores ou telefones. O programa pode ser instalado a partir de um pen drive, ou enviado remotamente escondendo-se como anexo em e-mails ou atualizações de softwares. Uma vez instalado, a agência de espionagem pode acessar os arquivos, gravar tudo que é digitado e até ligar remotamente telefones, microfones e webcams para espionar um “alvo” em tempo real.
     A empresa Hacking Team da Itália, a Vupen Security da França, o Gamma Group do Reino Unido e a SS8 dos Estados Unidos oferecem tais produtos. Nas suas propagandas, eles dizem poder hackear IPhones, BlackBerrys, Skype e sistemas operacionais da Microsoft. A Hacking Team, provavelmente a mais conhecida destas empresas, anuncia que seu “Sistema de Controle Remoto” pode “monitorar cem mil alvos” ao mesmo tempo.
     Baseada na Califórnia, a SS8 alega que seu produto,  o Intellego, permite que forças de segurança “vejam o que eles vêem, em tempo real” incluindo “rascunhos de e-mails, arquivos anexados, figuras e vídeos”. Este tipo de tecnologia usa as vulnerabilidades do sistema.
     Enquanto as grandes fabricantes de software alegam consertar falhas assim que são descobertas, pelo menos uma empresa de vigilância – a francesa Vupen – diz ter uma divisão de pesquisadores especializados em “soluções ofensivas”. O trabalho deles é constantemente explorar novas falhas na segurança de softwares populares.
     Sistemas de invasão foram recentemente usados em países com governos repressores. Uma devassa feita em março por ativistas pró-democracia no quartel-general da inteligência do regime Hosni Mubarak no Egito revelou contratos para a compra de um programa chamado FinFisher, vendido pela empresa britânica Gamma Group e pela alemã Elaman.
     Uma propaganda em mala-direta da Elaman diz que governos podem usar seus produtos para “identificar a localização de um indivíduo, suas associações e membros de um grupo, por exemplo, de oponentes políticos”.
Eles podem grampear toda uma nação
     Além de programas de hacking para alvos individuais, algumas empresas oferecem a habilidade de monitorar e censurar os dados de um país inteiro, ou de redes de telecomunicações inteiras.
     A vigilância massiva funciona através da captura das informações e atividades de todas as pessoas em um certo meio, sejam suspeitas ou não. Apenas depois o conteúdo é depurado em busca de informações valiosas.
     Por exemplo, as empresas estadunidenses Blue Coat e Cisco System oferecem a empresas e governos a tecnologia para filtrar certos sites de internet. Isso potencialmente pode ser usado para outras razões além de comerciais, como repressão política e cultural.
     Essas mesmas tecnologias podem ser usadas para bloquear sites de redes sociais como o Facebook, serviços de multimídia como Flickr e YouTube e serviços de telefonia via internet como o Skype em países repressores como a China ou os Emirados Árabes.
    Um subproduto desta tecnologia é a “inspeção profunda de pacotes de dados” que permite escanear a web e o tráfego de e-mails e vasculhar grandes volumes de dados em busca de palavras-chave.
Empresas como a Ipoque, da Alemanha, e a Qosmos, da França, oferecem a habilidade de pesquisar dentro do tráfego de e-mails e bloquear usuários específicos. A Datakom, uma empresa alemã, vende um produto chamado Poseidon que oferece a capacidade de “procurar e reconstruir… dados da web, e-mail, mensagens instantâneas, etc.”. A empresa também alega que o Poseidon “coleta, grava e analisa chamadas” de conversas de Skype.
     A Datakom diz oferecer “monitoramento de um país inteiro”. Ela afirma em seus comunicados de marketing que vendeu dois “grandes sistemas de monitoramento de IPs” para compradores não revelados do Oriente Médio e norte da África.
     Já a sul-africana VASTech vende um produto chamado Zebra, que permite a governos comprimir e guardar bilhões de horas de chamadas telefônicas e petabytes (um bilhão de megabytes) de informações para análises futuras.
     Em agosto,  o Wall Street Journal revelou que alguns dos dispositivos da VASTech foram instalados nas linhas telefônicos internacionais da Líbia.
Eles podem guardar e analisar milhões de dados
     Depois da possibilidade de capturar vastas áreas de tráfego de internet e de localizar pessoas através de seus telefones, veio a necessidade de ferramentas sofisticada de análises para que as agências de inteligência, exércitos e polícia usem os dados em investigações criminais e até durante uma guerra.
     Por exemplo, a Speech Techonology Center, baseada na Rússia, diz ser capaz de vasculhar quantidades enormes de informação. A Phonexia, da República Tcheca, diz ter desenvolvido um programa similar de reconhecimento de voz com a ajuda do exército tcheco. Já a Loquendo, da Itália, usa um sistema de “assinaturas vocais”, identificando “alvos” através da identidade única de cada voz humana para saber quando eles estão ao telefone.

SAIBA MAIS:
1984 / A atualidade do “Grande Irmão” de George Orwell
Em um fictício ano de 1984, no qual o totalitarismo viria a dominar o Mundo inteiro. O Planeta é dividido em três grandes blocos, a Eurásia, a Lestásia e a Oceania, e cada um desses blocos tem basicamente a mesma doutrina ideológica. O Governo controla tudo e o povo vive em um constante estado de alienação, onde são manipulados a acreditar – e pior – a seguir voluntariamente os descabidos preceitos do Partido.
A supressão da liberdade é tão grande que existe a Polícia do Pensamento, a qual punia quem cometia “crimes-ideia” (ideologias diferentes da do Partido), além de filmagens que o Estado fazia das pessoas através de “tele telas” dentro de suas próprias casas. Se não bastasse, o Governo criava a Novilíngua, uma espécie de língua que mantinha apenas uma palavra para expressar um conceito e as outras eram excluídas, juntamente com aquelas que poderiam expressar uma ideia contrária à do sistema dominante. Com isso em um futuro próximo, quase ninguém disporia de recursos linguísticos para formular uma oposição à tal situação. Essa é uma visão pessimista que praticamente não possibilita esperanças.
O protagonista Winston Smith. Ele vive na Oceania, Londres e é funcionário do governo que trabalha para o Ministério da Verdade. Nesse “órgão” as informações antigas são refeitas para criarem uma constante noção de perfeição do Estado e do seu suposto chefe maior: o Big Brother (Grande irmão). Smith, intimamente, não concorda com as atrocidades que o Partido comete, e tenta timidamente se desvencilhar desse poder. Depois de viver um romance com Júlia, uma mulher que pensa como ele, Winston é preso e levado para a tortura (física e mental) na temida sala 101, onde a dor e o medo fazem qualquer homem negar seus ideais e aceitar coniventemente o Grande Irmão.
Direção: Michael Radford
Duração: 113 min.
Ano: 1984
Áudio: Inglês/Legendado
Controle Absoluto
Quando escreveu o romance “1984” e criou o personagem Grande Irmão (Big Brother), George Orwell nunca deve ter imaginado que esta realidade um dia poderia ser possível. Hoje em dia, a alta tecnologia permite o fácil monitoramento dos seres humanos. Por exemplo: vivemos em cidades monitoradas por câmeras de segurança; nossas conversas telefônicas podem ser rastreadas; nossos hábitos, gostos e perfis podem ser descobertos a partir da análise dos sites que visitamos na Internet. É nesta realidade que se passa a trama do filme “Controle Absoluto”, do diretor D.J. Caruso.
Jerry Shaw (Shia LaBeouf) e Rachel Holloman (Michelle Monaghan) são dois estranhos cujos caminhos se cruzam depois de um telefonema feito por uma mulher desconhecida. Ameaçando a vida deles e de suas famílias, a misteriosa voz os coloca em uma série de situações crescentemente perigosas usando a tecnologia do dia-a-dia para rastrear e controlar todos os seus movimentos. São marionetes do jogo de alguém que sabe tudo sobre eles e que arquiteta uma situação em que os dois são os alvos mais procurados pelas autoridades, pois estes suspeitam que o par seja membro de uma célula terrorista que conspira uma série de assassinatos políticos.
Direção: D.J. Caruso
Duração: 117 min.
Ano: 2008

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Encontro com Milton Santos/O Mundo Global visto do lado de cá

     Documentário feito a partir de uma entrevista com Milton Santos, um dos maiores pensadores mundiais, poucos meses antes de sua morte. Mostra os bastidores e consequências da Globalização no Brasil, na América Latina e no Mundo.
     Quando o mundo estava pautado pelo pensamento único da globalização o professor Milton Santos foi a voz discordante denunciando as perversidades do que chamou de globalitarismo, sistema econômico que provoca a concentração de riqueza entre os ricos e que distribui mais pobrezas para os desfavorecidos. O filme “Encontro com Milton Santos ou o Mundo Global Visto do Lado de Cá” apresenta a última entrevista do geógrafo Milton Santos, na qual ele traça um painel das desigualdades entre o norte rico e o mundo do sul saqueado, apresentando alternativas e um prognóstico otimista sobre o futuro da humanidade.
     Milton de Almeida Santos nasceu em Brotas de Macaúbas, no interior da Bahia, no dia três de maio de 1926, formou-se em Direito no ano de 1948, pela UFBA (Universidade Federal da Bahia), e foi professor em Ilhéus e Salvador. Em 1958, voltou da Universidade de Estrasburgo, na França, com o doutorado em Geografia.
     Milton foi preso e exilado pelo Golpe de 64. Entre os anos de 1964 e 1977, lecionou na França, Estados Unidos, Canadá, Peru, Venezuela e Tanzânia. Foi o único brasileiro a receber o Prêmio Vautrin Lud, considerado o Nobel de Geografia. Escreveu mais de 40 livros, entre eles “Por Uma Outra Globalização” (2000) e “Território e Sociedade no Século XXI” (2001) que alertavam para os perigos causados pelo processo de globalização nos países em desenvolvimento.
     Milton Santos, geógrafo e livre pensador, dizia que a maior coragem, nos dias atuais, é pensar, coragem que sempre teve. O documentário de Silvio Tendler não é uma cinebiografia, nem pretende ser, mas atingiu o objetivo principal de seu personagem: fazer pensar.
     “Creio que as condições da história atual permitem ver que outra realidade é possível. Essa outra realidade é boa para a maior parte da sociedade. Nesse sentido, a gente é otimista. A gente é pessimista quanto ao que está aí. Mas é otimista quanto ao que pode chegar”.
Direção: Silvio Tendler
Duração: 89 minutos
Ano: 2006
Áudio: Português
Tamanho: 733 MB

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

O legado dos EUA no Iraque, oito anos depois da invasão.

     Passaram-se oito anos e os Estados Unidos fecharam a porta do Iraque deixando um desastre atrás dela. Durante o conflito, morreram mais de 100 mil civis, 4.800 soldados da coalizão perderam a vida (4.500 dos EUA), junto com 20 mil soldados iraquianos. Para os iraquianos, o legado da invasão é morte, dezena de milhares de mutilados, insegurança, desemprego, falta de água potável e eletricidade. A democracia exportada com bombas ultramodernas não mudou o curso das coisas.
Eduardo Febbro
     Passaram-se oito anos. Como pedras impiedosas que semearam a morte. Como aquelas horrendas imagens que surgiam à beira das estradas no caminho em direção a Bagdá. Fumaça, destruição, cadáveres e silêncio. Parece ontem. O cruzamento de estradas assinalava duas direções: Basra ou Bagdá. Através da estrada até Bagdá, as sucessivas batalhas da ofensiva emergiam como cogumelos despedaçados: ônibus bombardeados, veículos calcinados, tanques arrebentados e crateras imensas cavadas pelos mísseis. Os tanques iraquianos dispostos em fila à beira da estrada pareciam latas de sardinha queimadas. Frente a eles, os tanques Abrams norte-americanos tinham o aspecto de mastodontes invencíveis. “Quando começamos a avançar por esse trajeto, os soldados iraquianos saíam dos tanques para nos pedir água e comida”, contava com lástima um oficial norte-americano.
     Os primeiros grandes subúrbios de casas baixas pareciam emergir de um pesadelo. As casas e as lojas tinham virado trincheiras e havia centenas de pessoas caminhando pelas ruas, levando colchões, cadeiras, roupas, televisões, máquinas de lavar roupa, velhas máquinas de costura. Bagdá, ao longe, estava envolta em uma espessa nuvem de fumaça escura. Os poços e as trincheiras de petróleo seguiam ardendo. Saddam Hussein havia mandado incendiá-los para impedir que os satélites norte-americanos obtivessem imagens precisas do estado de Bagdá. Depois, a cidade aparecia finalmente. Ferida e assustada.
     Em cima do capô de um automóvel que havia avançado sobre a calçada, um livro de capa azul exibia suas páginas milagrosamente intactas. Dentro do veículo, o corpo de um homem com o corpo tombado para a frente tinha a cabeça partida e parte do cérebro esparramado em cima do porta-luvas. Ninguém prestava atenção. A cem metros do automóvel, um grupo de homens tentava, em vão, derrubar uma imensa estátua de Saddam Hussein erguida no centro de uma rótula. Do outro lado, três mortos jaziam à margem da rua. Um grupo de cachorros sarnentos disputava a propriedade do corpo de um dos mortos: um menino de seis anos estava ali também, sem um sapato e sem a metade do rosto.
     Saddam Hussein havia desaparecido. O exército ocupante se instalava em tendas nos territórios de sua nova conquista, ocupava os palácios de quem tinha sido seu aliado, se apoderava das ruas da cidade transformada e restaurada pelo ditador com a ajuda dos arquitetos enviados pelo Ocidente nos anos em que Saddam era um sócio confiável e ninguém se importava que ele afogasse seu povo em uma lagoa de sangue. O choque de civilizações acabava de se plasmar em sua versão mais violenta: a de um país milenar e reprimido, a de uma potência ocidental que havia enviado do céu uma chuva de democracia comprimida em cachos de bombas.
     Há lugares cujo nome e os símbolos que evoca sobrevivem aos estragos do tempo e das guerras. Bagdá tinha esse dom. Horrível e mágica. Histórica e contemporânea. Ameaçadora e hospitaleira. As Mil e uma Noites, uma grande livro onde, a cada virada de página, havia muitos mortos. O soldado Higins tinha visto inúmeras fotos de Bagdá antes da invasão, mas nunca havia imaginado a cidade real que encontrou quando sua unidade entrou na capital depois do que qualificava como “um combate épico” contra um inimigo “inferior, mas disposto a tudo”. Higins dizia que, até sua chegada a Bagdá, não havia conhecido a morte e tampouco imaginado como seria. Agora já tinha se acostumado ela, mas o primeiro morto seguia fazendo companhia a ele em sua memória. “A primeira vez que matei um homem foi à noite. Fiquei com uma sensação estranha, irreal. Não posso esquecer.
     Minha unidade encontrava-se na periferia de Bagdá. Fazíamos parte de uma patrulha avançada que estava por penetrar na capital desde o sul. Tínhamos recebido a ordem de consolidar a zona e seguir adiante. Seguimos as instruções e no início da madrugada começaram a nos atacar. Choviam tiros de metralhadoras e bazucas. Como não se via nada usamos os fuzis com visão noturna. O primeiro homem que apareceu na mira avançava por uma rua lateral, ocultando-se entre as portas. Era um alvo fácil. Deixei que avançasse. Apontei e disparei. Ele cai no chão e voltou a se levantar, cambaleante. Disparei mais duas vezes. Não posso dizer que nesse momento senti que o tinha matado. Com as miras de visão noturna tudo é visto de um modo distinto, como se fosse um jogo informático. A realidade é mais lenta e as coisas têm a forma de silhueta”.
     “Sei que está por aí, Saddam é eterno. Um império não pode com ele. Saddam vive até no silêncio”, dizia o empregado de um hotel que havia desaparecido em um incêndio. A única coisa que estava ali, pulsando no meio da fumaça, era o futuro. O futuro já estava escrito nas múltiplas sequências da queda de Bagdá na indolência e ignorância dos ocupantes. Essa ignorância brutal era a matéria prima da ação de Paul Bremer, o ineficiente e teimoso responsável pela CPA, a Autoridade Provisória da Coalizão encarregada de administrar o Iraque com estatuto de autoridade governamental.
     A guerra começou em 19 de março de 2003. Cerca de três semanas mais tarde, Bagdá caiu nas mãos da coalizão. No dia 1° de maio de 2003, o presidente George W. Bush deu por encerrada essa fase com a expressão triunfalista “missão cumprida”. No dia 6 de maio, Bush nomeou Paul Bremer. O “vice-rei” Bremer chegou a Bagdá e abriu a caixa de Pandora com um projeto político, econômico e administrativo delirante: converter o Iraque em uma representação dos Estados Unidos no Oriente Médio : liberal, democrática, permissiva, um centro de negócios ao melhor estilo dos falcões da Casa Branca.
     Ele não tinha a menor ideia do chão em que estava pisando. Sua primeira decisão consistiu em decretar a “desbaasificação” da sociedade iraquiana. Bremer pretendia sanear o sistema político com uma ordem inaplicável: fazer desaparecer o partido Baas e seus representantes em uma sociedade onde, para conseguir trabalho ou ser membro da administração pública, era obrigatório aderir ao Baas. Paul Bremer decretou a demissão de milhares de empregados e executivos da administração pública, dos organismos encarregados do petróleo, dos bancos, das universidades. Onze dias depois de ter assumido suas funções, Bremer assinou outro decreto enlouquecido: dissolveu o exército, a aviação, a marinha, o Ministério da Defesa, os serviços de inteligência. Seu frenesi ignorante chegou ao ponto de, em um país que saía de um prolongado embargo internacional, que estava em guerra, onde os hospitais estavam destruídos e faltava até algodão, lançar uma campanha contra o tabagismo e elaborar um projeto para distribuir rações alimentares com cartões de crédito.
     Passaram-se oito anos e os Estados Unidos fecharam a porta do Iraque deixando um desastre atrás dela. Durante o conflito, morreram mais de 100 mil civis, 4.800 soldados da coalizão perderam a vida (4.500 dos EUA), junto com 20 mil soldados iraquianos. “Depois de todo o sangue derramado, o objetivo de que o Iraque governe a si mesmo e seja capaz de garantir a segurança se cumpriu”, disse o secretário de Defesa estadunidense, Leon Panetta. O legado da invasão é outro: morte, dezenas de milhares de mutilados, insegurança, desemprego, falta de água potável e eletricidade. A democracia exportada com bombas ultramodernas não mudou o curso das coisas. A queda do déspota permitiu que os xiitas, majoritários no país e reprimidos até a barbárie por Saddam Hussein, tomassem as rédeas do poder sem que isso implicasse unidade ou estabilidade. O Iraque segue sendo um país em carne viva onde as feridas da ocupação não se fecharam.
     Passaram-se oito anos e o espelho de ontem está intacto, a voz de Fatima ainda ressoa naquela cidade em chamas. As lágrimas brotavam de seus olhos e, ainda assim, era capaz de sorrir e chorar ao mesmo tempo. Um sorriso de anjo, de criança, o sorriso da desnudez de um despossuído. Fatima observava os militares norte-americanos com um incessante sinal de pergunta. Eles a tomavam por louca. Quando passava diante dos soldados, a mulher os saudava e perguntava: “por quê?” Às vezes, davam-lhe comida, água e um pouco de dinheiro. Fátima aceitava, mais para se aproximar daqueles que tinham destroçado sua realidade do que por fome.
     Ninguém entendia sua pergunta. Por trás de seu sorriso tenro e luminoso, a tristeza marcava seus traços. Fátima estava vencida. Enquanto contemplava as ruínas do que uma vez foi sua casa, a mulher voltava a perguntar “por quê?”. Quando falava, uma careta infantil e piedosa se desenhava como um relâmpago.
     Fátima tinha perdido tudo. Dias após dia, com um empenho obstinado, a mulher escavava os escombros do edifício familiar destruído por uma bomba, buscando os restos de seus pertences passados. Seu filho menor a acompanhava sempre. Ia de um lado a outro de Bagdá apegado a ela como um animal indefeso. Fátima revolvia as entranhas de pedras destroçadas e retirava uma frigideira, um retrato intacto, um cachecol, um par de sapatos, alguma cadeira desconjuntada pela explosão, pedaços de recordações e bens devastados. O living, a sala de estar, a cozinha, o quarto, os espaços de sua intimidade estavam soterrados por toneladas de pedra e poeira.
     Fátima mostrava o que havia sobrado de sua casa : um monte de ferro e cimento sobre o qual se superpunha seu eterno sorriso. Ela também tinha no olhar essa marca feita de solidão, de luz, de incompreensão, de pura intempérie: a marca da injustiça. A mulher dizia que, talvez, o futuro de seu filho não seria parecido com o seu, que talvez ele conheceria a liberdade, um trabalho decente e a democracia. Fátima se projetava no filho que restou porque seu presente era um lugar inabitável. Era escombros e a gaveta de uma cômoda miraculosamente intacta de onde tirava, assombrada e agradecida, duas fotos de seu marido e de sua filha morta, esmagada com seu pai nas ruínas, um par de meias e uma caixa de costura.

(Eduardo Febbro - Correspondente da Carta Maior em Paris - Tradução: Katarina Peixoto)
SAIBA MAIS:
DOCUMENTÁRIOS
Sem Fim à Vista
     Como não é difícil encontrar pessoas desfavoráveis a Guerra do Iraque, que fizeram inúmeros documentários contra a batalha, o americano Charles Fergunson decidiu fazer um filme contando o lado daqueles que apoiaram a decisão de Bush desde o começo, analisando o que aconteceu para que a disputa ficasse Sem Fim à Vista. O cineasta tenta entender em que pontos o governo americano errou para que a guerra se tornasse a segunda mais cara da história, perdendo apenas para a Segunda Guerra Mundial.
     Fergunson fala com soldados que combateram no Iraque, com membros do governo Bush e analistas, todos eles pessoas que aceitaram voluntariamente participar daquele momento histórico com a certeza de que a invasão seria a melhor coisa a se fazer. Cada um conta o que viu e o que sentiu no decorrer dos anos, apontando os inúmeros erros cometidos principalmente por Donald Rumsfeld e Paul Bremer, além de outros membros do governo, para que a situação acabasse saindo do controle.
     O diretor analisa cronologicamente a guerra até 2007, quando ela já havia custado quase US$ 2 trilhões, além de um grande número de vidas, entre americanos e iraquianos, com destaque para o brasileiro Sérgio Vieira de Melo, que representava uma esperança de solucionar o problema. Mesmo ainda acreditando que a guerra deveria ter acontecido, os entrevistados contam o que sabem para que o espectador entenda o ódio que os iraquianos sentem pelos americanos e perceba que é difícil achar uma solução para o problema.
     Descontente com o governo de George W. Bush, o milionário Charles Fergunson decidiu bancar de seu próprio bolso um documentário que explicasse a Guerra do Iraque de uma forma que nenhum outro tinha feito. Desta forma ele decidiu procurar não aqueles que sempre se mostraram desfavoráveis, mas aqueles que apoiaram e ainda apóiam a medida. O filme, primeiro de Fergunson, foi um dos indicados ao prêmio de melhor documentário do Oscar 2008.
Direção: Charles Fergunson
Duração: 102 minutos
Ano: 2007
Áudio: Inglês - Legendado

 Guerra Feita Fácil – Como presidentes e peritos nos enrolam para a morte
     Narrado por Sean Penn, o filme mostra como a imprensa americana e os Governos estadunidense praticaram a mentira, e, as mensagens belicistas para justificar uma guerra após a outra durante os últimos 50 anos.
     Distorções nos noticiários, mensagens pró-guerra levaram os EUA a ser o país com mais poder bélico sozinho que todas as outras noções juntas, consolidando seu status de Império. Imagens reveladoras que mostram a maneira sórdida que vários presidentes enganaram seu povo através da mídia corporativa.
Direção: Loretta Alper & Jeremy Earp
Duração: 73 min.
Ano: 2007
Áudio: Inglês/Legendado


 FILMES
Zona Verde
     O filme é inspirado no livro de não ficção “A vida imperial na cidade Esmeralda”, do repórter Rajiv Chandrasekaran, que é um relato sobre os indicados para administrar o Iraque, pelo governo Bush, após a invasão. Matt Damon se inspirou em um oficial do exército americano, Richard Gonzalez, que chefiou uma equipe encarregada de procurar armas de destruição em massa (ADM) durante a invasão.
     Durante a ocupação liderada pelos EUA em Bagdá, em 2003, o primeiro subtenente Roy Miller (Damon) e sua equipe foram enviados para encontrar armas de destruição em massa, que acredita-se estarem armazenadas no deserto iraquiano.  Mas, indo de um lugar cheio de armadilhas e trincheiras a outro, os homens que buscam agentes químicos mortais esbarram em uma farsa que subverte o propósito da missão. Agora Miller precisa vasculhar os serviços secreto e de inteligência escondidos em terra estrangeira para encontrar respostas que ora acabarão com um regime nocivo ora propagarão uma guerra em uma região instável. Nesse momento delicado e nesse lugar inflamável, ele descobre que a arma mais ilusória de todas é a verdade.
Direção: Paul Greengrass
Duração: 105 min.
Ano: 2010
Áudio: Português

Jogo de Poder
     O filme foca em duas histórias (Baseado nas memórias de Valerie Plame). Uma é o casamento entre Joe Wilson (Sean Penn) e Valerie Plame (Naomi Watts). Ele é um ex-embaixador do governo. Ela é uma agente secreta trabalhando para a CIA. Wilson escreve um relatório para a agência (onde ela trabalha), onde atesta ser impossível Niger ter importado urânio para o Iraque para poderem construir uma bomba nuclear. Mas como o governo fazia questão da invasão, seu relatório foi forjado para parecer que ele falou o contrário e a invasão aconteceu. Para expor a fraude, Wilson escreve um artigo para o jornal, New York Times, dizendo que o relatório apresentado é uma mentira. Em contrapartida, o governo vaza a informação que sua esposa é uma agente. O que transforma a vida dos dois em um inferno.
     A outra história é sobre os bastidores do que aconteceu para que chegassem a decisão de invadir o Iraque. Não apenas por causa do relatório de Wilson, mas também por causa de vários outros fatos apresentado, fica claro que a CIA sabia que o Iraque não tinha armas de destruição em massa. Além disso, a Casa Branca também sabia e tudo foi ignorado para justificar a invasão.
     O que mais impressiona é a coragem com que o filme foi feito. Não há nomes fictícios. Plame, Wilson e vários outros agentes aparecem descritos com seus nomes reais. Nenhum deles deve ter ficado particularmente feliz de ser retratado como um falso ou mesmo traidor, mas está tudo lá. Inclusive há uma cena em que o próprio Cheney (vice-presidente de George W. Bush) aparece pedindo para falsificar documentos.
Direção: Doug Liman
Duração: 107 min.
Ano: 2010
Áudio: Português