“E agora que vocês viram no que a coisa deu, jamais esqueçam como foi que tudo começou” (Bertolt Brecht)

sábado, 28 de abril de 2012

Outros abris

Uma revolta separatista digna de primeiro de abril, a fundação da Casa de Rui Barbosa e até o fim de uma tradição beijoqueira foram alguns dos acontecimentos que marcaram este mês em tempos passados.

Ficção ou realidade?
     “Salve D. João IV de Portugal!” Em 1640, quando a notícia da Restauração da monarquia portuguesa na Europa chegou à Bahia, este grito foi repetido muitas vezes. Após 60 anos de submissão à Coroa espanhola, finalmente os lusitanos retomavam o controle de suas terras. A novidade, embora comemorada em Salvador, capital de suas colônias americanas, não foi bem recebida em todos os lugares.
     A vila de São Paulo teve uma reação, no mínimo, peculiar. Para alguns espanhóis habitantes do local, a conexão com a Espanha precisava ser restabelecida. Solução: incitar os colonos à separação de Portugal coroando um rei paulista. No dia 1º de abril de 1641, Amador Bueno foi aclamado pela população, mas recusou o trono e ainda convenceu os revoltosos a desistir do projeto separatista.
     Ninguém sabe ao certo se essa história aconteceu de fato – qualquer semelhança com as brincadeiras do “1º de abril” é mera coincidência. Talvez seu enredo tenha um pouco de invenção, mas o contexto não é tão fictício assim: desde o início daquele século, o distanciamento do litoral fez com que os paulistas conquistassem uma grande autonomia em relação à metrópole. A volta da monarquia portuguesa poderia significar uma ameaça a essa liberdade. Assim, um rei paulista não seria uma má ideia. 

Os reis do beijo
     Uma grande fila se estendia pelos corredores do Palácio de São Cristóvão. Todos os tipos de pessoas aguardavam com ansiedade. Uma por uma, ajoelhadas e inclinadas, elas manifestavam seu respeito e submissão à Coroa beijando a mão do monarca D. João VI. Esse contato pessoal era sinal de obediência, mas também a hora de pedir alguns favores.
     O beija-mão chegou ao Brasil com a Corte portuguesa em 1808. Logo o rei tratou de torná-lo popular. Era uma boa maneira de fazer seus súditos se sentirem pertencentes ao reino. Porém, nos anos da Regência (1831-1840) – sem um imperador no trono –, o rito caiu em desuso, do mesmo modo que outras práticas ligadas à tradição monárquica, como os bailes e jantares reais.
     O ritual só foi retomado quando D. Pedro II estava prestes a atingir a maioridade. O objetivo era restabelecer a vida de corte, importante para manter os laços sociais e as lealdades. Embora tivesse funcionado com certa regularidade por um tempo, a tradição não durou muito. Em 27 de abril de 1872, o imperador mandou divulgar o decreto que abolia de vez a prática, oficializando o fim de um símbolo já decadente.

Casa de histórias
     Uma biblioteca com 37.000 volumes de caráter enciclopédico, 1.400 peças de mobiliário, objetos e relíquias, 60.000 itens do acervo pessoal e uma bela casa. Pertencentes ao recém-falecido Rui Barbosa (1849-1923), todos esses elementos, somados ao nome do notável político, forneciam o que o governo federal precisava para inaugurar a primeira casa-museu do Brasil.
     Com sua morte, em 1923, o país viu a necessidade de preservar o legado daquele que havia sido um símbolo da intelectualidade brasileira, atuando como jurista, escritor, jornalista e diplomata. O nome do patrono serviu como uma luva para fazer deslanchar um velho projeto da República: uma instituição que tivesse como objetivo maior valorizar o conhecimento e a memória do país.
     Em 4 de abril de 1927 foi criado o Museu Rui Barbosa, que um ano depois ganharia do então presidente Washington Luís o nome de Casa de Rui Barbosa, título conveniente, diante do esforço para se reconstituir a moradia tal como havia sido. Muitos anos depois, a instituição continua ativa, preservando o motivo pelo qual foi criada.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Lembranças de Sarajevo

Vinte anos após o início da Guerra da Bósnia, artigo lembra o genocídio nas terras da antiga Iugoslávia e ressalta a inércia da comunidade internacional para com o conflito na época.

     “Bem vindos ao inferno”, saudavam os locais em pichações nos muros da cidade, quando os primeiros jornalistas chegaram em 1992 à Sarajevo. A capital da República da Bósnia e Herzegovina, cercada pelo exército iugoslavo, se tornou o foco da guerra que durou mais de três anos culminando com a fragmentação da Iugoslávia e o saldo aproximado de 100 mil mortos.
     O conflito foi o primeiro golpe no otimismo histérico do fim da Guerra Fria. A Alemanha se unificava enquanto a sombra da União Soviética desaparecia junto com as ameaças do fim do mundo num holocausto nuclear levantando promessas de que, finalmente, o século sangrento se encerraria numa paz inédita. Mas, ao contrário dos países da Europa Central, como Polônia e Hungria, a Iugoslávia não celebrou o fim do comunismo com fogos de artifício, revoluções e promessas de um mundo melhor.
     Ninguém lembra, mas os nazistas não foram os últimos a construírem campos de concentração na Europa. Não foram os últimos a cometer genocídio, a produzirem uma máquina de guerra subsidiada pelo silencio da comunidade internacional. Na década de 90, quando se menos esperava, Sérvios construíram centros, como Omarska,que lembravam Auschwitz e produziram massacres e episódios lamentáveis como Srebrenica, em 1995. Tudo isso contando com a cumplicidade silenciosa de uma comunidade internacional inerte.

Sarajevo sitiada
     Quando Eslovênia e Croácia declararam independência da Iugoslávia, em 1991, o estado multiétnico da Bósnia e Herzegovina passou a ser disputado por Sérvios e Croatas. Fragmentado num quebra cabeça confuso de religiões, etnias e nacionalidades, os muçulmanos bósnios declararam independência. Mesmo tendo sido reconhecida quase automaticamente tanto pela União Europeia, quanto pelos Estados Unidos, a Bósnia se tornou tudo, menos autônoma. As demandas de seus vizinhos condenaram o estado a uma guerra de mais de três anos e seu povo a uma perseguição sanguinária. Sua capital, Sarajevo foi sitiada com barricadas e atiradores de elite próximos ao parlamento. As frágeis forças bósnias de defesa não tinham como dar conta do Exército Popular Iugoslavo, comandado pela Sérvia.
   O cerco de Sarajevo é o mais longo registrado em uma guerra moderna. Durou de 4 de Abril de 1992 até 29 de Fevereiro de 1996. Em estado de guerra, os atiradores na cidade alvejavam crianças, animais domésticos, homens e mulheres que passavam nas ruas para procurar pão ou leite. Ficaram famosas as imagens de cidadãos ordinários correndo entre um prédio e outro em busca de abrigo. No hotel Holiday Inn, construído quando a cidade sediou os jogos de inverno de 1984, os jornalistas de plantão assistiam boquiabertos à escalada de uma monstruosidade que se acreditava perdida no continente.
     Com a capital cercada, os Sérvios avançavam sobre território Bósnio dispersando a população local que agora se concentrava em três enclaves principais, declarados área de proteção da ONU, em abril de 1993. Não adiantou muito. Em Srebrenica, em julho de 1995, as forças do general Mladic tomaram o quartel das Nações Unidas e em três dias mataram mais de 8 mil homens. Foi o maior massacre desde a Segunda Guerra Mundial. Tudo isso sob os olhos atentos de uma comunidade internacional muito bem intencionada e disciplinadamente calada.

Silêncio em congresso sobre direitos humanos
     Para não dizer que não faziam nada, em 1993 foi organizado um congresso sobre direitos humanos em Viena. Contando com a participação de mais de 170 países, o evento conseguiu consagrar uma carta de prerrogativas e determinações extremamente valiosas para o avanço dos direitos humanos. Teoricamente. Na prática, os participantes eram proibidos de mencionar violações e massacres que ocorriam a menos de 500 km da capital austríaca.
     A maravilhosa sensação de que o fim da Guerra Fria em 1991 seria consagrado por uma paz universal ungida pelo respeito dos direitos humanos estava sendo contrariada pela catarse nos Balcãs. O congresso em Viena procurou amenizar as feridas dessa síndrome de orgulho coletivo, mas não funcionou. Somente em 1995, quando a OTAN entrou em ação, foi possível deter as forças sérvias, que até então agiam indiferentes às opiniões de franceses, ingleses, alemães, americanos.... Até lá, mais de 17 mil haviam morrido só na capital Bósnia. Mais tarde, no Kosovo, a vigorosa ação internacional seria testada novamente... Com resultados semelhantes.
Indiferença internacional
     Samantha Power, que na época cobria o conflito para o Washington Post, voltou para os Estados Unidos indignada com a absoluta falta de apoio internacional para impedir massacres que eram tão trágicos quanto previsíveis. Junto com os demais jornalistas em Sarajevo, não compreendia como era possível o exército iugoslavo cometer aquelas atrocidades às vistas de tantos países. No fim, passou a questionar o papel dos Estados Unidos como líder moral depois do fiasco nos Balcãs. Para sua surpresa, pesquisando descobriu que seus conterrâneos nunca tinham feito tanto para impedir um genocídio como no caso da Iugoslávia. Samantha produziu uma longa pesquisa sobre o abismo entre a retórica e a ação dos Estados Unidos. Em 2003 escreveu Genocídio, vencedor do prêmio Pulitzer daquele ano.  
     Para muitos, a experiência de cobrir o cerco de Sarajevo e testemunhar o genocídio em solo europeu às portas do século XXI se transformou num compromisso com a memória do conflito. Jornalistas como Misha Glenny e Alec Russell saíram do posto de meros observadores para especialistas na Guerra. Houve também aqueles que pouco queriam lembrar.
      Alguns anos atrás, um amigo jornalista resolveu me contar sobre seus dias em Sarajevo durante a guerra. Sempre um grande contador de histórias bonachão, fechou o rosto e me disse: “Sei que você se interessa por isso. Mas você é meu amigo. Não sei, não consigo falar o quão nojenta é essa minha profissão, não imagina o tipo de escolha que um jornalista é obrigado a fazer nessas condições”. Aos poucos, lembrou de alguns amigos, em especial de um fotógrafo italiano que se especializou em tirar fotos de crianças prestes a serem alvejadas por atiradores. Em vez de avisar a criança, já que sabia da posição do atirador, ele preferia ficar em silêncio pela foto e dizia: eu salvo uma criança com um grito, e milhares com uma foto.

Vinte anos depois...
     Contrariando o bom senso, o conflito completa 20 anos essa semana (4/4/2012) sendo melancolicamente ignorado pela imprensa internacional, que parece já ter extraído do evento tudo que era possível para vender jornais. Quem fizer uma busca hoje, encontrará artigos que articulam lições de moral comparando a Guerra da Bósnia com  o atual conflito na Síria. Como se tudo estivesse resolvido na região, ou como se tudo que extraíssemos de calamidades absurdas fosse lições morais utilizáveis para experiências análogas. 
     Hoje, Sarajevo se reinventou como uma espécie de capital cultural na região. Abriga eventos relevantes, como seu festival anual de cinema. Ao renascer das cinzas (literalmente), resiste ao esquecimento, mantendo suas próprias ruínas e cicatrizes às vistas.

Saiba Mais – Filmes
Julgamentos de Guerra
Esta produção conta a história real de uma mulher corajosa que enfrentou várias pessoas de seu meio para levar à justiça uma região repleta de conflitos. Uma canadense é nomeada em 1996, Louise Arbour, para o Tribunal de Crimes de Guerra, em Haia, na Holanda. Ela investiga a guerra dos Bálcãs e de Kosovo, mas enfrenta a oposição de vários de seus próprios companheiros e de militares responsáveis por garantir a paz na região. Corajosamente, ela visita as regiões de conflito e faz uma profunda investigação sobre toda a situação, deparando-se com uma cruel realidade de extermínio que já dura há três anos. É quando decide indiciar o presidente iugoslavo Slobodan Milosevic por crimes contra a humanidade, para assim tentar colocar um fim numa guerra civil insana e sangrenta.
Direção: Charles Binamé          
 Ano2005
 Áudio: Português
Duração: 102 min                     

A Informante
Baseado em uma história real, e, em um dos maiores escândalos da história envolvendo a ONU, Kathy Bolkovac (Rachel Weisz) é uma policial esforçada que aceita trabalhar para as Nações Unidas como pacificadora na Bósnia, que passa por uma reconstrução pós-guerra. Seus desejos de ajudar na reconstrução de um país devastado são destruídos quando ela fica face a face com a dura realidade: uma vasta rede de corrupção e tráfico sexual que é encoberta pela ONU.
“A Informante” é uma história verídica acerca do revoltante envolvimento da polícia local, da IPTF (International Police Task Force), de funcionários da Organização das Nações Unidas e diplomatas na conspiração para a corrupção, tráfico e prostituição de jovens Sérvias escravizadas e abusadas sexualmente ao chegarem à Bósnia.
Direção: Larysa Kondracki          
Ano2010
 Áudio: Inglês/legendado
Duração: 112 min                       

 A Caçada
Richard Gere é Simon, jornalista de guerra que, ao lado do cameraman Duck (Terrence Howard, “Homem de Ferro”), realizou grandes coberturas. Após testemunhar um massacre na Bósnia, Simon briga com sua emissora e desaparece. Anos mais tarde, Duck retorna à Bósnia e é procurado por Simon. Ele tem pistas sobre a localização do Raposa (Radovan Karadzic líder sérvio, responsável por um massacre na Bósnia), o pior criminoso da guerra local, que tem uma recompensa de US$5 milhões por sua captura. Agindo contra ordens da ONU e confundidos com agentes da CIA, eles partem em sua busca. Baseado em uma história real.
Direção: Richard Shepard
Ano: 2007
Áudio: Português
Duração: 103minutos

terça-feira, 24 de abril de 2012

Aborto: o grande tabu no Brasil


“Anos de pesquisas permitem-me dizer: criminalização perdura porque atinge mulheres pobres, aquelas que não contam, nem são vidas a preservar...”

Heloisa Buarque de Almeida*

     Joana, que se casara grávida aos 15 anos e tinha dois filhos, me contou, em segredo e sussurrando, sobre a relação violenta e tumultuada que vivia com seu marido, e como havia, certa vez, “tomado um remédio para a menstruação descer”, pois não podia imaginar ter mais um filho naquelas condições. Negava que tinha interrompido uma gravidez, afirmando que era contra o aborto. Laura me disse sem meias palavras que tinha “tirado” quando engravidou pela terceira vez e o marido estava internado numa clínica para deixar as drogas. Ela cuidava sozinha de seus dois filhos pequenos, e não tinha com quem mais contar, não tinha condições de ter outro filho, não naquela hora. Tomou um “remédio” e posteriormente foi internada com uma terrível hemorragia, mas tudo acabou bem.
     Noutro contexto, Lúcia e Regina contaram que engravidaram muito jovens, mas ainda não era hora de ter filhos, uma viveu isso quando ainda estava no colégio e se dizia “contra o aborto”, justificando o seu caso pela precocidade da gravidez (com o primeiro namorado). Regina afirmava que queria terminar a faculdade, ter uma vida profissional, escolher melhor com quem se casar e é totalmente favorável à legalização do aborto. Lúcia e Regina abortaram em uma clínica em São Paulo, não sofreram nenhuma complicação, ainda que uma delas se queixasse pela forma com que foi tratada pelo médico. Todas essas histórias me foram contadas como segredos e todas são mulheres que podemos definir como de classe média, embora as duas últimas tenham mais posses que as primeiras. Os nomes são fictícios. Mas há outras histórias muito mais dramáticas de mulheres que perderam ou a saúde, ou a vida tentando abortar com agulhas de tricô, “curetagens” mal feitas, “remédios” que não deram certo e que resultaram crianças com terríveis malformações.
     Apesar da ilegalidade, há um número expressivo de abortos voluntários no Brasil por ano, feitos de modo clandestino – mas nem sempre precário. Ainda assim, o tema permanece um tabu na sociedade brasileira, ainda que o debate esteja se ampliando novamente. A ilegalidade leva inúmeras pessoas (ironicamente, algumas das quais afirmam publicamente serem contra o aborto) a recorrerem a métodos inseguros de interrupção da gravidez, o que gera números elevados de internações no SUS. Segundo dados oficiais, cerca de 244 mil internações no SUS, no ano de 2004, referiam-se a curetagem pós-aborto, apontando para uma estimativa de um milhão de abortos anuais.
     Laura foi uma dessas internações, mas há muitas mais que decorrem de métodos abortivos muito violentos e brutais, gerando mortes maternas e sequelas. Tais internações poderiam ser evitadas, tendo se tornado, portanto, uma questão evidente de saúde pública. Há mais abortos e mais complicações nos locais e nas camadas sociais em que o acesso aos métodos de contracepção e o atendimento médico são mais precários, com uma grande diversidade regional e de classe.
     A morte materna também é bem mais alta entre mulheres negras. Trata-se, portanto, também de uma questão de justiça social, já que para camadas médias e altas o aborto seguro é acessível, mas as mulheres de camadas populares em todo o país (especialmente, reitero, onde há menos acesso a meios contraceptivos e a atendimento médico) estão sujeitas a um verdadeiro massacre. Para os pesquisadores, a ilegalidade torna o tema difícil de pesquisar e de medir. O aborto voluntário é um crime e um tabu – certamente o veremos ser tratado novamente como tabu quando chegamos perto das eleições.
     Apesar de as pessoas se declararem explicita e majoritariamente “contra o aborto” nas pesquisas de opinião pública, muitas das que recorreram a essa prática (mulheres e homens cujas parceiras sexuais o fizeram) justificam suas experiências por uma “circunstância especial” e muitas vezes dramática. “Em princípio” são contrários à prática. Embora vejam sua decisão acoplada a essa circunstância particular, o que os dados de inúmeras pesquisas nos mostram é que essas “circunstâncias” são muito comuns, e mais regularmente oscilam entre dois tipos reiterados. Ainda que contem em segredo tais relatos a uma pesquisadora, amiga, conhecida, muitas vezes, no entanto não conseguem declarar-se sequer a favor da descriminalização.
     Especialmente, em público, em voz alta, o tema ainda é tabu. Menciono aqui informações que tive também em etnografias, onde o fato da pesquisadora viver certo tempo com as pessoas que estuda leva a uma maior intimidade – vários relatos de aborto chegaram aos meus ouvidos, contados como “segredos” pessoais, em pesquisas antropológicas que fiz e faço sobre família, gênero, sexualidade.
     Ainda que educação e prevenção (o crescente acesso a informação e métodos mais seguros de contracepção) sejam fundamentais (a gravidez “não planejada” é mais frequente entre mulheres de baixa escolaridade), não há nenhum método 100% seguro. Mesmo mulheres muito bem informadas e com acesso a medicamentos engravidam sem o desejar. Os dados de pesquisa recente da UnB/Anis [DINIZ, Débora e MEDEIROS, Marcelo: “Aborto no Brasil: uma pesquisa domiciliar com técnica de urna” Ciência & Saúde Coletiva, 15 (supl. 1), 959-966, 2010], indicam que entre mulheres com até o 4º ano do ensino fundamental cerca de 23% abortaram, mas com ensino médio completo a taxa é de 12% – portanto, menor, mas não nula. Por outro lado, os dados da pesquisa GRAVAD revelam que a própria gravidez adolescente é muito mais comum nas camadas de baixa renda. Porém, quando engravidam sem planejar, as jovens com mais anos de estudo e situação social de classe média ou alta optam mais pelo aborto do que as jovens de baixa renda, para as quais muitas vezes a gravidez adolescente não é vista como problema e nem como impeditivo de outros planos de vida, tais como educação e profissão.
     É possível vislumbrar, no entanto, alguns padrões: grande parte desses abortos não são apenas as imaginadas jovenzinhas inexperientes e “levadas” em sua vida sexual que engravidam cedo e “tiram”. Se parte das moças de camadas populares assumem esses filhos precoces, nas camadas médias e altas o aborto voluntário parece ser mais comum, num modelo de decisão de aborto em que a jovem calcula seus planos de educação superior, seus desejos de carreira profissional ou de evitar uma união repentina. Mulheres de camadas médias e altas fazem abortos razoavelmente seguros em clínicas e consultórios, ou recorrem ao uso do Cytotec.
     Segundo a pesquisa da UnB/Anis calcula-se que “ao final da vida reprodutiva, mais de uma em cada cinco mulheres já fez aborto”, a maior parte deles no período entre 18 e 29 anos.
     Essa mesma pesquisa mostra, portanto, uma outra faixa etária de abortos - nem todas as mulheres que abortaram o fizeram no início de sua vida sexual e reprodutiva. Essas e outras pesquisas, qualitativas e quantitativas, apontam para o fato de que há uma proporção de abortos feita noutro(s) momento(s) da vida, ou seja, quando as mulheres já têm filhos para criar.
     São mulheres acima dos 25 anos. Em alguns casos, inclusive, provocaram aborto de modo “escondido” de seus parceiros (como Laura e Joana, que citei acima), como uma dura e dolorosa decisão pessoal considerada a única possível. Às vezes, uma decisão desesperada, diante de uniões conjugais violentas e/ou abusivas, ou quando elas já eram as responsáveis pelo sustento de outros filhos e parentes, ou tinham parceiros ausentes e incapazes de ajudá-las por algum motivo, ou mesmo quando se viam abandonadas. Aqui, a justificativa para o aborto é também uma decisão muito difícil, mas necessária e mesmo considerada racional – nesta casa, não “cabe” mais uma criança.
     Seja qual for o caso, o que está em jogo é o direito destas mulheres, jovens ou nem tão jovens assim, de decidir se querem ou não interromper a gravidez. É uma decisão difícil e delicada, mesmo para quem tem acesso ao aborto seguro. Mas é urgente levar em conta que elas – as mulheres que engravidam “sem planejar” (como se só competisse a elas evitar a gravidez) – também são uma vida, uma vida completa e vivendo na labuta cotidiana, tentando estudar, trabalhar, criar seus filhos, com vidas mais ou menos precárias, mas com vidas reais, já sendo vividas e muitas delas cuidando de outras vidas (filhos, idosos, doentes).
     Sim, e aqui temos a polêmica sobre quando começa o que chamamos de uma vida humana. Não simplesmente uma vida, pois as plantas e animais também são vivos, mas aquilo que vemos como “vida de um ser humano”. Os contrários ao aborto consideram o momento da concepção – para eles, portanto, a pílula do dia seguinte ou o DIU são abortivos. Aqueles que defendem a legalização da prática, no entanto, separam a vida do embrião (12 semanas) da vida daquilo que a medicina chama de “feto”, ou seja, um ser humano em formação após o início da constituição do sistema nervoso central e do cérebro.
     Porém, há outra hierarquia em jogo. Por que imaginar que uma vida em estágio inicial é “mais vida” – superior à da mulher que se descobre, de repente, com uma vida em formação dentro de seu corpo, totalmente dependente de seu corpo e de sua vida? Por que alguns países a consideram como cidadã plena e outros não? Por que se defende que uma mulher tenha que levar a gestação até o fim e ter toda a preocupação que é criar um filho se ela não pode, não quer, não tem condições? E lembremos, as mulheres de classe média terão acesso a uma interrupção relativamente segura, mas e as mulheres pobres?
     Não contam? Não são “vidas” a se preservar, já que é entre elas que o aborto inseguro gera mais consequências graves de saúde pública, inclusive a morte? E os outros filhos que elas já têm para cuidar, não são também uma questão de “vida”? Me parece haver aqui uma grande preconceito social no Brasil – pobre não conta como “gente”, como vida humana?
    Toda opção pelo aborto é uma dura e triste decisão; não é, quase nunca, algo “comum” e feito sem pensar. Muitas vezes é feito no momento do desespero. E os dados apontam que quanto mais se amplia a rede de saúde pública e acesso a educação, há certamente menos abortos. É preciso ampliar ainda mais os bons serviços de saúde e educação públicas, mas é também urgente que se amplie o acesso ao aborto seguro, inclusive para garantir que essas mães possam criar os filhos que já têm vida.

*Heloisa Buarque de Almeida - professora no Departamento de Antropologia da USP e pesquisadora colaboradora do Pagu – Núcleo de Estudos de Gênero da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)

DOCUMENTÁRIOS:

O Aborto dos Outros                                                           
O Aborto dos Outros é um filme sobre a mulher que vive a experiência do aborto. Não é um filme sobre a bíblia, a filosofia, a metafísica. É um filme sobre a maternidade, afetividade, intolerância e solidão. E sobre nossa realidade matemática: no Brasil, 1 em cada 4 gestações é interrompida voluntariamente. São mais de 1 milhão de aborto por ano.
Apenas recentemente os hospitais do país começaram a cumprir uma lei que é de 1940: no Brasil o aborto é legalizado para casos de gestações resultantes de estupro ou em casos em que a mulher corre risco de vida.
Há uma terceira opção, eventualmente autorizada judicialmente, que são as gestações em que o feto possui uma má-formação grave e não sobrevive fora do útero da mãe.
As filmagens ocorreram em 4 hospitais públicos que possuem atendimento para casos previstos em lei, o “Programa de Aborto Legal”: Hospital Pérola Byington, Unifesp, Unicamp e Hospital do Jabaquara. Além dessas instituições, foram colhidos depoimentos de mulheres e profissionais de saúde em diferentes locais no Rio de Janeiro e em São Paulo.
Contudo, a maioria dos abortos acontece na clandestinidade, em casa, em clínicas, com uma mãe de anjo.
O mais importante a ser considerado é que a lei punitiva não impede que as mulheres realizem o aborto. Uma mulher que decide interromper sua gestação irá fazê-lo, na condição que lhe couber, com ou sem atendimento adequado. A única consequência da criminalização são os efeitos perversos para as mulheres, como o alto índice de mortalidade materna ou as graves sequelas de abortos malfeitos.
O filme mostra a experiência das mulheres que viveram o aborto e pretende inserir essas vivências em uma discussão que geralmente se dá a partir da posição da Igreja, da sociedade ou do Estado.
Direção: Carla Gallo
Ano: 2008
Áudio: Português
Duração: 73 minutos
Tamanho: 499 MB

Fim do Silêncio - um filme sobre o aborto inseguro 
Em Fevereiro de 2008, a Fiocruz, instituição pública ligada ao Ministério da Saúde, organizou um edital público para a realização de programas de curta e média-metragem, de ficção e documentário, cujo tema era saúde pública. FIM DO SILÊNCIO foi o projeto vencedor na categoria documentário de 52 minutos.
No documentário, pela primeira vez, mulheres, de três estados do país, de diferentes idades, religiões, classes sociais e profissões, falam para a câmera, sem esconder rostos nem identidades, como e porque fizeram aborto. Rio de Janeiro, São Paulo e Pernambuco estão nas duas regiões (Sudeste e Nordeste) que concentram maior número de abortos inseguros do país. O documentário confirma que o aborto inseguro é um dos mais graves problemas de saúde pública do nosso país, e ainda, demonstra que a criminalização do aborto não está impedindo milhares de mulheres de fazerem o aborto e a correrem risco de vida, submetendo-se a sequelas físicas e psicológicas. Informações importantes sobre o tema em cartelas sobre fundo negro pontuam todo o documentário.
Só foram incluídos depoimentos de mulheres que fizeram aborto há mais de 8 anos, pois o “crime” prescreve depois deste período.
Apenas 26% dos países do mundo ainda não descriminalizaram o aborto. Todos eles na América Latina, África e Ásia. O Brasil é um deles.
O aborto tem sido discutido sob o prisma religioso e moral, e a sociedade classifica as mulheres que abortam como assassinas e criminosas. Nunca se deu voz a elas para se entender as razões que as fazem optar pelo aborto. O documentário vai surpreender ao revelar que muitas delas fazem aborto por imposição dos maridos ou ainda, que a decisão é tomada em conjunto com os parceiros.
Direção: Thereza Jessouron
Ano: 2008
Áudio: Português
Duração: 52 minutos
Tamanho: 222 MB

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Para além de uma Educação Domesticadora: Um Diálogo com Noam Chomsky


''A educação é o ponto em que decidimos se amamos o nosso mundo o bastante para assumirmos a responsabilidade por ele e, com tal gesto, salvá-lo da ruína que seria inevitável não fosse a renovação e vinda dos novos e dos jovens. A educação é, também, onde decidimos se amamos nossas crianças o bastante para não expulsá-las de nosso mundo e abandoná-las a seus próprios recursos, e tampouco arrancar de suas mãos a oportunidade de empreender alguma coisa nova e imprevista para nós.”
(ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. São Paulo: Perspectiva, 1972.)


Para além de uma Educação Domesticadora: Um Diálogo com Noam Chomsky
Donaldo Macedo
University of Massachussets Boston, USA.
Excerto da Entrevista com NOAM CHOMSKY

     "Regressemos ao ponto inicial: as escolas evitam verdades importantes. É da responsabilidade intelectual dos professores – e de qualquer indivíduo honesto – procurar dizer a verdade. Isto não é, certamente, controverso. É um imperativo moral procurar e dizer a verdade, na medida das possibilidades, acerca de coisas relevantes, ao público certo. É uma perda de tempo dizer a verdade ao poder, no sentido literal das palavras, e o esforço de o fazer pode frequentemente ser uma forma de auto complacência. A meu ver, é uma perda de tempo, um empreendimento inútil dizer a verdade a pessoas como Henry Kissinger ou o Presidente do Conselho de Administração da AT&TNT3, ou outros que exerçam poder em instituições com políticas de coerção – a maioria deles já conhecem estas verdades. Gostaria de justificar o que acabei de dizer. Se e quando as pessoas que exercem o poder nas respectivas funções institucionais se dissociam do ambiente institucional e se tornam seres humanos, agentes morais, nessa altura podem juntar-se ao resto das pessoas. Mas não vale a pena dialogar com eles no seu papel de indivíduos detentores de poder. É um desperdício de tempo. Vale tanto a pena dizer a verdade ao poder quanto ao pior e mais criminoso dos tiranos, que também será um ser humano, independentemente de quão terríveis sejam as suas ações. Dizer a verdade ao poder não é uma vocação particularmente honrosa.
     Deve-se procurar um público que interesse. Para os professores, esse público são os estudantes. Estes não devem ser vistos como uma mera audiência, mas como fazendo parte de uma comunidade de interesse partilhado, na qual esperamos poder participar de um modo construtivo. Não devemos falar para, mas com. Isso é algo que já se tornou uma segunda natureza em qualquer bom professor, e também o deveria ser em qualquer escritor ou intelectual. Um bom professor sabe que a melhor maneira de ajudar os alunos a aprender é deixá-los descobrir a verdade por eles próprios. Os estudantes não aprendem por mera transferência de conhecimento através da memorização mecânica e posterior regurgitação. O verdadeiro conhecimento vem através da descoberta da verdade e não através da imposição de uma verdade oficial. Isso nunca conduz ao desenvolvimento do pensamento crítico e independente. Todos os professores têm a obrigação de ajudar os estudantes a descobrir a verdade e não suprimir informação e conhecimentos que possam ser embaraçosos para as pessoas ricas e poderosas que criam, concebem e fazem as políticas das escolas.
     Vejamos mais de perto o que significa ensinar a verdade e as pessoas distinguirem mentiras de verdades. Eu acho que não é preciso mais do que bom senso, o mesmo bom senso que nos permite adotar uma posição crítica perante os sistemas de propaganda das nações que consideramos nossas inimigas. Já sugeri antes que os eminentes intelectuais estadunidenses não seriam capazes de nomear nenhum dissidente conhecido das tiranias da esfera do nosso controle, por exemplo El Salvador. Contudo, esses mesmos intelectuais não teriam qualquer dificuldade em fornecer uma longa lista de dissidentes da antiga União Soviética. Também não teriam qualquer problema em distinguir mentiras da verdade e em reconhecer as distorções e perversões que são usadas para proteger a população da verdade nos regimes inimigos. As competências críticas que eles utilizam para desmascarar as falsidades propagadas nas nações a que chamam “hostis” desaparecem quando se trata de criticar o nosso próprio governo e as tiranias por nós suportadas. As classes instruídas têm essencialmente apoiado o aparelho de propaganda ao longo da história, e quando desvios da doutrina são reprimidos ou marginalizados, a máquina propagandística tem geralmente grande sucesso. Isso foi bem compreendido por Hitler e por Stalin, e até hoje tanto sociedades abertas como fechadas procuram e recompensam a cumplicidade da classe instruída.
     A classe instruída tem sido denominada uma “classe especializada”, um pequeno grupo de pessoas que analisam, executam, tomam decisões e gerem as coisas nos sistemas político, econômico e ideológico. A classe especializada é geralmente composta por uma pequena percentagem da população; eles têm de ser protegidos do grosso da população, a quem Walter Lippmann chamou de “rebanho desnorteado”. Esta classe especializada leva a cabo as “funções executivas”, o que significa que são eles que pensam, planejam e percebem os “interesses comuns”, que para eles são os interesses da classe empresarial. A grande maioria das pessoas, o “rebanho desnorteado”, devem funcionar na nossa democracia como “espectadores”, não como “participantes na ação”, de acordo com as crenças liberais democráticas que Lippmann articula com clareza. Na nossa democracia, de vez em quando é permitido aos membros do “rebanho desnorteado” participar na aprovação de um líder através daquilo a que chamamos “eleição”. Mas, uma vez confirmado um ou outro membro da classe especializada, devem retirar-se e voltar a ser espectadores.
     Quando o “rebanho desnorteado” tenta ser mais do que simples espectadores, quando as pessoas tentam tomar-se participantes nas ações democráticas, a classe especializada reage àquilo que chama “crise de democracia”. E por isso que existiu tanto ódio entre as elites dos anos 1960, quando grupos de pessoas que historicamente sempre foram marginalizadas, começaram a organizar e a interferir com as políticas da classe especializada, em particular na guerra do Vietnã, mas também na política social interna.
     [...]Os membros do “rebanho desnorteado” devem ser profundamente doutrinados nos valores e interesses corporativos privados e controlados pelo estado. Aqueles que são bem sucedidos em instruir-se nos valores da ideologia dominante e que provam a sua lealdade ao sistema doutrinal podem tornar-se parte da classe especializada. O resto do “rebanho desnorteado” deve ser mantido na linha, longe de problemas e mantendo-se sempre, quanto muito, espectadores da ação e distraídos das verdadeiras questões que interessam. A classe instruída considera-os demasiado estúpidos para gerirem os seus próprios assuntos, e por isso precisam da classe especializada para se assegurarem de que não terão a oportunidade de agir com base nos seus “equívocos”. Segundo a classe especializada, os 70 por cento das pessoas que consideram que a Guerra do Vietnã foi moralmente errada devem ser protegidos dos seus “equívocos” ao oporem-se à guerra: eles devem acreditar na opinião oficial de que a Guerra do Vietnã foi apenas um erro.
     Para proteger o “rebanho desnorteado” de si próprio e dos seus “equívocos”, numa sociedade aberta a classe especializada precisa de se virar cada vez mais para a técnica da propaganda, para a qual se usa o eufemismo “relações públicas”. Por outro lado, em estados totalitários o “rebanho desnorteado” é mantido no lugar por um martelo que paira sobre as suas cabeças, e se alguém se desvia, tem sua cabeça esmagada. Uma sociedade democrática não se pode apoiar na força bruta para controlar a população. Por isso, é preciso confiar mais na propaganda como forma de controlar a mente pública. A classe instruída toma-se indispensável na diligência de controle da mente e as escolas têm um papel importante neste processo”.

FILMES:

Entre os Muros da Escola
Vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes, em 2008, o filme é baseado no livro homônimo de François Bégaudeau (lançado no Brasil pela Martins Editora), que retrata a experiência de um professor ginasial – ele próprio – às voltas com uma turma que, à primeira vista, não parece muito a fim de cooperar. Interpretado também por François, o personagem central da história tem de lidar não só com a falta de interesse dos alunos em sua disciplina, mas com as diferenças sociais e o choque entre culturas africana, árabe, asiática e, claro, europeia, dentro das quatro paredes da sala de aula.
      Rodado durante sete semanas em um colégio do leste de Paris, “Entre os muros da escola” tem ares de documentário e um elenco todo de não atores – alunos, professores e pais. Louise é a princesinha da classe; Arthur, o emo de poucas palavras; Souleymane, o garoto marrento que chega às vias de fato com o professor e que, por isso, pode acabar expulso da escola... não fosse a aliança com Khoumba e Esmeralda, as amigas inseparáveis e tagarelas a quem, num momento de irritação, François chama de “vadias” – deslize este que pode acabar com mais uma expulsão: a do professor.
Direção: Laurent Cantet
Ano: 2008
Áudio: Francês/Legendado
Duração: 122 minutos
Tamanho: 705 MB

Escritores da Liberdade
Hilary Swank, duas vezes premiada com o Oscar, atua nessa instigante história, envolvendo adolescentes criados no meio de tiroteios e agressividade, e a professora que oferece o que eles mais precisam: uma voz própria. Quando vai parar numa escola corrompida pela violência e tensão racial, a professora Erin Gruwell combate um sistema deficiente, lutando para que a sala de aula faça a diferença na vida dos estudantes. Agora, contando suas próprias histórias, e ouvindo as dos outros, uma turma de adolescentes supostamente indomáveis vai descobrir o poder da tolerância, recuperar suas vidas desfeitas e mudar seu mundo. Escritores da Liberdade é baseado no aclamado best-seller O Diário dos Escritores da Liberdade.
Direção: Richard LaGravenese
Ano: 2007
Áudio: Português
Duração: 123 minutos
Tamanho: 694 MB

O Grande Desafio
Incentivados pelo professor (Denzel Washington), os jovens Henry Lowe (Nate Parker), Samantha Booke (Jurnee Smollett) e James Farmer Jr. (Denzel Whitaker) for­ma­ram uma equipe praticamente imbatível de debatedores (daí o título original, “The Great Debaters”; “os ótimos debatedores” em português) entre os anos 20 e 30, primeiro derrotando as principais universidades para negros, e depois, conseguindo um con­fronto his­tó­rico com a toda pode­rosa Harvard, for­mada por alunos brancos.
A com­pe­ti­ção reúne duas equi­pes de estu­dan­tes que pre­ci­sam argu­men­tar e con­ven­cer jura­dos sobre temas pré-definidos.
Com um elenco notá­vel, que inclui dois ven­ce­do­res do Oscar (Washington e Forest Whitaker), e jovens talen­to­sos, O Grande Desafio é um filme digno, admi­rá­vel e tem gran­des momen­tos de inter­pre­ta­ção.
Como exem­plo, a cena em que James Farmer (Whitaker) atro­pela um porco e pre­cisa se des­cul­par com dois homens bran­cos, que o humi­lham. Ou quando o mesmo con­fronta Melvin B. Tolson. Ambos são homens e pro­fis­si­o­nais de pos­tu­ras e opi­niões dife­ren­tes, mas têm res­peito um pelo outro e sabem que, ape­sar das dife­ren­ças, dese­jam o mesmo: igual­dade social.
Indicado ao Globo de Ouro na cate­go­ria Melhor Filme Dramático em 2008, e ven­ce­dor, no mesmo ano, do prê­mio Stanley Kramer do Sindicato dos Produtores.
No filme pre­sen­ci­amos a vida real de pes­soas que fize­ram o bem, rom­pe­ram bar­rei­ras sem pre­ci­sar fazer uso de armas, con­tando “ape­nas” com o dom da sabe­do­ria e a fé em suas atitudes.
Direção: Denzel Washington
Ano: 2007
Áudio: Português
Duração: 127 minutos
Tamanho: 691 MB

O Clube do Imperador
William Hundert (Kevin Kline) é um professor da St. Benedict's, uma escola preparatória para rapazes muito exclusiva que recebe como alunos a nata da sociedade americana. Lá Hundert dá lições de moral para serem aprendidas, através do estudo de filósofos gregos e romanos. Hundert está apaixonado por falar para os seus alunos que "o caráter de um homem é o seu destino" e se esforça para impressioná-los sobre a importância de uma atitude correta. Repentinamente algo perturba esta rotina com a chegada de Sedgewick Bell (Emile Hirsch), o filho de um influente senador. Sedgewick entra em choque com as posições de Hundert, que questiona a importância daquilo que é ensinado. Mas, apesar desta rebeldia, Hundert considera Sedgewick bem inteligente e acha que pode colocá-lo no caminho certo, chegando mesmo a colocá-lo na final do Senhor Julio Cesar, um concurso sobre Roma Antiga. Mas Sedgewick trai esta confiança arrumando um jeito de trapacear.
Direção: Michael Hoffman
Ano: 2002
Áudio: Português
Duração: 109 minutos
Tamanho: 599 MB

Pink Floyd: The Wall
Órfão de pai (morto durante a Segunda Guerra Mundial), o jovem Pink Floyd (Bob Geldof) tem a infância marcada pela perseguição de seu professor e pela superproteção da mãe. Adulto, ele se torna um astro do rock e entra em depressão. Para salvar sua consciência e a própria vida, Pink terá de lidar diretamente com os fantasmas do passado.
Direção: Alan Parker
Ano: 1982
Áudio: Inglês/Legendado
Duração: 95 minutos
Tamanho: 709 MB 

quinta-feira, 19 de abril de 2012

História em megabytes

Em tempos de livros digitais, ‘bibliotecas públicas virtuais’ aproximam os leitores de grandes autores que já caíram em domínio público – e também de obras pirateadas e até proibidas pela Justiça.
Felipe Sáles

     Não há dúvidas de que os historiadores gostam mesmo é de papel – de preferência, velho. Mas em tempos de tanta documentação histórica digitalizada – e diante da popularização de tablets que agitam o consumismo natalino –, a RHBN Online preparou o caminho das pedras para os leitores mais modernos encontrarem livros eletrônicos gratuitos no emaranhado de megabytes da internet.
     Há uma infinidade de obras em domínio público presentes nas estantes das bibliotecas públicas virtuais, que permitem pegar livros “emprestados” por tempo indeterminado. É o caso, por exemplo, de um dos nossos mais célebres escritores. Machado de Assis conta até com um site especial, feito pelo Ministério da Educação, que disponibiliza em formato PDF a obra completa do primeiro presidente da Academia Brasileira de Letras. Até as correspondências do escritor podem ser baixadas para o seu computador ou tablet.

     O site Domínio Público, do Ministério da Educação, é o oásis dos novos leitores, com mais de 180 mil obras à disposição. Quem não ganhou um tabletno Natal não precisa se preocupar: os livros são disponibilizados, na maioria das vezes, em formato PDF e HTML, padrão das páginas de internet que pode ser visto em qualquer computador. Desde 2004, já foram feitos mais de 30 milhões de downloads de livros diversos.  
     Apenas sobre História Geral, são 1.263 obras – 726 delas em português. A mais acessada é “A escravidão”, de Joaquim Nabuco, lida virtualmente por mais de 33 mil pessoas. Outro que se destaca é “História do Brasil: 1500-1627”, de Frei Vicente de Salvador. Quem não leu o célebre “Capítulos de História Colonial (1500-1800)”, de João Capistrano de Abreu, pode começar a qualquer momento.
      Obviamente, a benesse não se restringe aos autores nacionais. Basta um clique para ter acesso a obras de William ShakespeareFernando Pessoa e Dante Alighieri – best seller online, com mais de 1,7 milhão de livros baixados –, passando por Pero Vaz de Caminha e Luís de Camões. Não há por que se preocupar com o idioma: o site oferece 16 opções – de latim a sânscrito! –, incluindo, obviamente, versões em português.

Bibliotecas virtuais estaduais e independentes 
     Outras opções interessantes são o Google Livros e os sites independentes  Biblio e eBooksBrasil. Porém, há alguns problemas: o Google não permite a busca por disciplina, mas torna-se uma boa opção para quem sabe o que procura. Já os outros não têm uma navegabilidade muito fácil de lidar. 
      Mas o melhor é que a ideia se irradia por outros estados. O governo do Amazonas, por exemplo, criou sua própria Biblioteca Virtual onde é possível encontrar o “Almanaque do Amazonas para 1908”, repleto de informações sobre Manaus no início do século XX, com direito a fotos e informações gerais da cidade. Já a editora da Universidade Estadual Paulista (Unesp) resolveu disponibilizar, gratuitamente, 120 títulos acadêmicos em formato digital. Desde o ano passado, mais de 60 mil pessoas fizeram o download.

Exclusivo na internet 
     Na internet é possível não só encontrar livros para todos os gostos e preços, mas também preciosidades bem longe das prateleiras, graças à Justiça brasileira. 
      É o caso de “Roberto Carlos em detalhes”, do historiador Paulo César de Araújo, à disposição, com exclusividade, na internet. Para desespero do rei, que proibiu a comercialização da obra, o Google sinaliza mais de 6 mil sites disponibilizando gratuitamente o livro que disseca a vida do cantor. Paulo César, que não tem ideia de como a obra foi parar na rede, não se cansa de receber e-mails de leitores, não só do Brasil como da Argentina, México e Portugal.
      O livro apareceu digitalizado logo após a proibição, em abril de 2007. Na época, até o então ministro da Cultura, Gilberto Gil, admitiu que estava lendo a biografia pela internet. Apesar de não capitalizar um trabalho de 15 anos de pesquisa, que abrangeu cerca de 200 entrevistas, Paulo César vê um lado positivo.
      “A rapidez e amplitude com que isto aconteceu podem ser vistas como um ato de desobediência civil, uma reação da sociedade contra a censura. Isto eu acho positivo. Só lamento que meu livro não possa continuar também livremente nas livrarias, na forma como foi originalmente publicado. Seja como for, o importante é que 'Roberto Carlos em detalhes' continue acessível ao público. Eu escrevi para ser lido”.

“Democratização da leitura”

      Por outro lado, vários sites e blogs disponibilizam obras inteiras pirateadas – em alguns casos, envoltas num vieis ideológico de democratização da leitura. Num manifesto na internet, os idealizadores do projeto argumentam que a democratização do acesso à tecnologia e a precariedade dos espaços físicos de leitura obrigam a “reconhecer a falência do governo em prover sua população com as ferramentas tradicionais de inclusão cultural, como as bibliotecas”.
       O projeto – que conta com mais de 50 mil usuários cadastrados – parte da hipótese de que “as bibliotecas digitais têm o potencial de provocar mudanças no hábito de leitura e ampliar o acesso a livros”. Até aí, tudo bem. Só falta combinar com os autores que, afinal, precisam sobreviver para manter a "causa".
      Num desses sites são oferecidos, só de História Geral, 19 títulos, como o “Livro das moedas do Brasil – 1643 até o presente”, de Cláudio Amato, Irlei Neves e Arnaldo Russo, e até os oito volumes de “História da Geral África”. Nenhuma editora escapa, ao ponto de algumas capas de livros ganharem até selo do site pirata.

Iniciativas em prol de pesquisadores e leitores

      Mas como a nova ordem veio para ficar, a Biblioteca Nacional, claro, não ficaria de fora e está com um laboratório de digitalização a todo vapor, seguindo a tendência das bibliotecas mundo afora. A BN faz parte do projeto Biblioteca Digital Mundial, juntamente com instituições de Alexandria, Egito e Rússia. O projeto prevê a digitalização de documentos, cartas, fotos e mapas nas seis línguas oficiais da ONU (inglês, francês, espanhol, árabe, chinês e russo), além do português, graças à participação da Biblioteca Nacional. Estão sendo digitalizados 1.500 mapas raros dos séculos XVI a XVIII, além de 42 álbuns com cerca de 1.200 fotos da Coleção Thereza Christina Maria, doada pelo Imperador D. Pedro II à BN.
      Mas, quem não aguenta de saudade do cheirinho de papel, a internet também oferece uma solução. O site Trocando Livros faz, justamente, o que o nome propõe: você cria uma lista de livros que quer trocar e fica aguardando o interesse de algum usuário. Quando houver a solicitação, você envia pelos correios e ganha um crédito para solicitar outro livro. E quem estiver de olho na estante alheia, pode comprar crédito por uma quantia pré-fixada.


FONTE: Revista de História