“E agora que vocês viram no que a coisa deu, jamais esqueçam como foi que tudo começou” (Bertolt Brecht)

domingo, 10 de julho de 2011

Quase dois irmãos

As semelhanças e diferenças entre os integralistas e nazistas brasileiros
     Em “O grande ditador”, famoso filme de Charles Chaplin, ocorre um encontro entre Hitler e Mussolini, no qual os dois passam o tempo todo querendo mostrar que um é melhor do que o outro. As cenas hilariantes ilustram os problemas de relacionamento entre os movimentos reconhecidos como fascistas, que se alastraram pelo mundo entre os anos 1920 e 1940. Aqui no Brasil, as relações entre integralistas e nazistas também foram marcadas por vários tipos de problemas.
     Mesmo que muitos pensem até hoje que a Ação Integralista Brasileira (AIB) foi um simples apêndice do Partido Nacional-Socialista ou, na melhor das hipóteses, uma imitação tupiniquim do partido alemão, a situação era um pouco mais complicada. Se olharmos para o período anterior a 1938, o quadro que se tinha era: integralistas e nazistas atuando de forma bastante livre dentro do país. De 1938 a 1941, a situação mudou, pois ambos foram proibidos de se manifestar politicamente, mas os governos brasileiro e alemão continuaram tentando uma amizade. E depois de 1942 houve nova mudança, quando os dois países declararam guerra, um contra o outro. Além disso, essa análise também depende do que estamos observando – a posição oficial da AIB ou do Partido Nazista, ou a de militantes regionais e locais?
     Ao contrário de muita coisa que se lê por aí, ainda não foram encontrados documentos que provem que o governo alemão ou o partido nazista teriam apostado suas fichas no integralismo de 1933 a 1938. Havia várias razões para que o governo alemão e a cúpula partidária se mantivessem relativamente neutros em relação ao “irmãozinho” brasileiro. A Alemanha tinha muito interesse em aprofundar relações comerciais com o Brasil e, por essa razão, esforçava-se para manter boas relações com Getúlio Vargas. E não seria de bom-tom se aproximar de uma força política que não estava no poder.
     Por outro lado, os integralistas procuravam demonstrar seu distanciamento em relação à Alemanha e seu partido, pois queriam ser vistos como um produto tipicamente brasileiro – que não era cópia do nazismo e muito menos dependia dele. Por isso, de vez em quando eles até criticavam algumas posturas do partido alemão. Além do mais, havia questões básicas que impediam uma aproximação total e irrestrita de ambas as facções. Uma delas dizia respeito ao conceito de nação. O nazismo defendia um estado baseado na ideia de raça pura; o integralismo, em contrapartida, adotou o modelo da miscigenação como o ideal a ser alcançado num possível regime integralista.
     Isso não causaria maiores problemas se os nazistas se restringissem à Alemanha e os integralistas ao Brasil. Mas o fato é que havia uns 2.900 nazistas, mais de 100 mil cidadãos alemães e algumas centenas de milhares de descendentes espalhados por todo o território brasileiro. E isso poderia representar um problema. Mesmo que os integralistas fizessem malabarismos para evitar o mal-estar, não podiam negar que no regime que implantariam, caso chegassem ao poder, seriam postas em prática políticas de miscigenação e de homogeneização cultural. Isso representava uma ameaça à vida cultural alemã dentro do país.

     A coisa ia mais longe ainda. Em termos religiosos, o luteranismo deu mais apoio ao nazismo do que o catolicismo. Plínio Salgado fazia questão de dizer que a religiosidade era condição essencial para um militante do integralismo, ainda que não houvesse preferência por uma doutrina específica. Mas isso não passava de teoria. Na prática, não dava para negar que havia uma simpatia pelo catolicismo, e sua influência estava subentendida em toda a doutrina integralista.
     É claro que movimentos políticos não se valem somente de doutrinas abstratas, e se caracterizam pela militância concreta no dia a dia. Sob essa perspectiva, era possível encontrar de tudo pelo Brasil afora. Havia nazistas combatendo o integralismo e vice-versa, assim como simpatizantes das duas correntes políticas atuando em conjunto. A cartilha oficial, portanto, nem sempre era a norma. O que explica a existência de sedes partidárias lado a lado em alguns lugares e os anúncios de representantes de ambos os lados num mesmo jornal. Houve até o caso de um fazendeiro integralista que chegou a marcar seu gado com a suástica. Essas coisas aconteciam tanto em regiões interioranas, por conta da configuração política local, como em grandes centros urbanos, como São Paulo e Rio de Janeiro. Mas o “nativismo” integralista também era alvo de duras críticas, principalmente nas “bases” nazistas.
     Mesmo que houvesse uma ou outra divergência na cúpula partidária e governista alemã em relação ao integralismo, o esforço para manter a neutralidade vigorou por muito tempo, inclusive depois que o governo Vargas deu início à política de “nacionalização”, que primeiro proibiu as escolas das comunidades imigrantistas e depois fechou as instituições culturais. Por fim, proibiu o uso das próprias línguas estrangeiras. Ainda em 1940, Gustavo Barroso – supostamente o integralista mais simpático ao nazismo, em função de seu feroz antissemitismo – fez uma viagem à Alemanha. É possível que existam outros relatórios sobre essa visita, mas o que está disponível para averiguação no Geheimes Staatsarchiv (Arquivo Secreto do Estado), em Berlim, mostra que as restrições manifestadas durante a década de 1930 não haviam desaparecido. Isso porque, perguntado sobre o tratamento que um possível futuro regime integralista daria à “minoria” alemã no Brasil, o visitante teria se esquivado a dar uma resposta clara.
     A pesquisa histórica ainda não avançou muito para esclarecer o que realmente ocorreu no período posterior à declaração de guerra entre Brasil e Alemanha, em 1942. Há indícios de que agentes alemães entraram em contato com Plínio Salgado, exilado em Portugal, para que juntos estabelecessem formas de convivência após a esperada vitória alemã na guerra. Os nazistas e o integralista estariam, naquele momento, praticando futurologia. Os historiadores não são futurólogos, e por isso, infelizmente, não têm como responder a uma pergunta incômoda que ouvem com muita frequência: “E se o nazismo tivesse vencido a guerra, como ficaria a sua relação com os integralistas?”

René E. Gertz é professor de História na PUC-RS e na UFRGS e autor de O fascismo no sul do Brasil: germanismo, nazismo, integralismo (Mercado Aberto, 1987).

Saiba Mais - Bibliografia
Delegacia de Ordem Política e Social de Santa Catarina. O punhal nazista no coração do Brasil. Florianópolis: Imprensa Oficial do Estado, 1943.
HILTON, Stanley E. A guerra secreta de Hitler no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1983.

Saiba Mais – Links

Saiba Mais – Documentário
Sem Palavras
Sem Palavras resgata as vivências dos descendentes de alemães sobre a perseguição ocorrida durante a Segunda Guerra Mundial no Sul do Brasil, região colonizada por alemães no século 19. A Campanha de Nacionalização do presidente Getúlio Vargas e a entrada do Brasil na Guerra em 1942, contra os países do Eixo, aumentou a repressão aos estrangeiros e imigrantes daqueles países. O documentário mostra um dos lados da história, relatado por quem era criança e descendente de alemão nos anos 1940. A memória é subjetiva, porém verdadeira, mesmo quando parece distorcida dentro da história oficial, essa sim muito mais complexa.
Direção: Kátia Klock
Ano: 2009
Áudio: Português
Duração: 52 minutos

Sem Palavras

Sem Palavras resgata as vivências dos descendentes de alemães sobre a perseguição ocorrida durante a Segunda Guerra Mundial no Sul do Brasil, região colonizada por alemães no século 19. A Campanha de Nacionalização do presidente Getúlio Vargas e a entrada do Brasil na Guerra em 1942, contra os países do Eixo, aumentou a repressão aos estrangeiros e imigrantes daqueles países. O documentário mostra um dos lados da história, relatado por quem era criança e descendente de alemão nos anos 1940. A memória é subjetiva, porém verdadeira, mesmo quando parece distorcida dentro da história oficial, essa sim muito mais complexa.
Direção: Kátia Klock
Ano: 2009
Áudio: Português
Duração: 52 minutos
Tamanho: 241 MB

sábado, 9 de julho de 2011

Felicidade, esta fugitiva


O sentimento que move a humanidade sofreu modificações
     Sentimentos são tão fugidios quanto importantes na história humana. Nos últimos séculos, o desenvolvimento da ciência histórica contribuiu para a análise do mundo social, desvendando – ou pretendendo desvendar – estruturas econômicas, desenhos políticos e formações culturais. Este movimento, que acompanhou a profissionalização do ofício de historiador, impulsionada no século XIX, nos ajudou a construir parâmetros para os discursos sobre o passado, mas os estudos sobre sentimentos sempre ficaram em segundo plano.
     Entretanto, a História é protagonizada por mulheres e homens. E é impossível compreendê-los sem que se leve em consideração esta pergunta tão subjetiva: o que, em última análise, os move? Teólogos, filósofos, gurus e líderes religiosos têm se debruçado há milênios sobre este tema, e nada mais natural que a historiografia também o faça. Livros, teses e grupos de pesquisa têm se empenhado nesta área, no Brasil e no exterior, provando que o conceito de felicidade sofreu modificações e foi visto de maneiras diversas ao longo dos tempos.
     Para os gregos do período Clássico, os homens eram impulsionados pela busca da eudaimonia. Para Aristóteles (384-322 a.C.), na Ética a Nicômaco, o bem estar humano está intimamente associado a esta busca de se “estar sob um bom gênio”, como pode ser traduzida a expressão grega, isto é, a felicidade. Para o filósofo grego, as pessoas se engajavam na vida política ou em qualquer outra atividade por conta de uma inclinação natural ao estado de bem estar. Este estado da alma, portanto, era o objetivo profundo de qualquer movimento humano, em qualquer plano da vida. Epicuro (341-271 a.C.), seu contemporâneo, dedicou sua filosofia à busca da felicidade, estado que seria constituído pela ausência da dor física (aponia) e pela tranquilidade espiritual (ataraxia). A busca pelo prazer, em todos os sentidos, assume na filosofia epicurista um lugar central na explicação para todos os fenômenos humanos.
     Se os gregos pagãos buscavam a felicidade em vida, o cristianismo, que se impôs no ocidente a partir do século IV da nossa era, adiou a realização deste ideal para a pós-morte. Em um mundo criado pela extrema convulsão social (as “invasões bárbaras”) e pela imposição de uma religião que rejeita o mundo terreno, ser feliz só podia ser um projeto para um plano exclusivamente espiritual, onde qualquer vestígio da corrompida existência material humana estivesse ausente. Ao longo da Idade Média, o afastamento do ideal cristão de mortificação da carne podia resultar em dura repressão – o que não significa que muitos não tenham se dedicado intensamente à busca de uma satisfação física e psíquica à revelia do que queriam teólogos e bispos.
     A partir do século XV, com a “redescoberta” dos valores da Antiguidade, que colocavam o homem terreno no centro das atenções, a busca da felicidade em vida começou a entrar novamente na ordem do dia. Em primeiro lugar, uma mudança de atitude: se até então o homem precisava a todo o momento ser punido por conta da sua natureza essencialmente pecaminosa, o Humanismo supera este problema e assume que o ser humano, por ser a obra-prima do Criador, pode e deve ter sua existência terrena valorizada. A partir daí, a satisfação neste mundo se torna legítima, e a mais evidente prova desta libertação é a busca pela satisfação estética. Do início ao fim, a arte do Renascimento é também uma busca desbragada pela beleza que há no mundo – uma beleza humana ou humanizada, que pode eventualmente brotar da natureza, mas que está mais associada à ação das mãos dos homens. Beleza e felicidade estão novamente associadas.
      A Época Moderna, que integrou o Novo Mundo à velha Europa, viu a felicidade cada vez mais distante. Se o início deste período trouxe esperanças quanto à realização terrena deste ideal, a consolidação dos estados modernos – com a formação de uma opressiva autoridade política e o consequente estado de guerra permanente, acompanhado de convulsões religiosas, de pestes e de fome – acarretou um deslocamento geográfico desta ideia. Não foram poucos os que se arriscaram a atravessar o Atlântico a bordo de frágeis embarcações movidas por três elementos igualmente importantes: os ventos, as correntes marítimas e a procura da felicidade.
      Os súditos ingleses na América do Norte estavam muito certos da sua escolha. E, no século XVIII, na medida em que viram esta sua busca da felicidade – a esta altura já associada a uma ideia de liberdade econômica e de uma concepção absoluta da propriedade privada – ameaçada por atitudes arbitrárias do Parlamento inglês, não tiveram dúvida: ela era mais importante do que a submissão à Coroa. Na abertura de Senso Comum, de Thomas Paine, um dos textos políticos de maior impacto no seu tempo, publicado na Filadélfia em janeiro de 1776, o escritor liberal e revolucionário assume que os homens estão associados primordialmente para buscar a felicidade. Em 1792, em seu Direitos do Homem, Paine incluía esta procura entre os direitos essenciais dos indivíduos em sociedade: “Os direitos naturais são aqueles que cabem ao homem em virtude de sua existência. Desse tipo são todos os direitos intelectuais, ou direitos da mente, e também todos aqueles direitos de agir como um indivíduo para seu próprio conforto e felicidade, que não sejam prejudiciais aos direitos naturais dos outros”.  
     No século XIX, a crença na evolução progressiva da humanidade transferiu a felicidade para a realização material. Os avanços tecnológicos e os ganhos econômicos criaram um mundo no qual a satisfação física e a espiritual pareciam absolutamente palpáveis, ou ao menos possíveis de serem alcançados em algum tempo futuro. A tristeza e a angústia só poderiam ser encaradas como patologias – a psicologia não nasceu no século XIX por acaso.
     Há mais de cem anos, portanto, a realização imediata deste ideal substituiu o processo de busca – os livros de auto-ajuda e os antidepressivos são provas desta transformação. Procurar a felicidade por meio de ações em sociedade, algo que moveu os homens no ocidente desde o Renascimento, tornou-se uma atividade ridiculamente obsoleta, enquanto nos satisfazemos com uma literatura de qualidade questionável e toneladas de remédios – excluindo-se, é claro, casos médicos comprovados.
     Sair de um ponto e tentar chegar a outro pode ter sido, durante séculos muito produtivos em termos materiais e intelectuais, um motor da História. Assumir que a tristeza é parte importante da vida e buscar, de forma individual e coletiva, a satisfação estética de todos os sentidos, tal como faziam muitos contemporâneos de Leonardo da Vinci e de Henrique VIII, talvez seja, atualmente, um verdadeiro ato de resistência.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Revolução Renovadora

Prestes a completar 80 anos, a chegada de Vargas ao poder transformou a política do país e abriu as portas para a industrialização

     Como entender a Revolução de 1930 oitenta anos depois? O movimento abarcou vários períodos, foi seriamente contestado, reprimiu brutalmente seus opositores, ganhou o apoio da classe operária e transformou a economia e o modo de se fazer política no país. Aparentemente contraditório, assim como seu principal protagonista, Getúlio Vargas (1882-1954), ele abriu um período da História do Brasil sobre o qual ainda há muita coisa no ar.
     Cansada da política ultrapassada da velha República – período que vai da proclamação da República à chegada de Vargas ao poder (1889-1930) –, a Revolução concretizou a vontade de transformação que a população brasileira tanto queria. Com exceção da oligarquia cafeeira paulista e das outras que dependiam do governo central, a sociedade apoiou com entusiasmo o movimento, que abriu espaço para outras lutas políticas: partidárias, parlamentares, sindicais, estudantis e militares. A classe operária, os novos grupos burgueses e os setores médios urbanos queriam apresentar suas plataformas políticas ou reivindicações.
     Embora não tenha modificado profundamente o país – o capitalismo e o clientelismo permaneceram e a reforma agrária não aconteceu –, a Revolução de 1930 representou um marco em nossa História. Isso porque antes, durante a Primeira República, a economia era essencialmente agrária e girava em torno da exportação do café, enquanto o poder político estava centralizado nas mãos dos grandes cafeicultores.
     Nos anos 1920, a chamada política do “café com leite” – revezamento de mineiros e paulistas na Presidência do país – estava com os dias contados. A produção cafeeira entrou numa crise sem volta, que acabou sendo agravada pela quebra da Bolsa de Nova York em outubro de 1929. Com isso, setores da economia não vinculados ao café, como aqueles ligados à produção e à exportação de carne no Rio Grande do Sul, ficaram fortalecidos.
     O fato de Washington Luís (1869-1957), presidente da República de 1926 a 1930, não abrir mão de um candidato paulista para a sua sucessão ajudou a organizar a oposição à oligarquia cafeicultora paulista. Como era a vez de um presidente mineiro no rodízio, a insistência de Washington Luís no nome do paulista Júlio Prestes (1882-1946) levou ao lançamento de um candidato de oposição. O rompimento de Minas Gerais com São Paulo foi decisivo para os acontecimentos políticos que se seguiram, assim como a organização da Aliança Liberal, que, além dos mineiros, também contava com o Rio Grande do Sul, a Paraíba, o Partido Democrata Paulista e os tenentes.
     O candidato do governo acabou saindo vitorioso nas eleições nada secretas e evidentemente fraudulentas de março de 1930, fato reconhecido pelo governador do Rio Grande do Sul, Borges de Medeiros (1863-1961), na edição de 19 de março do jornal A Noite: “Fraudes houve em todo lugar, inclusive aqui.” Getúlio Vargas havia obtido quase 100% dos votos do estado, resultado que levou o bloco da Aliança Liberal a se articular para chegar ao poder por outros meios.
     Os tenentes – que gozavam de grande prestígio desde a revolta do Forte de Copacabana (1922), a revolução paulista (1924) e a coluna Prestes-Miguel Costa – achavam que havia chegado a hora de pegar nas armas e tomar o poder, enquanto Borges de Medeiros pregava a conciliação. Pensando em levar adiante o plano dos militares, Vargas se encontrou com o então líder tenentista Luís Carlos Prestes (1898-1990) em duas ocasiões – novembro de 1929 e janeiro de 1930 –, e lhe entregou 800 mil dólares para comprar armamentos. Em maio de 1930, Prestes rompeu com os tenentes e ficou com a maior parte do dinheiro para fazer “a verdadeira revolução”: a comunista. Rompeu sozinho. Todos os tenentes ficaram do lado de Vargas.
     O assassinato do presidente do estado da Paraíba, João Pessoa, vice na chapa de Getúlio, em julho de 1930, embora não tivesse motivos políticos, foi usado para acirrar os ânimos e convencer o futuro presidente e seus aliados civis de que a revolução armada era uma necessidade. Com isso, teve início, no dia 3 de outubro de 1930, um movimento encabeçado pelos tenentes que tomou os quartéis de todo o país, até com certa facilidade. Ao perceberem que a revolução havia sido vitoriosa, os generais Tasso Fragoso (1869-1945), João de Deus Mena Barreto (1874-1933) e o almirante Isaías de Noronha (1874-1963) depuseram Washington Luís e instalaram uma junta governativa que entregou o poder a Getúlio Vargas na madrugada de 31 de outubro, quando este chegou ao Rio. Três dias depois, o ex-candidato derrotado tomou posse como Chefe do Governo Provisório. Era o fim da “velha” República e o começo da “era Vargas”.
     A vitória da Revolução reforçou uma ideologia positivista que pregava a crença na importância da indústria, em um governo centralizador e autoritário e no paternalismo com os trabalhadores. Vargas acreditava – talvez com razão – que seria possível, naquela época, proclamar a independência econômica do Brasil, cortando os laços de dependência com o exterior. Se realmente existiu, tal possibilidade foi frustrada pela Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Em relação à classe operária, o novo governo foi, ao mesmo tempo, condescendente e altamente repressivo. Os trabalhadores urbanos obtiveram ganhos significativos: salário-mínimo, jornada de trabalho de oito horas e regulamentação do trabalho de menores e das mulheres. Mas, ao mesmo tempo, a estrutura sindical ficou totalmente atrelada ao Ministério do Trabalho.
     Não se pode falar da Revolução de 1930 sem considerar tudo o que ocorreu nos anos seguintes. Em julho de 1932, teve início uma rebelião em São Paulo que pretendia cobrar do presidente a convocação de uma Assembleia Constituinte. Debelada a revolta, uma segunda Constituição acabou sendo promulgada no dia 17 de julho de 1934, e resultou na eleição indireta de Vargas como presidente. Por tudo isso, ele enfrentava uma forte oposição: parte dos tenentes que o haviam apoiado em 1930, desiludida com o governo, que consideravam não ter cumprido as promessas de campanha, criou, em março de 1935, a Aliança Nacional Libertadora.
     Getúlio ainda perdeu boa parte dos aliados gaúchos, que deixaram de apoiá-lo por causa de disputas de poder nas eleições estaduais de outubro de 1935. O governador do Rio Grande do Sul, Flores da Cunha (1880-1959), que intervinha na política fluminense, fez com que toda a bancada do estado se opusesse a Getúlio no Congresso, reforçou ostensivamente o Corpo de Provisórios e a Brigada Militar, e tentou jogar Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Mato Grosso e Rio de Janeiro contra Vargas.
     Com grande inteligência política, Getúlio uniu o país em torno do combate ao comunismo – pois sabia melhor do que ninguém que os comunistas, que na época estavam desarticulados ou presos, não ofereciam perigo algum –, conseguiu neutralizar seus opositores e até ganhou o apoio destes. Sabia, contudo, que deixaria seu cargo em 1938, quando haveria novas eleições. Mas o presidente não queria que os paulistas retomassem o poder com Armando de Salles Oliveira (1887-1945).
     No dia 10 de novembro de 1937, Getúlio deu o golpe que estabeleceu o Estado Novo. Sem poder contar totalmente com seus antigos aliados – e prevendo a vitória dos paulistas nas eleições de 1938 –, ele passou a se apoiar cada vez mais nos generais e coronéis simpatizantes do fascismo, que garantiram a permanência de Vargas no poder.
     Eram poucos os que, nessa época, defendiam um governo liberal. A direita, representada pelos integralistas, tinha simpatia pelo fascismo. A esquerda, dos tenentes, não descartava um regime repressor para impor suas propostas nacionalistas, antilatifundiárias e liberais. E os comunistas, que se uniram aos tenentes na Aliança Nacional Libertadora, acreditavam numa ditadura de classe para acabar com a exploração do homem pelo homem. Os mesmos generais que apoiaram Getúlio o depuseram em 29 de outubro de 1945. Mas o voto direto o levou, em 1950, outra vez à Presidência, que ele deixou definitivamente quando se suicidou no dia 24 de agosto de 1954, momento em que vinha sofrendo ataques constantes de seus opositores.
     Afinal, por que não foi possível enfrentar os desafios econômicos sem recorrer à ditadura? Por que os direitos humanos foram tão desrespeitados durante o Estado Novo, ao mesmo tempo em que se tomaram medidas de proteção aos trabalhadores? Pelo visto, essa fase marcante da História do Brasil deixa até hoje muitas questões em aberto.

Marly de Almeida Gomes Vianna é professora de História da Universidade Salgado de Oliveira e autora de Política e rebelião nos anos 30. (Editora Moderna, 1995)


Saiba Mais - Bibliografia
CARONE, Edgar. Brasil, anos de crise. 1930-1945. São Paulo: Ática, 1991.
FAUSTO, Boris. A revolução de 1930. São Paulo: Brasiliense, 1970 (há reedição recente).
MEIRELLES, Domingos. 1930, os órfãos da Revolução. Rio de Janeiro: Record, 2005.
MURAKAMI, Ana Maria Brandão (org). A Revolução de 1930 e seus Antecedentes. Coletânea de fotografias. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980.
PANDOLFFI, Dulce. Da Revolução de 1930 ao Golpe de 1937: a depuração das elites. Rio de
Janeiro: FGV/CPDOC, 1987.

Quem conta um conto...


Nós temos banana?
     Banana, laranja, manga, tudo picadinho e misturado e aí está: uma bela salada de frutas, tipicamente brasileira. Pensando bem... Apesar de hoje sermos conhecidos pela variedade de nossas frutas, é sempre bom lembrar que muitas delas têm DNA estrangeiro — são exóticas, como dizem os botânicos. A começar por um dos maiores símbolos pátrios, desde que enfeitou a cabeça de Carmem Miranda (que por sinal era portuguesa). A origem da banana é uma verdadeira salada étnica. Ela nasceu nas selvas da Índia e da Indochina, foi introduzida pelos árabes nas Ilhas Canárias e “descoberta” pelos portugueses. Só então cruzou mares para chegar ao Brasil, no começo do século XVI. Aqui já existia uma espécie de banana, a pacova, mas não se compara: ela não podia ser comida crua.
     O mesmo ocorreu com a manga. Originária da Índia foi levada às costas oriental e ocidental da África pelos portugueses, em suas viagens marítimas em busca de especiarias. Teve seu cultivo difundido para todas as regiões tropicais e subtropicais do mundo, mas somente por volta da segunda metade do século XVIII é que o Brasil, ou melhor, a Bahia, recebeu as primeiras mudas de mangueiras indianas. E a laranja? Outra fruta asiática, encontrada pelos portugueses na China e de lá trazida para a Europa.
     Deixemos de lado, então, a internacional salada de frutas, para tomar uma brasileiríssima água-de-coco, que abunda em todo nosso litoral... Fruta nacional? Também não. A Cocos nucifera chegou somente em 1553, a bordo de embarcações lusitanas provenientes das ilhas de Cabo Verde. Como as outras, tem origem longínqua: provavelmente o sudeste asiático (há controvérsias).
     São exemplos de como os alimentos podem se adaptar bem a ambientes diferentes de sua terra de origem. Ou seja: pode comer sem culpa. Mas quando quiser optar por iguarias genuinamente nacionais, vá de açaí, cupuaçu, cajá, pequi ou caju.
(Fábio Pedrosa)

Nem tudo é porão num navio negreiro
     Comum nos livros didáticos, as imagens de escravos acorrentados e amontoados uns sobre os outros, mal podendo respirar, estão presentes nos relatos de vários viajantes, como os do reverendo inglês Robert Walsh (1772-1852). Mas será que os negros realmente eram transportados assim? Certamente que não. O historiador Alberto da Costa e Silva afirma que se viajassem durante 70 dias nesta posição os escravos não resistiriam. Não há dúvida de que era mais lucrativo transportar o maior número possível de cativos, mas não seria vantajoso que uma mercadoria tão valiosa se perdesse ao longo da travessia. Costa e Silva afirma que em alto mar os escravos ficavam soltos no porão e todo dia eram trazidos ao convés para respirar ar puro e se exercitar. Os negros eram acorrentados apenas quando o navio se aproximava do porto. Claro que o navio negreiro estava muito longe de ser um cruzeiro, a ventilação e a higiene no porão eram precárias, a alimentação era restrita e a superlotação uma constante. As condições dos tumbeiros não era assunto apenas dos abolicionistas, mas uma preocupação desde os tempos em que D. João era príncipe regente (1799-1807).
     Ele ofereceu recompensas para capitães e cirurgiões (médicos) de qualquer embarcação que tivesse mortalidade abaixo dos 3%, em uma época em que a média era de 10%. No convés ou no porão, acorrentados ou soltos a bordo do navio negreiro os capturados na África conheciam desde a viagem os horrores da escravidão.
(Cristiane Nascimento)

Fenícios e ‘vikings’ muito antes de Cabral
     Durante o século XIX, o passado indígena do Brasil não agradava aos intelectuais que tentavam fazer do país uma grande nação “civilizada”, nos moldes europeus. Naquela época, segundo o historiador Johnni Langer, estudiosos brasileiros tinham grande disposição para enxergar em qualquer sinal a presença de povos ligados ao passado europeu antes da chegada dos portugueses. Em 1839, o recém-fundado IHGB recebeu informações sobre inscrições rupestres na Pedra da Gávea, no Rio de Janeiro, logo identificadas como runas — um sinal inequívoco da passagem de vikings por ali. Outros grafismos encontrados pelo país e um manuscrito do século XVIII descrevendo uma cidade perdida no interior do Brasil reforçaram o mito da chegada dos nórdicos ao país em tempos remotos. A divulgação de “descobertas” sobre a presença fenícia nos Estados Unidos foi outra hipótese logo transplantada para o Brasil. Atualmente, especialistas sustentam que as estruturas que lembram cidades antigas foram talhadas pela própria natureza, e os grafismos são, na verdade, de origem indígena. Recentemente, foi publicado no Brasil o livro de um comandante reformado da Marinha britânica, Gavin Menzies, intitulado 1421: o ano em que a China descobriu o mundo (2006). Menzies utiliza documentos de origem chinesa e japonesa, dados de correntes marítimas, ventos e relatos do século XV para dizer que uma grande frota originária da China descobriu as Américas, inclusive o Brasil, mais de meio século antes dos europeus. Este trabalho ainda aguarda uma crítica mais profunda, mas pode seduzir aqueles que ainda buscam origens ancestrais “mais nobres” para o Brasil.
(Rodrigo Elias)

O dia em que Rui Barbosa virou Nero
     Uma pesquisa rápida na Internet é suficiente para provocar a desinformação: num ato insano, Rui Barbosa, à frente do Ministério da Fazenda, pôs todos os arquivos da escravidão na fogueira! A lenda deriva da interpretação exagerada de uma portaria publicada no Diário Oficial de 14 de dezembro de 1890. Nela, o ministro requisitava às tesourarias da Fazenda dos estados o envio dos documentos relativos à compra e posse de escravos para serem incinerados no Rio de Janeiro. Executada sem demora, a ordem ganhou as páginas dos jornais e revistas da época, que elogiaram a iniciativa de apagar pelo fogo “os últimos vestígios da escravidão”. Hoje se sabe que a preocupação do ministro era evitar que antigos donos de escravos usassem esses documentos para exigir indenizações à República; afinal, perderam seus bens por um ato do governo imperial. Como revelou o historiador Robert W. Slenes no artigo “O que Rui Barbosa não queimou. Novas fontes para o estudo da escravidão no século XIX” (revista Estudos Econômicos, da USP, 1983), a portaria teve alcance reduzido. Os registros de posse de escravos eram feitos em duas vias, e podem ser encontrados anexados a processos de herança e inventários post-mortem guardados nos cartórios de diversas cidades do país. Ironicamente, nossa tão malvista burocracia salvou das chamas uma parte importante da memória da escravidão. E não é demais lembrar que os “vestígios da escravidão” sobrevivem muito além dos arquivos, na formação histórica e cultural do Brasil.
(Nívia Pombo)

Feijoada na senzala
     Muita gente boa tem certeza de que a feijoada, prato que se transformou em símbolo da culinária nacional, foi inventada pelos escravos. Nos intervalos do trabalho, eles aproveitavam restos de carne que os senhores desprezavam — orelhas, rabo e pés do porco, bem como a carne-seca — e os misturavam ao feijão, obtendo uma iguaria que só cairia no gosto de todos após o fim da escravidão. Bela história, mas inverossímil. Estas partes salgadas do porco não eram consideradas “restos” pelos brasileiros que descendiam de europeus. Ao contrário, eram muito apreciadas, inclusive no Velho Mundo. A alimentação dos escravos era composta basicamente por mandioca e milho. Carne, só em raríssimas ocasiões. Anúncios em jornais brasileiros da primeira metade do século XIX – auge do escravismo no país – indicam que a “feijoada à brasileira” era apreciada em restaurantes freqüentados pela elite urbana, o que não ocorreria se o prato fosse identificado com escravos ou restos de alimento. Por sinal, este tipo de comida — o feijão combinado a outros vegetais e carnes suína e bovina — desde a Antigüidade vinha sendo apreciado na Europa mediterrânea. Os portugueses, ao introduzirem a tradição do cozido no país, substituíram o feijão-fradinho pelo feijão-preto (originário da América do Sul), muito mais saboroso na opinião de todos os estrangeiros que aqui chegavam. Foi assim que se criou a tão brasileira feijoada.
(Rodrigo Elias)

D. João das palmeiras
     Em 1809, o príncipe D. João plantou no Jardim Botânico do Rio de Janeiro sementes de palmeira obtidas clandestinamente do Jardin Le Pamplemousse por Luís de Abreu Vieira e Silva, oficial da Armada Real recolhido à ilha de França (atual Guiana Francesa) após um naufrágio. A palmeira plantada pelo regente passou a ser conhecida como Palmeira imperial, ou Palma mater. O episódio passa a impressão de que D. João foi o responsável pela difusão das palmeiras no país. Mas não foi bem assim. Segundo o botânico Manoel Pio Corrêa, autor do Dicionário das plantas úteis do Brasil e das exóticas cultivadas, publicado em seis volumes em 1926, sementes de outra espécie de palmeira, a Elaeis guineensis, originária da costa ocidental da África, chegaram à América portuguesa pelas mãos dos escravos no século XVII, adaptando-se bem ao solo baiano. Hoje, o dendezeiro ou palmeira-dendém se espalha por outros lugares, como o Pará, e fornece um dos ingredientes mais famosos da culinária nordestina, o azeite-de-dendê. Recentemente, Roseli Maria Martins D’ Elboux, mestre em História e Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo, publicou um artigo em que trata da difusão da Palma mater no Brasil (“Uma promenade nos trópicos: os barões do café sob as palmeiras-imperiais, entre o Rio de Janeiro e São Paulo”, Anais do Museu Paulista, v. 14, n.º 2, 2006). Ela conjectura que o plantio da palmeira se tornou comum no Rio de Janeiro em meados do século XIX, após a maioridade de D. Pedro II, diante da “necessidade do fortalecimento simbólico do II Império. Se isto for verdade, pode ser procedente a história segundo a qual as sementes da palmeira foram distribuídas aos súditos como sinal de proximidade ou lealdade ao poder central”. No dendê ou como símbolo imperial, não é por obra e graça de D. João que nossa terra tem palmeiras.
(Fabiano Vilaça)

A pinga que não pingava
     Deliciosa e inebriante aguardente! Escravos colocam para fermentar restos de caldo de cana, então gotas do precioso líquido pingam do teto do engenho e eles se empurram para saboreá-lo, gargantas ardidas ao serem atravessadas pela água... ardente! Marvada pinga, paixão nacional, só podia ter mesmo histórias mirabolantes.
     Não se pode negar que seu berço foram os engenhos de cana-de-açúcar, mas os ancestrais vêm de muito longe. Portugueses já produziam aguardente a partir da uva cem anos antes da colonização do Novo Mundo, e no Brasil chegaram a importá-la em discretas quantidades. A “aguardente do reino”, como era chamada, em breve encontraria uma rival nacional, filha do engenho.
     Muitas bebidas rústicas nasciam da primeira transformação da cana. As sucessivas fervuras que o caldo sofria, na busca da adequada purificação, forneciam apreciados licores. Se a primeira eliminava uma espuma grossa que caía pelas bordas das caldeiras e descia ralo abaixo para ser bebida pelos animais, da segunda caldeira a espuma era disputada pelos escravos do engenho para “fazerem a sua garapa, que é a bebida de que mais gostam”, conforme o cronista André João Antonil (1649 - 1716).
     A última espuma liberada desse processo de purificação do caldo, designada “claros”, era misturada com água fria e produzia uma “regalada bebida”, muito refrescante e excelente para matar a sede, segundo Antonil. Esse “desejado néctar e ambrosia” era também servido aos cativos do engenho.
     Cachaça e garapa são termos que começam a circular até a terceira década do século XVII, quando surgem as primeiras notícias da aguardente da cana-de-açúcar destilada em alambiques: é a “aguardente da terra”, em oposição à de uva, até ali dominante, importada de Portugal.
     Em algum momento impreciso, ao que parece situado em meados do século XVIII, começou-se a chamar a aguardente da terra de cachaça. Em 1742, segundo Almeida Jr., “já se dizia cachaça por aguardente” em São Paulo. Isto sem falar nos neologismos de ocasião: nas Cartas Chilenas, Tomás Antônio Gonzaga criou, em fins do século XVIII, a expressão “cachaça ardente”.
     E “ardente” não apenas pela sensação de calor que se seguia à sua ingestão, mas também por possuir “humores quentes” terapêuticos, produzindo efeitos benéficos em doentes. Mas do teto, ao que se sabe, não pingava.
(Luciano Figueiredo e Marcello Scarrone)

Oh! Linda Olinda
     Entre as várias explicações para o nome da cidade de Olinda, a mais conhecida está relacionada ao espanto do fidalgo português Duarte Coelho, que após tomar posse da capitania de Pernambuco em 1534, na qualidade de capitão-donatário, e encontrar um sítio de terras férteis, águas abundantes e lindos arrecifes, teria dito: “Ó linda situação para se fundar uma vila”. Gilberto Freyre, no Guia prático, histórico e sentimental da cidade de Olinda, também se refere a outra versão, em que um criado do fidalgo, ao encontrar o lugar ideal para se edificar a vila, teria exclamado com alegria: Oh! Linda! O mito de fundação da cidade é contestado por pesquisadores e historiadores. Segundo Francisco A. de Varnhagen em sua obra clássica História Geral do Brasil, Olinda seria um nome tirado do romance Amadis de Gaula, o mais importante exemplar ibérico de um gênero literário muito popular na Europa medieval – a novela ou romance de cavalaria. A história, derivada de lendas bretãs adaptadas por trovadores portugueses, gira em torno de Amadis, valente guerreiro da Gália (atualmente País de Gales), autor de inúmeras façanhas, como salvar a vida de princesas e donzelas. Entre elas, Olinda, “a Mesurada”. O romance, publicado pela primeira vez em Portugal em 1508, foi um verdadeiro best-seller. De acordo com o historiador Marcus Carvalho (UFPE), inspirou muitos conquistadores, de Hernán Cortez ao próprio Duarte Coelho. Eis por que esta é a tese mais plausível para o lindo nome.
(Filipe Monteiro)

Mário, irmão de Oswald de Andrade?
     Nascidos na cidade de São Paulo com apenas três anos de diferença, batizados com o mesmo sobrenome e dedicados à arte da Literatura, Oswald (1890-1964) e Mário de Andrade (1893-1945) poderiam até ser irmãos. Mas as coincidências, assim como as aparências, enganam. O primeiro era de família rica, filho de José Oswald Nogueira de Andrade e de Henriqueta Inglês de Sousa Andrade – irmã do escritor Inglês de Sousa. Mário nasceu de pais menos abastados, Carlos Augusto de Moraes Andrade e Maria Luísa Leite Moraes Andrade. Os dois escritores se conheceram em 1917 e deram início a uma sólida amizade, estreitada a partir de 1922 por ocasião da Semana de Arte Moderna. Naquele ano, Mário lançou uma de suas obras mais conhecidas: Paulicéia desvairada. Também na esteira do movimento modernista, surgiram da pena de Oswald o Manifesto da Poesia Pau-Brasil (1924) e o Manifesto Antropófago (1928). No intervalo da divulgação dos dois manifestos, Oswald uniu-se à pintora Tarsila do Amaral, formando o casal Tarsiwald, apelido inventado por Mário de Andrade. Solteiro, este prosseguia em seus estudos sobre música e folclore brasileiros até lançar, em 1928, outra de suas mais conhecidas e respeitadas obras, Macunaíma. A amizade entre os dois quase-irmãos só foi abalada quando Oswald se ressentiu por causa de uma crítica negativa de Mário ao seu romance Serafim Ponte Grande, publicado em 1933. A partir daí, a troca de (espirituosas) farpas deu a tônica da fraterna amizade.
(Fabiano Vilaça)

Faltou mulher na França Antártica?
     O rei francês Henrique II decidiu que também queria a sua parte no lucrativo comércio de artigos americanos – especialmente o pau-brasil. Protestantes e católicos franceses sob as ordens de Nicolau de Villegagnon se estabeleceram em 1555 em uma ilha na baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, possessão relativamente desprezada pelos portugueses, e fizeram alianças com indígenas inimigos dos lusitanos. Segundo versões recentemente divulgadas, os franceses acabaram desistindo da empreitada por conta de divisões internas causadas, sobretudo, pela ausência de mulheres. O “acúmulo de testosterona”, efeito da proibição imposta por Villegagnon do contato de seus soldados com índias sem o casamento, teria afetado o relacionamento interno de seus homens. De concreto, entretanto, sabe-se que a França, dividida internamente por guerras religiosas, não deu apoio militar aos seus súditos no Brasil. No final da década de 1550, o governo português recebeu informações de que os franceses não estavam ali de passagem, para a prática do corso, mas que pretendiam se estabelecer definitivamente, construindo um forte. Mem de Sá, governador-geral do Brasil, liderou em 1560 uma expedição de forças portuguesas e indígenas (cerca de 260 homens) contra os franceses (entre sessenta e 114 homens, segundo o historiador Paulo Knauss) e com força de combate composta em grande parte por índios (entre 800 e mil). Após uma batalha árdua, quando os portugueses se preparavam para retirar por escassez de pólvora, os franceses fugiram – segundo Mem de Sá, por causa da bravura dos portugueses, para o padre Manuel da Nóbrega, devido à intervenção divina.
(Rodrigo Elias)

Aleijadinho lazarento?
     Não são poucas as controvérsias que cercam a vida e a morte de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. A maior delas talvez seja a doença que o deformava, reconhecida como sua marca registrada. Ele era de fato vítima da hanseníase, ou, como se dizia na sua época, leproso? Faltam registros oficiais precisos para comprovar a lenda. O próprio nome pelo qual o artista é conhecido associa-se à agonia trazida pela degeneração física. Para muitos, a vilã da história foi mesmo a lepra, doença socialmente considerada horrenda, capaz de provocar enormes deformações (tratamentos químicos para conter a moléstia só surgiriam em meados do século XX). Na década de 1940, estudiosos levantaram outras hipóteses para a doença de Aleijadinho. O escultor pode ter sido vítima de ictus cerebral (uma espécie de acidente vascular) provocado pela sífilis. Também pode ter sido atacado por uma tromboangeíte obliterante (obstrução de pequenas veias) ou por uma “framboésia tropical” (infecção da pele e dos ossos causada por uma bactéria).
     Uma das mais convincentes versões para o caso relaciona a doença de Aleijadinho à porfiria, um distúrbio no metabolismo do ferro no sangue. Pesquisa recente conduzida pela Embrapa revelou um altíssimo teor de ferro em partes de uma vértebra e do fêmur do artista. Seja qual for o mal que o atormentou, Antônio Francisco Lisboa permanece inabalável no posto de mártir das artes brasileiras.
(Murilo Sebe Bon Meihy)

Quantos eram os 18 do Forte?
     Não, não é uma pegadinha do tipo “Qual é a cor do cavalo branco de Napoleão?” Trata-se mesmo uma conta difícil de fechar. Insatisfeitas com a nomeação de um civil como ministro da Guerra (Pandiá Calógeras), com o fechamento do Clube Militar e a prisão de seu presidente, o marechal Hermes da Fonseca, várias guarnições do Exército se rebelaram no Rio de Janeiro contra o governo de Epitácio Pessoa. A primeira revolta do chamado Movimento Tenentista ficou conhecida como “Os 18 do Forte”. O levante começou na madrugada do dia 5 de julho de 1922 e foi rapidamente dominado pelas forças legalistas, mas ainda resistia o Forte de Copacabana, onde se concentravam mais de trezentos militares. Diante do ultimato do governo, os líderes permitiram aos que quisessem abandonar o forte. Restaram 28 combatentes decididos a resistir até a morte. Às 13 horas do dia 6 de julho, saíram em marcha pela Avenida Atlântica. É aí que a matemática se complica: alguns componentes do pelotão suicida se renderam ou debandaram logo, mas no caminho juntou-se ao grupo o engenheiro Otávio Correia. Após vários tiroteios na altura da Rua Barroso (atual Siqueira Campos), dez homens confrontaram as tropas. Só sobreviveram os tenentes Eduardo Gomes e Siqueira Campos, capturados. Os outros dois tenentes (Nilton Prado e Mario Carpenter), cinco soldados e Otávio Correia morreram na hora ou depois de socorridos. Somente sobre estes dez há certeza. Algumas fontes acrescentam o nome do cabo Reis. Mas uma fotografia de Zenóbio Couto, de O Malho, registrou 18 revoltosos às portas do confronto final, e uma reportagem na Gazeta de Notícias mencionou três oficiais e 15 praças. Vem daí a base para o mito dos “18 do Forte”. Numa entrevista por ocasião dos cinqüenta anos do episódio, Eduardo Gomes, já brigadeiro, afirmou que, na realidade, os 18 eram 12. Questionado sobre o motivo pelo qual não revelara isso antes, respondeu simplesmente: “Nunca ninguém me perguntou!”
(Marcello Scarrone)

Em 2008, bancos tiveram mais ajuda que pobres em 50 anos

     Segundo dados divulgados pela Organização das Nações Unidas (ONU), enquanto os países pobres receberam, em meio século, cerca de US$ 2 trilhões em doações de países ricos, bancos e outras instituições financeiras ganharam, em apenas um ano, US$ 18 trilhões em ajuda pública. A ONU alertou que a crise econômica mundial piorará ainda mais a situação dos países mais pobres, agravando os problemas da fome, da desnutrição e da pobreza.
     O setor financeiro internacional recebeu apenas em 2008, quase dez vezes mais recursos públicos do que todos os países pobres do planeta nos últimos cinquenta anos. O dado foi divulgado nesta quarta-feira (24)pela campanha da Organização das Nações Unidas (ONU) pelas Metas do Milênio, destinada a combater a fome e a pobreza no mundo. Enquanto os países pobres receberam, em meio século, cerca de US$ 2trilhões em doações de países ricos, bancos e outras instituições financeiras ganharam, em apenas um ano, US$ 18 trilhões em ajuda pública.
     A ONU alertou que a crise econômica mundial piorará ainda mais a situação dos países mais pobres,
lembrando que, na semana passada, a Organização para a Agricultura e Alimentação (FAO) afirmou que a
crise deixará cerca de 1 bilhão de pessoas passando fome no mundo.
     A revelação foi feita no início de uma conferência entre países ricos e pobres, que ocorre na sede da ONU, em Nova York, para debater o impacto da crise. Segundo o diretor da Campanha pelas Metas do Milênio, Salil Shetty, esses números mostram que a destinação de recursos públicos ao desenvolvimento dos países mais pobres não é uma questão de falta de recursos, mas sim de vontade política.
     “Sempre digo que se você fizer uma promessa e não cumprir, é quase um pecado, mas se fizer uma
promessa a pessoas pobres e não cumprir, então é praticamente um crime”, disse Shetty à BBC. “O que é
ainda mais paradoxal”, acrescentou, “é que esses compromissos (firmados pelos países ricos para ajudar os
mais pobres) são voluntários”. “Ninguém os obriga a firmá-los, mas logo eles são renegados”, criticou o
funcionário da ONU.
     Um dos efeitos desta perversa distorção foi apontado pela FAO: a quantidade de pessoas desnutridas
aumentará no mundo em 2009, superando a casa de um bilhão. “Pela primeira vez na história da
humanidade, mais de um bilhão de pessoas, concretamente 1,02 bilhão, sofrerão de desnutrição em todo
o mundo”, advertiu a entidade. A FAO considera subnutrida a pessoa que ingere menos de 1.800 calorias
por dias.
     Do total de pessoas subnutridas hoje no mundo, 642 milhões concentram-se na Ásia e na região do Pacífico e outras 265 milhões vivem na África Subsaariana. Na América Latina e Caribe, esse número é de 53 milhões de pessoas. Em 2008, o total de desnutridos tinha caído de 963 milhões para 915 milhões. O motivo foi uma melhor distribuição dos alimentos. Mas com a crise, o quadro de fome no mundo voltará a se agravar. Segundo a estimativa da ONU, um milhão de pessoas deverão passar fome no mundo nos próximos meses.

ROMA ANTIGA

A Força Do Poder Espiritual

     O cristianismo surgiu na Galileia, região da Palestina conquistada e anexada pelos romanos em 40 a.C..  Segundo os Evangelhos, baseava-se nos ensinamentos de Jesus, que nasceu em Belém de Judá durante o governo de Otavio Augusto. Contava a tradição judaica que nessa pequenina cidade nasceria o Messias anunciado pelos profetas, que vi ria a Terra para anunciar o reino dos justos e a salvação da humanidade.
     Aos 30 anos, Jesus iniciou suas pregações e recrutou um grupo de seguidores, os apóstolos. Suas palavras e atitudes desafiavam tanto a elite religiosa judaica quanto as autoridades romanas. Embora Jesus afirmasse que o Reino de seu Pai não era deste mundo, foi visto como um rebelde e condenado a morte na cruz.
     Graças ao trabalho dos apóstolos, o cristianismo difundiu-se pelo Império Romano. Era uma religião para as camadas populares, uma palavra de esperança para aqueles que, desalentados pela opressão e pelo sofrimento, esperavam a salvação após a morte.
     Durante o governo de Nero iniciou-se a perseguição aos cristãos, acusados de não cultuar os deuses romanos nem o divino imperador. Nero também atribuiu aos cristãos a responsabilidade pelas calamidades e crises que se abatiam sobre o império. Mas a repressão se mostrou ineficaz: a própria intensificação dos problemas econômico-sociais do mundo romano, especial mente a partir do século III, fez aumentar o número de adeptos do cristianismo.
     Durante 250 anos os cristãos sofreram perseguições alternadas com longos momentos de paz. Em 313, o imperador Constantino publicou o Edito de Milão, que concedeu Liberdade de culto a todos os habitantes do império. Em 391, quando Teodósio tornou o cristianismo religião oficial do Estado, Roma era uma cidade decadente. Nos séculos seguintes, porem, o bispo da cidade - o papa - recorreria a centralização administrativa característica do Império Romano para impulsionar o crescimento da Igreja Católica.
     Apesar da perseguição que os cristãos sofreram inicialmente no Império Romano, foi graças ao Estado romano, principalmente após o século IV, que o cristianismo pode se expandir por toda a Europa e daí para o resto do mundo.
FONTE: “História das Cavernas ao terceiro Milênio” MOTA, M. B. e BRAICK, Patrícia R. Ed. Moderna.

O Cotidiano do povo Grego

     De maneira geral, os gregos levavam uma vida singela. Viviam em moradias feitas de pedra ou de tijolos secos ao sol e cobertos com estuque (massa preparada com gesso, água e cola).
     Faziam apenas duas refeições por dia, o almoço e o jantar. Geralmente o ariston, ou almoço, consistia em um prato de feijão ou de ervilhas acompanhado de uma cebola crua ou um nabo cozido. O deipnon, ou jantar, era a refeição principal do dia e incluía pão, queijo, figos, azeitonas e por vezes um pedaço de carne.
Os banquetes eram considerados atividades de lazer predominantemente masculinas.
     Enquanto em Atenas o banquete era um momento de diversão sem a interferência do Estado, destinado ao encontro de amigos que desejavam apenas desfrutar de boa companhia, comida ou bebida, em Esparta esses encontros tinham caráter mais formal e educativo. Eram previstos em lei pelo Estado, sendo permitida a participação feminina.
     O traje grego era simples e pratico. Homens e mulheres usavam uma túnica que descia ate os joelhos ou tornozelos, o chitão. As damas usavam essa túnica atada ao longo dos braços e ajustada na cintura, com um cinto estreito de couro, formando pregas. As túnicas mais curtas eram usadas pelos trabalhadores que precisavam ter liberdade de movimentos. A nudez era também comum entre os cidadãos gregos, os homens, que se mostravam inteiramente a vontade com a exibição pública de seus corpos.
     O culto ao corpo era reforçado pela pratica de exercícios físicos. Cada vila ou cidade contava com um ginásio ao ar livre onde os homens podiam praticar exercícios ou vários tipos de jogos. Entre os diversos jogos gregos destacaram-se os pan-helênicos e, entre eles, os jogos Olímpicos. As Olimpíadas eram realizadas na cidade de Olímpia, junto ao templo de Zeus, local para onde se dirigiam pessoas de todas as partes da Grécia. Cada cidade-estado enviava seus atletas. Além do público que comparecia ao estádio para assistir as competições, os jogos atraiam também negociantes das mais diversas mercadorias e líderes de todas as cidades que aproveitavam a ocasião para discutir politica, ate mesmo com seus adversários. E que, num testemunho da importância das Olimpíadas, durante sua realização ocorria a Trégua de Zeus: as guerras ou conflitos entre as cidades-estados cessavam, até o final dos jogos.
     Corrida, saltos, lançamento de disco e de dardo, corridas de cavalos e de carros, a pankration (uma combinação de boxe com a luta livre) e o pentatlo são exemplos das provas que os gregos enfrentavam nos Jogos Olímpicos.
     Todavia, além desses esportes, a Grécia também foi o berço de entretenimentos mais comuns que inclusive estão presentes no cotidiano brasileiro: brincadeiras com ioiô, rinhas de animais domésticos (registradas em pinturas de baixo-relevo de vasos) e jogos de azar, como o simples par-ou-ímpar,  praticados com moedas ou dados.
Extraído: “História das Cavernas ao terceiro Milênio” MOTA, M. B. e BRAICK, Patrícia R. Ed. Moderna.

Para refletir:

"Toda Filosofia também esconde uma filosofia, toda opinião é também um esconderijo, toda
palavra também uma máscara [...] Todo pensador profundo tem mais receio de ser
compreendido que de ser mal compreendido...”. Friedrich Nietzsche

links de bons sites

Diletos discentes, tudo bem? Seguem varios Links que acho que valem apena vocês navegarem.
É necessário ter tempo e paciência para conhecer os sites. Espero que sejam uteis.

http://cineaprendizagem.blogspot.com/
http://www.filmeshistoricos.com/
http://docverdade.blogspot.com/
http://www.cineconhecimento.com/
http://www.almascorsarias.com.br/
http://acervonacional.blogspot.com/
http://www.educacaoefilmes.blogspot.com/

Paginas especiais da revista Carta Maior:

Ditadura Militar
: http://www.cartamaior.com.br/templates/index.cfm?home_id=113&alterarHomeAtual=1

Japão/nuclear
: http://www.cartamaior.com.br/templates/index.cfm?home_id=114&alterarHomeAtual=1

Fome e Desordem Financeira Mundial
: http://www.cartamaior.com.br/templates/index.cfm?home_id=112&alterarHomeAtual=1

Revolta Árabe
: http://www.cartamaior.com.br/templates/index.cfm?home_id=111&alterarHomeAtual=1