“E agora que vocês viram no que a coisa deu, jamais esqueçam como foi que tudo começou” (Bertolt Brecht)

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Democracia apurada

Ao contrário do sistema eleitoral do Brasil, o dos EUA desencoraja o multipartidarismo.
As diferenças entre o sistema político do Brasil e dos Estados Unidos.

     Desde que a urna eletrônica começou a ser usada nas eleições brasileiras, em 1996, passamos a conhecer nossos prefeitos, governadores e presidentes eleitos em prazos de até 24 horas. Os norte-americanos, por sua vez, utilizam um sistema que raramente permite que seus representantes sejam revelados em menos de uma semana depois de um pleito. Se os fundadores da República dos Estados Unidos influenciaram decisivamente a primeira Constituição republicana do Brasil (1889), o mesmo não se aplica ao processo eleitoral.
     Brasil e Estados Unidos adotam o bicameralismo – a divisão das atividades legislativas em duas casas, Câmara dos Deputados e Senado –, o federalismo e o presidencialismo. Mas os dois países utilizam sistemas muito diferentes para a escolha dos representantes do Legislativo e dos chefes do Executivo. O presidente brasileiro, por exemplo, é eleito por voto direto, ao passo que nos EUA ele é escolhido indiretamente.
     A Constituição brasileira de 1988 instituiu a regra de dois turnos para a escolha do presidente, dos governadores e dos prefeitos em cidades com mais de 200 mil eleitores. Se um dos aspirantes a determinada vaga não consegue mais de 50% dos votos no primeiro turno, é realizada uma nova eleição, disputada pelos dois candidatos que obtiveram a maior votação. Este procedimento garante que os chefes do Executivo tenham o apoio de mais da metade dos eleitores que comparecem às urnas e votaram em um dos nomes – os votos nulos e brancos não são considerados. As eleições dos senadores e dos prefeitos nas cidades com menos de 200 mil eleitores seguem a regra da maioria simples: os mais votados – ou os dois mais bem-sucedidos em eleições que visam renovar dois terços do Senado – são eleitos.

Democracias diferentes
     Quem acompanha as eleições presidenciais dos Estados Unidos tem a impressão de que o sistema eleitoral de lá é semelhante ao adotado no Brasil: candidatos correndo o país em busca de votos, pesquisas mostrando a posição de cada um deles na disputa e votos sendo contados nacionalmente. 
 Mas o fato é que o presidente americano é eleito por um Colégio Eleitoral, formado por 538 delegados dos cinquenta estados americanos. A disputa em cada uma dessas bases é fundamental para o resultado final das eleições, pois o candidato mais votado em um determinado estado elege todos os representantes desta mesma região no Colégio Eleitoral. A Califórnia, por exemplo, tem 55 representantes no Colégio. Nas eleições de 2008, o candidato do Partido Democrata, Barack Obama, obteve a maioria dos votos populares no estado, o que lhe garantiu a eleição dos 55 representantes. Obama foi eleito presidente porque obteve a maioria dos votos (286) no Colégio, contra 252 obtidos pelo candidato do Partido Republicano, John McCain.
     Outra diferença fundamental entre os dois países é a forma de eleger deputados. Os Estados Unidos utilizam o voto distrital, que funciona da seguinte maneira: o país é dividido em 435 distritos eleitorais, sendo que cada um deles elege um deputado. Cada partido pode apresentar um nome por distrito, sendo eleito o mais votado em cada um deles.
     No Brasil, para montar uma Câmara dos Deputados que virá a ser composta de 513 representantes, os partidos, de acordo com as regras estabelecidas, têm que apresentar uma lista de candidatos em cada um dos 26 estados da federação e no Distrito Federal. O sistema para a distribuição dessas cadeiras é proporcional, ou seja, elas são distribuídas de acordo com a proporção de votos que cada um dos postulantes recebeu no estado. Se um partido receber 20% dos votos em São Paulo, que tem setenta representantes na Câmara dos Deputados, ele elegerá cerca de 14 deputados, que equivale a 20% das cadeiras.
     O sistema majoritário-distrital utilizado na maior parte dos Estados Unidos garante a eleição de um partido por distrito. Os votos dados a todos os outros partidos são desperdiçados. Alguns analistas acreditam que o sistema eleitoral é um dos fatores que contribuem para a existência do bipartidarismo americano. Os partidos pequenos, por sua vez, têm mais facilidade para obter representações no sistema proporcional – utilizado em um número reduzido de cidades –, já que ele distribui as cadeiras de maneira razoavelmente equitativa. Em geral, países que utilizam a representação proporcional têm sistemas multipartidários.
     Comparar os resultados das eleições de 2010 no Brasil e nos Estados Unidos é uma boa maneira de percebermos as diferenças entre os sistemas eleitorais dos dois países. Por aqui, vinte e dois partidos conseguiram eleger pelo menos um deputado federal. Já na terra de Obama, em contraposição, apenas dois partidos elegeram representantes para a Câmara dos Deputados.

Jairo Nicolau é professor de Ciências Políticas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e autor de História do Voto no Brasil (Jorge Zahar, 2002) e Sistemas Eleitorais (FGV Editora, 2004).

Saiba Mais – Bibliografia:
AVRITZER, Leonardo et al. (orgs.).Reforma Política no BrasilBelo Horizonte: UFMG, 2006.
POWER, Timothy et al. (orgs.). Instituições Representativas do Brasil. Belo Horizonte: UFMG, 2007.

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