“E agora que vocês viram no que a coisa deu, jamais esqueçam como foi que tudo começou” (Bertolt Brecht)

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Pré-história ou história dos povos sem escrita?/Complemento

     Na segunda metade do século XIX, a História buscava se afirmar como ciência especializada no conhecimento do passado, com base em documentos escritos. O termo Pré-história, denominação do período anterior ao surgimento da escrita, que ocorreu por volta de 4000 a.C., foi adotado para se contrapor ao termo História, que designava o período posterior à escrita.
     De acordo com essa divisão de tempo, se o planeta Terra surgiu há 5 bilhões de anos e o primeiro hominídeo descoberto e datado pela pesquisa arqueológica teria vivido há cerca de 4 milhões de anos, é possível deduzir que a maior parte da trajetória da humanidade não teria ocorrido no período histórico. Será que isto é correto?
     A resposta é não. Podemos afirmar que a história da humanidade começou com os mais antigos antepassados, embora os vestígios desse tempo sejam muito raros. Assim, o termo Pré-história não é o mais adequado para definir os acontecimentos que marcaram a humanidade antes da escrita. Em vez do termo Pré-história, os historiadores têm utilizado história dos povos sem escrita, cujo estudo depende das escavações arqueológicas e da paleontologia, ciência dedicada à investigação dos fósseis.
     Afinal, até hoje há povos que vivem sem o uso da escrita. Nem por isso deixam de viver em sociedade, de produzir cultura, de fazer História.

Arte rupestre
     A arte rupestre se encontra presente em grande parte dos sítios arqueológicos na forma de estatuetas, gravuras e pinturas em cavernas e paredões rochosos. Para pintar, os homens pré-históricos usavam pigmentos que extraíam da natureza, misturando cera de abelhas, sangue, barro, gordura, resinas vegetais, minerais moídos, carvão, água e até excrementos.
     Acredita-se que a arte rupestre representava a primeira forma de expressão e comunicação dos homens pré-históricos, por meio da qual exibiam sua percepção e compreensão do mundo e de si mesmos. Em geral retratavam cenas de caça, mas havia as que representavam figuras humanas.

As origens
O criacionismo
     As civilizações mais antigas já elaboravam explicações sobre a aparição do homem, seu lugar no mundo e suas relações com outras espécies.
     Muitos povos inventaram histórias sobre a criação, ligadas a mitos ou a crenças religiosas. Para os antigos egípcios, por exemplo, os homens teriam se originado das lágrimas do deus Sol Rá. Já os maias acreditavam que os homens foram feitos a partir de uma massa de milho.
     Os mitos e as lendas sobre a origem do homem, que têm como ponto comum a crença de que a humanidade foi criada por um ser superior, fazem parte de uma corrente de pensamento chamada
criacionismo.
     O criacionismo no mundo ocidental é baseado na tradição judaico-cristã. Nesse caso, defende-se a ideia de que Deus é o criador de tudo aquilo que existe e que, depois de ter criado a Terra e todos os seres vivos, teria criado Adão e Eva, dos quais toda a humanidade, até os nossos dias, descenderia.
Os fundamentos dessa interpretação criacionista são encontrados no Livro do Gênesis, no Antigo Testamento da Bíblia:
“Deus disse: ‘Façamos o homem à nossa imagem, segundo a nossa semelhança, e que ele submeta os peixes do mar, os pássaros do céu, os animais grandes, toda a terra e todos os animais pequenos que rastejam sobre a terra!’
Deus criou o homem à sua imagem, à imagem de Deus ele o criou; criou-os macho e fêmea.
Deus os abençoou e lhes disse: ‘Sede fecundos e prolíficos, enchei a terra e dominai-a. Submetei os peixes do mar, os pássaros do céu e todo animal que rasteja sobre a terra!’ [...]
Deus viu tudo o que havia feito. Eis que era muito bom. Houve uma tarde, houve uma manhã: sexto dia.
O céu, a terra e todos os seus elementos foram terminados.
Deus terminou no sétimo dia a obra que havia feito.
Ele cessou no sétimo dia toda a obra que fazia.
Deus abençoou o sétimo dia e o consagrou, pois tinha cessado, neste dia, toda a obra que ele, Deus, havia criado pela sua ação.
Este é o nascimento do céu e da terra quando da sua criação.”
(Gênesis 1,26 – 2,4. Bíblia: tradução ecumênica. São Paulo: Loyola, 1994. P. 25-26.)

     Até O século XVII, a visão criacionista era dominante no mundo ocidental. Existiam até mesmo cálculos que estabeleciam a data precisa em que Deus teria criado o homem, como a datação estabelecida pelo teólogo irlandês James Usher, em 1650. Segundo Usher, a criação do mundo ocorreu em 23 de outubro de 4004 a.C; um domingo, e Adão e Eva, os primeiros humanos, foram criados em 28 de outubro de 4004 a.c., uma sexta-feira.

Explicações científicas
     No século XIX, período de afirmação do pensamento científico, essas explicações foram contestadas. Dentre os vários pensadores da época, o mais revolucionário no assunto foi o cientista inglês Charles Darwin (1809-1882), que desenvolveu a teoria do evolucionismo. No seu livro A origem das espécies, publicado em 1859, ele propôs que os seres vivos evoluíram ao longo de milhões de anos, de acordo com um processo de seleção natural. Segundo ele, aqueles que se adaptavam melhor ao meio ambiente, em constante mutação, conseguiam sobreviver.
     As explicações religiosas para a criação do mundo sofreram outro golpe no início do século XX, com o trabalho de Georges-Henri Lemaitre (1894-1966), físico belga que, curiosamente, era padre católico. Estudioso da teoria da relatividade do físico alemão Albert Einstein (1879-1955), Lemaitre propôs, entre 1927 e 1931, que o universo possuía cerca de 10 a 20 bilhões de anos e teria se originado da explosão de um átomo primogênito ou “ovo cósmico”: Sua teoria ficou conhecida como Big Bang ou a “grande explosão”: A Terra, apenas um planeta dentro de um dos incontáveis sistemas estelares do universo, teria surgido na cadeia dessas explosões cósmicas.
     A teoria do Big Bang combinou muito bem com a teoria evolucionista de Darwin e permitiu aos pesquisadores, apoiados na Arqueologia, na Paleontologia e em outras áreas do saber, avançar no conhecimento das origens da humanidade.

Darwin e a origem das espécies
     Charles Robert Darwin nasceu na Inglaterra em 1809 e desde cedo interessou-se pelas ciências naturais. Em 1825 foi para Edimburgo estudar medicina, mas logo abandonou o curso. Matriculou-se então no Christ’s College, em Cambridge, decidido a tornar-se clérigo. Ali fez amizade com o botânico John Stevens Henslow, cuja influência foi decisiva para que Darwin fosse convidado a participar, como naturalista, da viagem de circum-navegação do navio Beagle, promovida pelo Almirantado britânico.
     Realizada entre 1831 e 1836, a viagem deu suporte às pesquisas iniciais de Darwin sobre a origem das espécies. Ele pôde verificar como espécies aparentadas apresentavam características distintas, de uma região para outra. Notou ainda que entre as espécies extintas e as atuais existiam traços comuns, embora diferenciados. Tais fatos levaram-no a supor que os seres vivos não são imutáveis, mas se transformam. Tal conclusão abalou suas convicções religiosas, a ponto de, por mais de duas décadas, ele se recusar a studata-la.
     Na base de sua teoria evolucionista, Darwin colocou a luta pela vida, segundo a qual somente os mais aptos conseguem sobreviver e transmitir suas características genéticas favoráveis a seus descendentes. Assim, as transformações que favorecem a adaptação do indivíduo ao meio ambiente continuam a se propagar por meio dos descendentes e, após longo tempo, é possível identificar uma nova espécie originária da antecedente, mas diferente dela.
     Sua obra Sobre a origem das espécies por meio da seleção natural ou a conservação das raças favorecidos na luta pela vida, publicada em 1859, colocou-o no centro de acirradas polêmicas.
     Darwin morreu em consequência de um ataque cardíaco em 19 de abril de 1882.

A antropologia biológica
A antropologia biológica é uma ciência que ajuda os arqueólogos a obterem preciosas informações sobre os primeiros hominídeos que viveram na Terra.

     “Se perguntarmos ao arqueólogo qual vestígio o coloca mais próximo do passado, sem dúvida a resposta será: os esqueletos humanos. Retirar esqueletos da terra durante as escavações e, depois, estuda-los cuidadosamente em laboratório faz com que o pesquisador lide com os restos das próprias pessoas que procura entender. E para isto existe a chamada antropologia biológica, que se volta ao estudo das características biológicas, evolutivas e adaptativas do homem. [...]
     Por exemplo, a definição do sexo de um indivíduo sepultado é obtida a partir da distinção que existe em uma determinada porção do esqueleto: a pélvis (ou bacia). Os homens apresentam a pélvis menos dilatada do que as mulheres. Afinal, são elas quem carregam por nove meses os bebês em gestação e depois dão à luz. [...]
     Para definir a idade de um esqueleto existem diferentes indicadores. Um deles é a análise da presença ou substituição dos dentes de leite e dos permanentes na arcada dentária. Outro indicador é o fechamento da calota craniana, que na criança é aberta, fundindo-se e enrijecendo-se com o passar do tempo. [...]
     Além de conhecer a idade, a altura e o sexo, pode-se calcular a expectativa de vida de uma população, ou seja, a idade estimada que as pessoas alcançavam. Em algumas sociedades a mulher tem menor expectativa de vida, devido a complicações derivadas da gravidez e do parto. Já em tempos de guerra, é compreensível que a expectativa de vida da população masculina seja menor.
     Esses estudos demográficos fornecem informações a respeito do tamanho da população tratada, taxas de nascimento e óbito, índices de crescimento e densidade populacional numa região.
     Porém, esses estudos exigem sofisticados programas estatísticos, já que os restos humanos são bastante frágeis à conservação, não suportando mudanças de clima ou a umidade do solo, representando apenas parcela de uma população. [...]
     Um ramo da antropologia biológica (a paleopatologia) se dedica à origem, frequência, dispersão e tipos de doenças nas populações antiga. Analisando os esqueletos, o pesquisador identifica várias anomalias, que podem ter sido causadas por doenças infecciosas, hormonais, nutricionais, metabólicas, tumores, stress mecânico ou inflamação dos tecidos moles. Porém somente algumas doenças deixam marcas evidentes nos ossos, como a lepra, o câncer, a pólio, a sífilis, a artrite e a osteoporose. Nas fezes fossilizadas e preservadas (coprólitos), os estudiosos obtêm informações detalhadas sobre parasitas intestinais. [...]
     E como teria sido a alimentação dos nossos antepassados? [...] Algumas marcas permitem avaliar a questão: ossos mais finos podem indicar uma dieta não adequada, assim como uma tendência para diminuir a altura das pessoas. A saúde dos dentes também é afetada, havendo uma incidência de cáries muito maior em populações que desenvolveram o cultivo do que em grupos apenas caçadores e coletores. Isto porque os produtos cultivados provocam fermentação de açúcares e, com isto, a formação de placa bacteriana, resultando em dentes cariados.”
(Arqueologia da morte. Instituto Itaú Cultural. Disponível em: www.itaucultural.org.br).

Fonte:
Conexões com a História / Alexandre Alves, Letícia Fagundes de Oliveira. - 1.ed. - São Paulo. Moderna, 2010.
História: das cavernas ao terceiro Milênio /Patrícia Ramos Braick. Myriam Becho Mata. 2. ed. - São Paulo: Moderna, 2010.
História: das sociedades sem Estado às monarquias absolutistas, volume 1 /Ronaldo Vainfas... [et al.] - São Paulo: Saraiva, 2010.

Saiba Mais: Filme
A Guerra do Fogo
O filme retrata um período na pré-história e dois grupos de hominídeos. O primeiro, que quase não se diferencia dos macacos por não ter fala e se comunicar através de gestos e grunhidos, é pouco evoluído e acha que o fogo é algo sobrenatural por não dominarem ainda a técnica de produzi-lo; o outro grupo é mais evoluído e tem uma comunicação e hábitos mais complexos, como a habilidade de fazer o fogo. Esses dois grupos entram em contato quando o fogo da primeira tribo é apagado em uma guerra com uma tribo de hominídeos mais primitivos, que disputam a posse do fogo e do território. Noah, Gaw e Amoukar (membros do primeiro grupo) são destacados então para uma jornada para trazer uma nova chama acesa para a tribo. Nesse caminho deparam-se com um grupo de canibais, e resgatam de lá Ika, uma mulher pertencente ao grupo mais evoluído. Do contato com essa mulher, os três caçadores do fogo aprendem muitas coisas novas, já que ela domina um idioma muito mais elaborado que o deles, assim como domina também a técnica de produção do fogo. Levados por diversas circunstâncias a um encontro com a tribo de Ika, percebem que há uma maneira diferente de viver; observam as diferentes formas de linguagem, o sorriso, a construções de cabanas, pintura corporais, o uso de novas ferramentas, e, um modo diferente de reprodução.
Direção: Jean Jacques Annaud
http://ul.to/8g8x37px
Duração: 100 minutos
Ano: 1981
Áudio: Legendado

 Criação
Charles Darwin (Paul Bettany) tem em torno de 40 anos e leva uma vida pacata em uma vila inglesa. Darwin é devotado à sua família, mas ao mesmo tempo é bastante distante deles. A causa principal é o vazio existente com sua esposa Emma (Jennifer Connelly). Darwin apenas se sente bem quando escapa para seu escritório, onde discute o dia com sua filha Annie (Martha West), de apenas 10 anos. Só que há um problema: Emma está morta, há muitos anos. Darwin conversa, ou acredita conversar, com seu fantasma. É o jeito que ele encontra para amenizar a dor que sente e o conflito que possui, ao perceber que a existência de Deus não se encaixa no mundo real.
Direção: Jon Amiel
Duração: 108 minutos
http://ul.to/fv6l1knzAno: 2010
Áudio: Português



Saiba Mais: Documentário
Darwin: A Viagem que Abalou o Mundo
Em 1831, um jovem cientista amador, Charles Darwin, embarcou no HMS Beagle numa viagem épica de 5 anos que culminaria com a descoberta que abalaria o mundo. Neste documentário, o HMS Beagle zarpa mais uma fez para retraçar a viagem de Charles Darwin, examinando suas descobertas e conclusões incríveis – e suas implicações – à luz do conhecimento moderno. Filmado na Amrica do Sul, Reino Unido, América do Norte, Austrália e Europa, “Darwin: A Viagem que Abalou o Mundo” mostra recriações do período e surpreendente cinematografia natural, tudo intercalado por estudiosos, cientistas e especialistas em Darwin que compartilham suas diferentes perspectivas sobre o homem e a polêmica que ele lançou.
Direção: Steve Murray
Duração: 52 minutos
http://ul.to/558mk3g2Ano: 2009
Áudio: Inglês/Legendado

3 comentários:

  1. Tem o filme "A Guerra do Fogo" pra assistir online também -> http://static-cdn1.ustream.tv/swf/live/viewer:61.swf?vrsl=c:207&vid=5564454&%3bv3=1&%3bbgcolor=000000&%3bcampagnId=facebook&rmalang=en_US

    ResponderExcluir
  2. muito bom esse texto me ajudou muito.

    ResponderExcluir