“E agora que vocês viram no que a coisa deu, jamais esqueçam como foi que tudo começou” (Bertolt Brecht)

domingo, 17 de junho de 2012

Curiosidades sobre a História brasileira

Cuidado com o tigre!
Ainda não se inventou pior ocupação no mundo do que o trabalho, aliás tão necessário, que os tigres desempenhavam no tempo da escravidão. Dada a inexistência de redes de esgoto, eram estes cativos os encarregados de despachar para bem longe os dejetos domésticos acumulados durante o dia. Eles os conduziam na cabeça, dentro de barricas (estas, por associação, também chamadas de tigres), e alguns, por troça ou vingança, escondidos pelas sombras da noite, esbarravam de propósito nos passantes desavisados, fazendo respingar sobre eles a carga malcheirosa. Daí as pessoas fugirem dos tigres como o diabo da cruz, enquanto os fiscais do governo, como mostra o desenho, tentavam enquadrá-los às boas posturas. Bem de acordo com o apelido que receberam, os tigres - coitados deles! - eram mesmo um perigo.

Questão de gosto
Nem sempre o ódio pelo inimigo era a origem do canibalismo entre índios brasileiros no início da colonização. Mas um relato do frei Antônio de Santa Maria Jaboatão, já no século XVIII, dá a entender que havia algo mais do que sentimentos de amor e ódio envolvidos no ritual. Ele conta que uma velha índia potiguar, muito doente, queria saborear uma rara iguaria. O padre, comovido, querendo aliviar o sofrimento daquela senhora, ofereceu-lhe açúcar e acepipes vindos de Portugal. Mas, para desgosto daquele bom cristão, a índia respondeu: "Ai, meu neto, nenhuma coisa da vida desejo, tudo me aborrece já, só uma coisa me poderia tirar agora este fastio'; e revelou: "Se eu tivera agora uma mãozinha de um rapaz tapuia, de pouca idade, e tenrinha, e lhe chupara aqueles ossinhos, então me parece tomara algum alento. Porém eu, coitada de mim, já não tenho quem me vá frechar um destes!". De acordo com o fato narrado pelo religioso, canibalismo parecia também uma questão gastronômica ...
Em O diabo e a Terra de Santa Cruz, de Laura de Mello e Souza.

Empadinhas de vento

Alguns vendedores ambulantes do Rio de Janeiro no início do século XX possuíam técnicas de venda de dar inveja a qualquer marqueteiro atual. O cronista Luís Edmundo conta que alguns desses comerciantes ficavam às portas dos teatros, onde vendiam suas empadas - "pastelaria feita com banha de porco e cujo recheio é um mingau detestável". Com um sotaque bem conhecido, anunciavam: - As empedinhas spiciaes cum quêmerão e azaitonas! Stam queimando! Não tendo o quêmerão nam pagam nada! Segundo o cronista, não havia nem sombra de camarão no recheio, mas os fregueses pagavam mesmo assim. Mas em uma ocasião, um cliente insatisfeito voltou para reclamar. Não tinha camarão na empada. E ouviu a resposta do sábio vendedor: - É verdade, não tem. É que há uns que gostom, outros que não gostom... E continuou suas vendas.
Em O Rio de Janeiro do meu tempo, de Luís Edmundo.

Culinária assassina
No século XVII os tupinambás foram levados para a França e viraram atração na corte do rei Luís XIII. As relações franco-tupis remontam, pelo menos, a 1550. Mas, antes desta saga francesa, o índio brasileiro chegou à Inglaterra, Gilberto Freyre conta a história de um cacique levado na década de 1530 pelo viajante
William Hankins para ser apresentado ao rei Henrique VIII. O indígena causou grande sensação em Londres. Mas o final de sua aventura não foi muito feliz. Ele morreu pouco depois de ter sido apresentado ao público europeu. Segundo Freyre, não se sabe se por causa do frio ou da culinária inglesa...
Em Casa-grande & senzala, de Gilberto Freyre.

Homenagem suspeita
Antes do Código Civil de 1916 as pessoas podiam mudar seus nomes livremente. Fato curioso ocorreu no Nordeste por conta desta facilidade em 1887. Um dos protagonistas foi João Ramos, que fazia parte de um grupo abolicionista de Pernambuco, o Club do Cupim. Ele deu cobertura a um escravo que havia conseguido escapar. Assim que este chegou ao Ceará, província na qual a escravidão já havia sido abolida, escreveu uma carta de agradecimento ao seu benfeitor, E assinou como João Ramos, adotando o nome do homem que o ajudou, Mas o abolicionista não aceitou muito bem a homenagem e anotou na mesma carta: "tomou para si o meu nome e tem a petulância de escrever-me, divertindo-se comigo" Dar fuga a um escravo era uma coisa, mas dar seu próprio nome a um fugitivo, aí era outra história...
Em Império: a corte e a modernidade nacional, organizado por Luiz Felipe de Alencastro.

Noite de sonho e sortilégio na festa do santo casamenteiro
Jogos de adivinhação e "simpatias" estão tradicionalmente ligados aos festejos juninos. Ao mesmo tempo versos e cantigas entoadas pelos festeiros apontam a noite de São João como um momento propício ao
erotismo e às brincadeiras de fundo sexual. As práticas divinatórias são em geral ingênuas, mas não deixam de ter conteúdo erótico e sensual, como é o caso das "sortes" de casamento. O folclorista Veríssimo de Melo relacionou algumas dessas "adivinhas":
O copo e a aliança ~ Amarra-se uma aliança num fio de cabelo e pendura-se este sobre a boca de um copo, sem deixar que a aliança toque nas bordas. Momentos depois, se a pessoa merece a graça de uma revelação, a aliança, por si, começa a bater na beirada do copo. O número de batidas equivale ao número de anos que faltam para o casamento da consulente.
Os três pratos ~ Três pratos são emborcados sobre a mesa. Debaixo de um põe-se um terço. De outro, uma aliança. Sob o terceiro, nada. Manda-se então uma moça, que não viu a distribuição dos objetos, revirá-los. Se escolher aquele que tem a aliança debaixo, a moça casará. Se achar o terço, será freira. Se virar o terceiro prato, ficará "no caritó', ou seja, "pra titia"
A clara de ovo ~ A moça que quer saber se vai casar põe a clara de um ovo dentro do copo. No dia seguinte, assim que se levanta, vai olhá-lo. Se a clara formar um desenho semelhante ao de uma igreja, é casamento próximo; se a imagem evocar um navio, fará uma viagem, e assim por diante, ao gosto da imaginação da consulente.
O espelho ~ Passa-se um espelho sobre a fogueira descrevendo no ar o desenho da cruz. Depois põe-se o objeto no telhado da casa, sem olhá-lo, No dia de São João, bem cedo, o consulente, se tiver sorte, verá projetado no espelho o rosto do rapaz (ou da moça) com quem se casará.
A bananeira ~ Toma-se uma faca que ainda não foi usada. Junto de uma bananeira reza-se a Salve-Rainha e a seguir crava-se a lâmina no tronco. De manhã, no dia seguinte, bem cedo, ao se retirar a faca, as iniciais do futuro marido ou esposa aparecerão na seiva que escorreu da planta.

Fonte: Revista Nossa História nº 08, 20 e 32

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