“E agora que vocês viram no que a coisa deu, jamais esqueçam como foi que tudo começou” (Bertolt Brecht)

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Uma História do Cristianismo

Uma escolha de fé?
Em “Habemus Papam”, papa foge na hora de assumir o cargo com medo de não ser apto para liderar a Igreja. Filme faz uma leve caricatura dos bastidores do conclave e problematiza a situação da Itália hoje
      “Quem sou eu, que vá a Faraó e tire do Egito os filhos de Israel?” A pergunta está na Bíblia e pertence a Moisés, em resposta ao pedido de Deus para que O ajudasse na libertação dos judeus sob a escravidão egípcia. Não é, portanto, tão surreal que o papa do Vaticano criado pelo diretor Nanni Moretti no filme “Habemus Papam” tenha dúvidas quanto às suas capacidades para dar prosseguimento à missão de Pedro, promovendo as transformações que a Igreja precisa e liderando os milhões de católicos que o enxergam como o mais legítimo representante do Senhor na terra.
     Semelhantes em idade avançada, Moisés e o cardeal Melville, brilhantemente interpretado pelo simpático francês Michel Piccoli, reivindicam o tradicional ideal cristão do livre-arbítrio. A crise: separação, discernimento, julgamento. Os sentimentos confusos levam o novo papa, no filme, ao isolamento e mesmo à fuga. É a representação mais clara de um conflito que escapa ao consciente: a doutrina de fé católica não pode compreender que o Espírito Santo tenha escolhido o fiel errado.
     Coerente com tal raciocínio impensável para os católicos, e surpreendente para os ateus, a telona reproduz como poucas vezes os rituais internos do conclave - nome dado ao período de votação para eleição de um novo papa. O espectador acompanha então uma rotina humana demais para ser encarada como manifestação divina: blecaute, caneta sem tinta, ausência de velas, padres que caem da cadeira, orações desesperadas para que a Graça do papado não lhe seja entregue e, por fim, a contagem da votação, em que a ingênua vaidade e o orgulho também estão presentes.
     Na sequência, quando a religião declina à tarefa de compreender o mundo e não sabe como interpretar as emoções humanas e os conflitos morais que se apresentam, ela humildemente pede ajuda à ciência. O desencanto causado pela consideração razoável de uma intervenção não religiosa parece pequeno diante de um possível buraco que a ausência do papa causaria na identidade nacional italiana fortemente enraizada em tradições católicas. O próprio diretor encarna um psicanalista enviado pelas autoridades religiosas para ajudar o pontífice a entender seu dilema e, ao longo de cenas cômico-dramáticas, acaba por dissolver supostas fronteiras entre as ideologias laicas e as religiosas.
     Sem garantir privilégios a uma ou outra, são expostas afinidades culturais como a valorização da instituição familiar nas explicações dos conflitos internos e nos ideais de “bem comum” ou “bem estar”, no papel preponderante para a liberdade individual e, sobretudo, a recusa atual a uma religião/cultura de simbolização rigorosamente fechada em sintonia com estereótipos de fiéis e de homens. Lado a lado, as representações religiosas e terapêuticas da humanidade e de suas perturbações compõem uma Igreja clara e profundamente responsável pela proteção da cultura, pelo diagnóstico e solução dos problemas humanos. Instalada em cada um de seus fiéis, a Igreja vive com eles o problema contemporâneo da multiplicidade, fragmentação e reconstrução das identidades individuais e coletivas.
O retrato da Itália 
     Talvez seja esse o caso da Itália que Nanni Moretti buscou realçar. Atingida duramente pela crise econômica que divide a União Europeia desde 2008, a ainda jovem nação assiste suas matrizes definidoras da identidade diminuírem de tamanho e importância sem que se tenha construído algo para tomar seu lugar. As longínquas raízes culturais da civilização grega e do Império Romano historicamente utilizadas como elementos para fermentação de um sentimento de pertencimento mostram-se frágeis diante da perda da liderança econômica, do avanço da promiscuidade política e da invasão do público pelo privado, bem como conhecemos aqui no Brasil.
     Fragmentos do nacionalismo mais agressivo construído pelo fascismo dos anos 1920 e 30 sucumbem com a fuga das empresas mais importantes do país. Mesmo o orgulho cultural consagrado, entre outros, pelo sucesso mundial do cinema de Pasolini, Visconti e Fellini, declina perante uma dívida pública de mais de 1,9 trilhão de euros, e cortes sucessivos nos gastos com a cultura. Na moda, Milão não é mais relevante como é Londres, Paris ou Nova York, e na literatura, Umberto Eco parece cada vez mais solitário na defesa das conquistas de uma Europa em paz há apenas 60 anos.
     Por fim, o grande símbolo da missão universal do catolicismo italiano representado pelo Vaticano em Roma perde espaço no campo nacional e internacional para religiões evangélicas, islâmicas, entre outras. Ao mesmo tempo, a extrema direita cresce na França, Suécia, Finlândia, e Hungria estimulando o preconceito e a xenofobia que marcaram violentamente a história recente da Europa. Não sem razão, aos milhões que aguardam a saudação pública do papa, o diretor italiano de Habemus Papam reserva um imenso vazio. Ao que tudo indica, a ideia mais improvável se constituiu em representação identitária crítica e, por que não, real.
     É preciso ainda mencionar a importante citação de Tchékhov através da peça “A gaivota” em cuja encenação o papa foragido se encontra com suas memórias. A falta de talento para ser ator durante a juventude o ajuda a compreender a incapacidade para se tornar a Santidade que o público espera ver atrás das cortinas. O teatro surge como o campo no qual foi possível intercambiar os tempos históricos permeados de feridas e frustrações que precisam ser resolvidas, espaço no qual a arte de contar os fatos da vida cotidiana ou mesmo as ficções, encontram as estruturas apropriadas da linguagem, da narrativa, da elaboração e transformam-se em História. Contudo, compreender este processo implica no desmantelamento de uma ideia há muito enraizada, que vê no futuro o único tempo aberto e indeterminado e omite a capacidade que o antigo possui de ser atualizado, de ser reinterpretado a ponto de influenciar decisivamente os nossos sonhos e as nossas vinganças.




Direção: Nanni Moretti
Ano: 2011
Áudio: Português
Duração: 102 minutos
Tamanho: 423 MB





Uma História do Cristianismo
Este documentário dividido em 6 partes transmitido originalmente pela BBC Four que traz o Professor Diarmaid MacCulloch (um dos principais historiadores do mundo) revelando as origens do cristianismo e explorando o que significa ser cristão. O objetivo da BBC era produzir uma série “divisora de águas” que examinasse as origens do Cristianismo e a relevância da fé no mundo atual.
Como afirma o Professor Diarmaid MacCulloch: “A história da Igreja Cristã tornou-se o trabalho da minha vida. Para mim, nenhum outro assunto pode se equivaler em escala ou drama. Por dois mil anos, o Cristianismo tem sido um dos maiores participantes da história mundial, inspirando fé, mas também políticas sórdidas. É uma história épica estrelando um elenco de pessoas extraordinárias, desde o próprio Jesus e seus primeiros apóstolos à imperatrizes, reis e papas. Desde reformistas e campeões da consciência humana a cruzados e sádicos. A crença religiosa pode nos transformar em bom ou doente. Ela tem levado seres humanos a realizarem atos criminosos assim como às mais altas obtenções de bondade e criatividade. Eu contarei a vocês a história de ambos os extremos. O Cristianismo sobreviveu a perseguição, separações, guerras religiosas, imitações, ódio. Hoje existem dois bilhões de Cristãos - um terço da humanidade. Protestante, Católicos, Ortodoxos, Pentecostais e muitos mais. Lá no fundo da fé cristã há um núcleo compartilhado, mas o que ele é?

Ep.01-Cristianismo primitivo. [The First Christianity - 59min]
No primeiro de seis episódios percorrendo quatro continentes, o professor Diarmaid MacCulloch vai em busca das "origens perdidas do Cristianismo". Ele desmente a história de que tudo havia começado quando o apóstolo Paulo levou o Cristianismo de Jerusalém para Roma, mostrando que suas origens situam-se mais a leste e que em certo ponto estava preparado para triunfar na Ásia. A sede do Cristianismo pode muito bem ter sido Bagdá e não Roma, o que no caso faria do Cristianismo Ocidental muito diferente.

Ep.02-Igreja Católica Apostólica Romana. [Catholicism: The Unpredictable Rise of Rome - 59min]
Traçando as raízes do cristianismo, o professor explora a ascensão da Igreja Católica Romana, mais de um bilhão de pessoas procuram por Roma. Mas como uma pequena seita judaica do interior da Palestina do séc. I que prega humildade e a virtuosidade da pobreza se tornou a religião estabelecida da Europa ocidental? MacCulloch relata como a confissão foi inventada pelos monges em uma ilha remota da costa da Irlanda e como as Cruzadas deram a Grã-Bretanha o sistema universitário.

Ep.03-Igreja Ortodoxa. [Orthodoxy – From Empire to Empire - 58min]
Diarmaid MacCulloch explora Cristianismo Ortodoxo Oriental, que floresce nos Balcãs e na Rússia, mas teve que lutar pela sua sobrevivência. Após seus dias de glória do Império Romano, que estava no caminho da expansão muçulmana, tal movimento sofreu traição de cruzados católicos, prisão pelos czares russos e enfrentou quase extinção, sob o comunismo. MacCulloch visita uma coleção de ícones no deserto do Sinai, uma relíquia da crise iconoclasta, em Istambul e a catedral Ivan, o Terrível, em Moscou.

Ep.04-Reforma Protestante. [Reformation: The Individual Before God – 58min]
Diarmaid revela o sentido da Reforma, revelando como a fé baseada em obediência e autoridade deu origem a uma fé baseada na consciência individual. Ele mostra como Martin Luther King escreveu hinos para ensinar às pessoas a mensagem da Bíblia, mostra também como uma saborosa salsicha se tornou o "lema" para o reformista suíço Ulrich Zwingli destruir estátuas de santos, permitir o casamento de membros do clero e negar que a comunhão do pão e do vinho eram o corpo e o sangue de Cristo.

Ep.05-Neo-Pentecostalismo e adaptações pelo mundo. [Protestantism – The Evangelical Explosion - 58min]
Nesse episódio nosso narrador traça o crescimento de uma exuberante expressão de fé que se espalhou pelo mundo- o Protestantismo Evangélico. Hoje associado a políticos conservadores, é facilmente esquecível que a explosão Evangélica foi guiada por uma preocupação sobre justiça social e pela alegação que se pode estar em um relacionamento emocional direto com Deus. MacCulloch mostra como isso permitiu que a fé Protestante se espalhasse para distante de seu berço na Europa para a América. África e recentemente Ásia.

Ep.06-Agnosticismo. [God in the Dock - 59min]
No último capítulo da série, Diarmaid MacCulloch examina uma característica distintiva sobre o Cristianismo Ocidental - o ceticismo: tendência a duvidar. Ele desafia a noção simplista que a fé no Cristianismo declinava antes do avanço da ciência, razão e progresso, e mostra em ao invés disso como a maré de fé retorna. Apesar dos danos infligidos à sua credibilidade moral ocasionada por 2 Grandes Guerras Mundiais no séc. XX, foi durante as crises que a Igreja redescobriu verdades profundas e duradouras sobre si mesmo.

Direção: Gillian Bancrof
Ano: 2009
Áudio: Inglês/legendado

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